Renan e o exercício da audácia
Sob o título “Audácia!“, o artigo a seguir é de autoria do advogado José Paulo Cavalcanti Filho, de Pernambuco.
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Na tribuna, (Georges Jacques) Danton. Do “Comitê de Salvação Pública” da Revolução Francesa. A pergunta foi feita: O que é preciso para vencer os inimigos da República? O orador respondeu, sem hesitar: Audácia, ainda audácia, sempre audácia!”
Vejo Renan como um velho Danton, no Brasil de hoje. Não por estar combatendo os inimigos da República. Longe disso. Muito longe. Nem por ter as reconhecidas qualidades do francês. Também longe disso. Apenas pelo exercício da tal audácia. Mais preocupado com a pele que com sua biografia. A democracia não merece afastar o presidente do Senado por decisão monocrática, sentenciou nosso Danton amorenado. Já eu, penso é que a democracia não merece um presidente de poder que seja réu.
Para dar certo, seu plano inacreditável, precisaria ter o apoio de oito homens fracos. Teve. Difícil acreditar que nem mesmo um único e solitário membro da mesa do Senado (inclusive dois suplentes) tenha tido a sensatez, ou a coragem, de ponderar não ser adequado afrontar o Poder Judiciário. Que correto, formalmente, seria receber a notificação do oficial de justiça e recorrer da decisão. Mas, todos correndo riscos na Lava Jato e outras operações, preferiram o corporativismo. Contra o interesse coletivo. Em grave desrespeito às regras da Democracia. Como se olhassem para Renan e dissessem para eles mesmos, envergonhados, Eu sou você amanhã.
Imagino Lula sendo preso – caso provadas suas responsabilidades na ação em que é réu. Nesta e em outras que provavelmente virão, posto já ser indiciado em muitas. E dizendo que não aceita o julgamento. Ou não o acha justo. Vai ser uma festa. O assunto irá findar na ONU. Ou imagino a polícia, por qualquer razão, se recusando a cumprir um mandado – de prisão, de despejo, outro. Ou qualquer de nós deixando de pagar impostos por considerar que o governo os aplica mal. Não é assim que as democracias funcionam.
Nessa quarta, reuniu-se o pleno do Supremo. E decidiu evitar uma crise entre os poderes. Ontem, o oficial de justiça esperou em vão para cumprir suas obrigações. Há um homem, no Brasil, acima dele. E da justiça. Que pode escolher ser ou não citado. Hoje, revogou-se a liminar, trocaram-se os votos dados, entre mortos e feridos salvaram-se todos. E tudo voltou a ser como antes. Não foi, digamos com franqueza, um final à altura das tradições da casa. Mas segue a vida.
Danton – como Robespierre, Saint-Just e tantos mais –, acabou na guilhotina. Enquanto Renan escapou, rindo, vendo recompensada regiamente sua audácia. O que deve nos levar a reavaliar a comparação. Renan, pelo visto, não é Danton. É muito mais esperto. Muitíssimo. É (Joseph) Fouché, duque de Oranto.