Legalidade das gravações de Sérgio Machado
Sob o título “Legalidade da gravação de conversa“, o artigo a seguir é de autoria de Rogério Tadeu Romano, advogado e procurador regional da República aposentado.
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O ex-presidente da Transpetro Sérgio Machado, que aparece na conversa que provocou a saída de Romero Jucá do Ministério do Planejamento no último dia 23, teria gravado conversas também com o presidente do Senado, Renan Calheiros, e com José Sarney.
As gravações teriam sido feitas separadamente, em conversas privadas de Machado com Renan e Sarney.
Machado chefiou a estatal por 12 anos. Saiu em fevereiro de 2015, depois de sucessivas licenças para tentar escapar do foco da Lava Jato, segundo se noticia.
Saiu do cargo, mas os procuradores continuaram a cercá-lo, vendo o acúmulo de indícios de corrupção. Quando a prisão se tornou iminente, o peemedebista resolveu virar delator. Pôs um gravador no bolso e saiu à caça de frases que comprometessem os padrinhos políticos.
Virou um verdadeiro “homem-bomba”.
Pergunta-se se essas gravações teriam sido legais.
A meu ver, sim.
Na lição de Ada Pellegrini Grinover, Antônio Scarence Fernandes e Antônio Magalhães Gomes Filho (“As nulidades no processo penal”, São Paulo, pág. 141), entende-se por interceptação telefônica a captação da conversa por terceiro, sem o conhecimento de dois interlocutores ou com o conhecimento de um só deles. Ensinam ainda que “quando um dos interlocutores grava a sua própria conversa, telefônica ou não, com o outro, sem o conhecimento deste, tem-se a gravação clandestina”.
Há várias modalidades de captação eletrônica da prova: a) a interceptação da conversa telefônica por terceiro, sem o conhecimento dos dois interlocutores; b) a interceptação da conversa telefônica por terceiro, com anuência de um dos interlocutores; c) a gravação de conversa telefônica por um dos sujeitos, sem o conhecimento do outro; d) a gravação entre presentes de conversa pessoal e direta, sem o conhecimento dos interlocutores, por um terceiro; e) a gravação, entre os presentes, da conversa pessoal ou direta, sem o conhecimento de um dos interlocutores, feita pelo outro ou por terceiros.
Dir-se-á que a execução das interceptações exige ordem judicial, provimento de natureza cautelar, visando a assegurar as provas pela fixação dos fatos, assim como se apresentam no momento da conversa. A ordem deve ser motivada com a justificação da fumaça de bom direito e do perigo de demora.
Por sua vez, o resultado da interceptação deve revestir-se da forma documental, com lavratura de termo.
A fim de elucidar os institutos estudados, colaciona-se brilhante decisão do Tribunal de Justiça de São Paulo, proferida em dezembro de 2008, que teve como Relator o Desembargador Irineu Pedrotti:
Na interceptação telefônica há três protagonistas: dois interlocutores; um interceptador que capta a conversação sem o consentimento daqueles. Na escuta telefônica há também um interceptador e dois interlocutores, só que um deles tem conhecimento do fato. Na gravação telefônica há dois interlocutores onde um deles grava a conversação com o conhecimento do outro ou não.
O Supremo Tribunal Federal, no HC 74.678-SP, proferiu a seguinte decisão: “Utilização de gravação de conversa telefônica feita por terceiro com a autorização de um dos interlocutores sem o conhecimento do outro quando há, para essa utilização, excludente da antijuridicidade. Afastada a ilicitude de tal conduta – a de, por legítima defesa, fazer gravar e divulgar conversa telefônica ainda que não haja o conhecimento do terceiro que está praticando crime –, é ela, por via de conseqüência, lícita e, também conseqüentemente, essa gravação não pode ser tida como prova ilícita, para invocar-se o artigo 5º, LVI, da constituição com fundamento em que houve violação da intimidade (artigo 5º, X, da Carta Magna). Habeas Corpus indeferido. É caso de escuta telefônica.”
“É lícita a gravação de conversa telefônica feita por um dos interlocutores, ou com sua autorização, sem ciência do outro, quando há investida criminosa deste último (…)” (HC 75.338-8/RJ, Rel. Min. Nelson Jobim).
“A gravação de conversa telefônica por um dos interlocutores não é interceptação telefônica, sendo lícita como prova no processo penal. Pelo Princípio da proporcionalidade às normas constitucionais se articulam num sistema cuja harmonia impõe que, em certa medida, tolere-se o detrimento a algum direito por ela conferido, no caso, o direito à intimidade” (RHC 7.226/SP, Rel. Min. Edson Vidigal).
“A gravação de conversa telefônica entre dois interlocutores, feita por um deles, sem conhecimento do outro, com a finalidade de documentá-la, futuramente, em caso de negativa, nada tem de ilícita, principalmente quando constitui exercício de defesa (…)” (AI 503617 AgR/PR, Rel. Min. Carlos Velloso).
A interceptação telefônica é o ato de imiscuir-se em conversa alheia, seja por meio telefônico(interceptação telefônica) seja por interceptação ambiental, que é outra forma de captação.
Veja-se caso recente julgado pelo Ministro Luis Roberto Barroso onde se decidiu pela negativa de recurso onde se pedia anulação de interceptação telefônica.
Sendo assim não têm fundamento as alegações apresentadas de que tais gravações são ilegais. A prova é, portanto, lícita e pode ser usada no processo.