Entidade quer retorno de juiz afastado pelo TJ-SP há 24 anos por suspeita de fraude eleitoral
A Associação Nacional dos Magistrados Estaduais (Anamages) informa em seu site que o Conselho Nacional de Justiça “determinou ao Tribunal de Justiça de São Paulo o aproveitamento imediato do magistrado Marcello Holland Neto, que ficou em disponibilidade por mais de 24 anos”.
“É, no mínimo, um resgate do exercício da dignidade de um homem.” (…) “Talvez seja a maior pena administrativa já cumprida neste país. Nem mesmo na ditadura tivemos fato semelhante”, afirmou à publicação o presidente da Anamages, juiz de direito Magid Nauef Láuar.
O informativo não registra que o TJ-SP afastou o magistrado de suas funções porque o Tribunal Regional Eleitoral de SP instaurou procedimento para apurar “supostas condutas lesivas” praticadas pelo juiz, que teria permitido a alteração na apuração de votos na eleição para a Câmara Municipal de Guarulhos no início dos anos 90.
Segundo os autos, em 17 de junho de 1992, o Órgão Especial do TJ-SP entendeu que estariam comprovados os seguintes fatos: a) a coparticipação do juiz Marcello Holland Neto em fraude eleitoral; b) o recebimento indevido de um relógio valioso presenteado por um partido e entregue por um candidato às eleições, beneficiado comprovadamente nas apurações e c) o recebimento indevido de auxílio moradia pago pela prefeitura.
Os desembargadores aplicaram ao magistrado a pena de disponibilidade com vencimentos proporcionais ao tempo de serviço.
A Anamages atribui o retorno de Holland à atividade judicante a um “julgamento monocrático” do conselheiro Emmanuel Campelo, do CNJ –ou seja, uma decisão sem consulta aos pares.
A entidade informa no boletim que o Plenário Virtual do CNJ aprovou no último dia 16 de junho o seguinte enunciado:
“Após 2 (dois) anos da aplicação da pena de disponibilidade, ocorrendo pedido de aproveitamento, o Tribunal deverá apontar motivo plausível, de ordem moral ou profissional, diverso dos fatos que ensejaram a pena, capaz de justificar a permanência do magistrado em disponibilidade, mediante procedimento administrativo próprio, oportunizando-se o contraditório”.
“Peticionei requerendo o julgamento monocrático e o conselheiro relator [Campelo] deferiu o retorno do magistrado”, afirma no boletim o advogado da entidade, Daniel Calazans.
“Agora, iremos adotar as medidas cabíveis para os efeitos da decisão, assim como ressarcimento dos valores e promoções na carreira do magistrado”, concluiu.
Pelo menos três tentativas anteriores de retorno do juiz foram frustradas.
Em 1994, o TJ-SP indeferiu o pedido de aproveitamento, porque havia sido formulado prematuramente.
Novo pedido formulado muito tempo depois –em 2003– foi indeferido:
“O retorno do requerente ao exercício da atividade jurisdicional não atende ao interesse público’, uma vez que ‘os fatos que deram lastro à imposição da pena revestem-se de intensa gravidade (…), a desaconselhar o reaproveitamento colimado. Revelam, na realidade, um quadro incompatível com a judicatura’“, decidiu o TJ-SP.
O juiz protocolou pedido ao Conselho Nacional de Justiça, que não apreciou o caso, porque –segundo o então relator do Processo de Controle Administrativo– o órgão tem competência apenas para o controle de atos administrativos dos tribunais.
O juiz impetrou mandado de segurança no STF –tendo como órgão coator o CNJ– sustentando a “impossibilidade de manutenção de pena perpétua, situação decorrente, na prática, da negativa do Tribunal de Justiça do Estado de São Paulo em acolher pedido de reaproveitamento do impetrante”. (*)
Em dezembro de 2013, a ministra Rosa Weber indeferiu o pedido de liminar. Ela entendeu que “eventual acolhimento desses pedidos implicaria reforma não da decisão do CNJ, que nada dispôs a respeito, mas sim da decisão (aparentemente proferida há dez anos) do Tribunal de Justiça do Estado de São Paulo”.
A relatora registrou que o juiz teve negado –dez anos antes– o pedido de reaproveitamento pela via administrativa no TJ-SP:
“Tal pedido foi negado e não se tem notícia nos autos acerca de irresignação veiculada perante o próprio Tribunal de Justiça, que seria a instância competente para esse exame“, afirmou Rosa Weber em sua decisão.
O boletim da Anamages registra a seguinte manifestação do juiz sobre a atuação da entidade:
“O Magistrado Dr. Marcelo Holland Neto afirmou que o Presidente Magid foi excepcional, acreditando e dando continuidade no caso. Ele disse que a Anamages levantou suas esperanças em 2012 e o fez lutar. ‘A Anamages acreditou e materializou e agora só tenho a agradecê-la’”.
O boletim da Anamages registra a seguinte conclusão do presidente da entidade, Magid Nauef Láuar:
“A nossa Associação está crescendo e crescerá muito mais quando o magistrado verificar que a Anamages é a única que verdadeiramente defende o magistrado, em quaisquer circunstâncias“.
Em dezembro de 2005, a Folha publicou reportagem do editor deste Blog revelando que a Anamages tentou anular no Supremo Tribunal Federal a resolução antinepotismo. Na época, trabalhavam no Tribunal de Justiça de Minas Gerais a mulher e a sogra do presidente da entidade, desembargador Elpídio Donizetti Nunes.