O sacrifício do STF e os golpes abaixo da cintura
Em menos de uma semana, a crise política subiu de patamar com as primeiras revelações das delações da Odebrecht, colocando no olho do furacão o presidente Michel Temer e a cúpula do PMDB.
“Foi um azar que a Lava Jato e a crise econômica acontecessem ao mesmo tempo”, diz o doutor em sociologia Celso Rocha Barros, em artigo publicado na Folha, nesta segunda-feira (12).
Segundo o articulista, “o ajuste está sendo conduzido pela turma que foi delatada na sexta (9), e precisará ser aprovado pela turma que será delatada nos próximos meses”.
Ele vê no episódio da desobediência do presidente do Senado, Renan Calheiros (PMDB), que se recusou a cumprir uma decisão do Supremo Tribunal Federal, “a pior crise constitucional desde a redemocratização”.
Com a solução heterodoxa do plenário do STF no último dia 7, reformando a controvertida liminar concedida pelo ministro Marco Aurélio, “foi necessário sacrificar o prestígio do Supremo, uma das poucas instituições que ainda gozavam do respeito do público”, diz o articulista.
As delações veiculadas na mídia no último final de semana antecipam o confronto político que era previsto para 2017.
Devem enterrar a avaliação de ministros do STF –anunciada pelo jornal “Valor” na última sexta-feira– de que os julgamentos, nesta semana, de processos que afetam governadores “deixariam para trás” a repercussão negativa da tolerância da Corte diante do desafio e da desobediência do senador.
Em sua coluna no mesmo jornal, nesta segunda-feira, Marcos Nobre, professor de filosofia política da Unicamp, diz que o sistema político “entrou em estado de pânico permanente” desde novembro de 2015, quando o ministro Teori Zavascki, do STF, ordenou a prisão do senador petista Delcídio do Amaral, então líder do governo no Senado.
“Se mesmo parlamentares no exercício do mandato e com privilégio de foro podiam ser presos após o vazamento de uma gravação, ninguém poderia se considerar a salvo da exclusão direta e imediata do jogo”, diz Marcos Nobre.
“A recente vitória de Renan Calheiros na queda de braço com o STF pode dar a ilusão de que o impeachment [de Dilma Rousseff] finalmente alcançou seu objetivo e que a Lava Jato será travada, pelo menos no que diz respeito a quem tem privilégio de foro naquele tribunal. O contrário parece mais provável. O STF não tem força para fechar a caixa de arbitrariedades que ele próprio abriu. A última instância do Judiciário não pode desferir golpes abaixo da cintura constitucional e manter ao mesmo tempo a posição de árbitro imparcial”, diz Nobre.
“O preço que o STF pagou por enquadrar Marco Aurélio no caso Renan foi a humilhação pública do tribunal e o fortalecimento de seu mais notório franco-atirador.”
“Quem quiser sobreviver politicamente tem de se mostrar distante da política institucional. (…) Se quiserem se manter no jogo, tanto o STF como a Lava Jato terão de agir no sentido de tomar distância desses episódios recentes”, recomenda o pesquisador.