Laurita: “Apesar da crise, instituições estão firmes”

Frederico Vasconcelos

Laurita Vaz

A presidente eleita do Superior Tribunal de Justiça, ministra Laurita Vaz, diz que o tribunal “continuará a atuar com isenção e firmeza necessárias no julgamento de todas as causas importantes para o país, sem intimidações ou interferências”.

A ministra lamenta “a crise política, econômica e moral que o país atravessa”, e diz que “a reação massiva da população brasileira contra a corrupção é, sem dúvida, bastante salutar, pois impulsiona mudanças e imprime um novo tom para a atuação dos agentes e instituições públicas”.

Eis a íntegra da entrevista, concedida por e-mail na última sexta-feira (3):

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Folha – Qual será a sua prioridade na presidência do STJ?

Laurita Vaz – Minha prioridade é, e sempre foi, desde que ingressei no Superior Tribunal de Justiça, em 2001, exercer e aprimorar a jurisdição, o bem maior a ser entregue pelo Poder Judiciário aos cidadãos.

O Superior Tribunal de Justiça tem por missão constitucional precípua interpretar a legislação federal e, com isso, uniformizar sua aplicação em âmbito nacional, tarefa que se tem tornado, a cada ano, mais difícil em face do aumento crescente do número de processos que são distribuídos a cada ministro.

Por isso, meu trabalho terá como foco prover os meios necessários para que a atividade jurisdicional de cada ministro e dos órgãos colegiados do Tribunal seja prestada com maior eficiência e em tempo oportuno.

Folha – Em que medida a sua trajetória, oriunda do Ministério Público e tendo sido corregedora (eleitoral), é importante para comandar o STJ?

Laurita Vaz – No ano de 1978, logrei aprovação no concurso para o Ministério Público de Goiás. Como Promotora de Justiça adjunta, iniciei meus trabalhos na Comarca de Araçu, passando depois por diversas outras comarcas, até chegar como titular para oficiar perante uma Vara Criminal da Capital. O labor ministerial me proporcionou experiência inestimável nas comarcas do interior, onde a pobreza e a falta de recursos até mesmo das instituições públicas são desafios à cidadania.

Posteriormente, fui aprovada no concurso do Ministério Público Federal, onde exerci, já em Brasília, todos os cargos inerentes à profissão, perante o Supremo Tribunal Federal e o Superior Tribunal de Justiça.

No que diz respeito à minha experiência na Justiça Eleitoral, e especialmente no Tribunal Superior Eleitoral, é importante ressaltar o quanto as decisões dali emanadas, além da esfera jurídica das partes envolvidas, não raras vezes, abrangem de forma indelével – a depender do âmbito em que surgiu a questão controvertida – as realidades nacional, estaduais ou locais.

Como Corregedora-Geral Eleitoral, pude observar, sob uma ótica diferenciada, a importância do fortalecimento das instituições democráticas, as peculiaridades regionais de nosso imenso país e o clamor dos cidadãos pelo respeito à Constituição e pelo transcurso do processo eleitoral dentro da legalidade e com transparência.

Durante essa trajetória profissional colhi muitas lições, que trago comigo e, certamente, serão muito úteis no exercício da Presidência do maior Tribunal do país.

Folha – Em que medida será útil à sua gestão o fato de ter exercido por várias vezes a presidência nas ausências do ministro Falcão?

Laurita Vaz – Substituí o ilustre ministro Francisco Falcão, como é de praxe, nos períodos de férias do Presidente e, eventualmente, nas ausências oficiais. Pude experimentar, nesses períodos, o grande volume de trabalho e a enorme responsabilidade depositada na pessoa do Presidente. Por isso, creio que a familiaridade com o trabalho e a exata noção do peso da responsabilidade serão um fator de tranquilidade para me desincumbir dessa árdua, mas honrosa missão.

Folha – Na atual gestão, houve vários desentendimentos públicos entre ministros. Como pretende pacificar a Corte?

Laurita Vaz – Em primeiro lugar, há de se considerar que, em um colegiado, é natural haver discordâncias. Embora possa ter havido, vez ou outra, um excesso de linguagem ou mesmo uma exacerbação de ânimos, é certo que o objetivo de todos os ministros é trabalhar para buscar soluções equilibradas e justas às questões trazidas à deliberação da Corte.

Os meus eminentes pares conhecem meu temperamento conciliador e espero trabalhar com serenidade e tranquilidade suficientes para compor as divergências e atingir nosso objetivo maior comum, já anunciado.

Folha – Como avalia o papel do STJ no julgamento da Lava Jato? Como esse caso terá seguimento durante a sua gestão?

Laurita Vaz – Apesar da lamentável crise política, econômica e moral que o país atravessa, as instituições públicas de controle estão se mostrando firmes e independentes no cumprimento de suas missões institucionais. A Polícia Federal, o Ministério Público Federal e a Justiça Federal estão trabalhando em grau máximo de seriedade e empenho, correspondendo às expectativas da sociedade brasileira, cansada de ver tantos desmandos. O STJ, como Tribunal constitucionalmente responsável pela interpretação e uniformização da lei federal, continuará a atuar com isenção e firmeza necessárias no julgamento de todas as causas importantes para o país, sem intimidações ou interferências.

Folha – Como vê as manifestações sociais contra a corrupção?

Laurita Vaz – Somos uma democracia ainda jovem. Estamos aprendendo, como nação, a participar mais ativamente dos rumos do país. A despeito desse cenário de instabilidade política e econômica, o Brasil reafirma seu compromisso com as liberdades e direitos sociais. A impressa livre e atuante, a liberdade de expressão e a velocidade do trânsito das informações têm sido ingredientes essenciais para uma democracia cada vez mais participativa. A reação massiva da população brasileira contra a corrupção é, sem dúvida, bastante salutar, pois impulsiona mudanças e imprime um novo tom para a atuação dos agentes e instituições públicas.

Folha – Qual a sua opinião sobre o auxílio-moradia?

Laurita Vaz – O pagamento dessa verba indenizatória a todos os magistrados, de forma irrestrita, tem gerado grande polêmica dentro e fora do Poder Judiciário. A controvérsia já foi levada à consideração do Supremo Tribunal Federal, que deve apreciar a matéria em breve.

A meu sentir, buscou-se, em dado momento, reparar perdas do poder de compra da remuneração dos magistrados por via transversa. Em vez de se promover os reajustes necessários para reaver a desvalorização da moeda, criou-se essa rubrica. Não creio que essa tenha sido a melhor solução para o problema da perda do poder aquisitivo.
Contudo, tenho certeza que os ministros do Supremo Tribunal Federal saberão resolver a controvérsia de modo adequado e justo.