Impeachment, interrogatório e direito ao silêncio

Frederico Vasconcelos

Sob o título “O interrogatório no impeachment”, o artigo a seguir é de autoria de Rogério Tadeu Romano, advogado e procurador regional da República aposentado.

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Noticia-se que os senadores começam a se preparar para enfrentar uma maratona de, pelo menos, sete dias para julgar definitivamente a presidente afastada, Dilma Rousseff, em seu processo de impeachment. A fase final começará no dia 25 e ela será ouvida pelos parlamentares e responderá a questionamentos na segunda, dia 29 de agosto.

A previsão dos senadores é de que a votação final aconteça apenas na quarta seguinte (31). Os parlamentares também deverão trabalhar em parte do final de semana.

Volto-me ao interrogatório do acusado, que é o último ato da instrução, possibilitando-se, pois, a melhor defesa, já que o quadro probatório estará praticamente concluído.

Consagra-se o principio da autodefesa, como corolário da ampla defesa. Parece-me que é vício gravíssimo no processo penal, durante o interrogatório, faltar ao réu a informação sobre o seu direito de permanecer calado. Aliás, resulta claro que as informações prestadas pelo acusado, no interrogatório, somente serão válidas, tendo vindo de forma espontânea em juízo, desde que lhe tenha sido dada a informação sobre a faculdade de se calar.

A ausência de tal informação leva a decretação de nulidade absoluta do processo, a partir do interrogatório, por força do princípio da causalidade. Soma-se a isso a possibilidade que deve ser dada ao acusado de entrevistar-se com o seu defensor, antes do interrogatório, para poder melhor municiar a defesa.

Tem o acusado direito ao silêncio, como se lê do artigo 5º, LXIII, da Constituição Federal. Trago a lição de GRINOVER, que transcrevo:

¨O réu, sujeito da defesa, não tem obrigação nem dever de fornecer elementos de prova que o prejudiquem. Pode calar-se ou até mentir. Ainda que se quisesse ver no interrogatório um meio de prova, só o seria em sentido meramente eventual, em face da faculdade dada ao acusado de não responder. A autoridade judiciária não pode dispor do réu, como meio de prova, diversamente do que ocorre com as testemunhas; deve respeitar a sua liberdade no sentido de defender-se como entender melhor, falando ou calando-se, e ainda advertindo-o da faculdade de não responder. Por isso afirma-se categoricamente que a única arma do interrogante é a persuasão(…).

Como bem aponta GRINOVER, do silêncio ou da mentira do réu não podem deduzir-se presunções que superem a presunção da inocência, solenemente proclamada no art. 9º da Declaração Universal dos Direitos do Homem e do Cidadão, ou que superem o ¨princípio in dubio pro reo¨.

É ainda GRINOVER quem conclui:

¨O retorno ao direito ao silêncio, em todo o seu vigor, sem atribuir-lhe nenhuma consequência desfavorável, é uma exigência não só de justiça, mas sobretudo de liberdade. O único prejuízo que do silêncio pode advir ao réu é o de não utililzar a faculdade de autodefesa que se lhe abre através do interrogatório. Trata-de uso de uma faculdade processual, ônus, que é dado ao réu, in Ciência Penal, I/15-31, 1976 ( O processo em sua unidade, São Paulo, Saraiva, pág. 111). O árbitro deve ser sua consciência, de que essa liberdade há de ser garantida em um dos momentos mais dramáticos para a vida de uma pessoa e mais delicado para a tutela de sua dignidade.¨