Arquivada reclamação contra ex-presidente do TRF

Frederico Vasconcelos

Decisão unânime contrariou parecer do procurador-geral, Rodrigo Janot. Roberto Haddad ainda responde a uma ação de improbidade.

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O Conselho da Justiça Federal (CJF) arquivou reclamação disciplinar requerida pelo Ministério Público Federal contra Roberto Luiz Ribeiro Haddad, ex-presidente do Tribunal Regional Federal da 3ª Região, com sede em São Paulo. A decisão foi unânime.

Haddad apresentou à Receita Federal, em 2001, uma declaração retificadora de Imposto de Renda contendo carimbo falso. O fato levou o Superior Tribunal de Justiça a abrir uma ação penal e a afastá-lo do cargo, em 2003 –também em decisão unânime.

O juiz retornou ao cargo em 2007, do qual se aposentou em 2013.

O relator da reclamação disciplinar, ministro Mauro Campbell, do STJ (Superior Tribunal de Justiça), repetiu em seu voto os motivos que levaram o Supremo Tribunal Federal a extinguir a ação penal contra Haddad por crime de falsidade.

Campbell considerou que houve “perda da relevância penal” dos crimes de uso de documento falso e sonegação fiscal. O MPF não havia comprovado a suspeita de enriquecimento ilícito, em outro processo criminal, e Haddad havia pago o imposto devido antes do recebimento da denúncia.

O relator seguiu o entendimento do ministro Gilmar Mendes, que concedera liminar em 2004, trancando a ação penal.

Haddad ainda responde a uma ação de improbidade, que aguarda há dez anos o julgamento de um recurso no Supremo para definir em qual tribunal o processo deve tramitar.

A decisão do Conselho da Justiça Federal foi tomada em dezembro último, em sessão presidida pela ministra Laurita Vaz, presidente do STJ.

O conselho contrariou recomendação do procurador-geral da República, Rodrigo Janot, que deu parecer favorável ao seguimento da reclamação.

Janot entendeu que a reclamação disciplinar não prescrevera –ou seja, não estava extinto o prazo legal para eventual punição– e que o processo não podia ser arquivado.

A reclamação foi instaurada em 2009. O magistrado pediu aposentadoria em outubro de 2013, concedida pela então presidente Dilma Rousseff. Somente atingiu a idade-limite [70 anos, na época] em novembro de 2014.

Resolução do CNJ prevê que “o magistrado que estiver respondendo a processo administrativo disciplinar só terá apreciado o pedido de aposentadoria voluntária após a conclusão do processo ou do cumprimento da penalidade”.

A lei complementar nº 64/1990 prevê inelegibilidade pelo prazo de oito anos, para qualquer cargo, de juízes que forem aposentados na pendência de processo administrativo disciplinar.

Até recentemente, a aposentadoria dos magistrados impossibilitava a aplicação de qualquer sanção administrativa. Janot citou precedente da corregedoria do CNJ. Em 2015, por unanimidade, o CNJ abriu processo disciplinar contra um desembargador, suspeito de venda de sentenças, que pediu aposentadoria voluntária dias depois de uma inspeção no Tribunal de Justiça do Ceará.

No parecer contra a extinção da reclamação disciplinar, Janot sustentou que “o agente deve responder pelos seus atos”. Invocou a “credibilidade do Poder Judiciário perante a sociedade” e a “valorização dos princípios éticos da magistratura”.

Acompanhado pelo colegiado, o ministro Campbell votou pelo arquivamento da reclamação, “sem prejuízo de eventuais sanções que vierem a ser impostas por força da ação de improbidade administrativa”.

Em 1999, a Folha revelou que Haddad ostentava um patrimônio que contrasta com o padrão dos juízes brasileiros.

Haddad moveu ação de indenização contra a Empresa Folha da Manhã S/A, que edita o jornal, tendo obtido decisão favorável em primeira instância.

Em 2007, por unanimidade, a 8ª Câmara de Direito Privado do TJ-SP reformou a sentença.

O relator, desembargador Fábio Henrique Podestá, registrou em seu voto que não viu “motivação legal para justificar a reparação pretendida”.

OUTRO LADO

A defesa do desembargador Roberto Haddad alegou no Superior Tribunal de Justiça, durante a tramitação da ação penal, que não houve crime de uso de documento falso, nem indícios de delito contra a ordem tributária.

Segundo os advogados, o uso de documento falso configuraria, em tese, um crime tributário, não podendo ser destacado como delito autônomo.

Ainda segundo a defesa, o desembargador não poderia ser afastado do cargo em razão da configuração, sempre em tese, “de infração de menor potencial ofensivo”.

O advogado Antônio Nabor Bulhões afirmou, em 2007, que “o único dado que emergiu do inquérito foi a suposta omissão de receita, no valor estrambótico de R$ 32 mil, da aquisição de um veículo”.

“A Receita autuou o desembargador por suposta omissão não-dolosa. Não agravou a multa aplicada. Entendeu que houve erro material. E se você paga o tributo, extingue a punibilidade com relação ao crime contra a ordem tributária. Vale para qualquer cidadão”, disse.

“O que se investigava era se a declaração retificadora tinha sido apresentada para ‘iludir’ a administração tributária”, diz. “Se a suposta fraude é praticada com o fito de iludir a administração tributária, o falso não assume a feição de crime autônomo”, disse

Procurado, o advogado Sebastião Botto de Barros Tojal, que representa Haddad em recurso na ação de improbidade no STF, não comentou o caso, até a conclusão desta edição.

A reportagem não conseguiu localizar o magistrado.