Lula não pode se candidatar, diz advogado
Sob o título “Lula é inelegível”, o artigo a seguir é de autoria de Rogério Tadeu Romano, advogado e procurador regional da República aposentado.
***
O site “The Intercept Brasil”, cofundado pelo jornalista Glenn Greenwald, escreveu um texto intitulado de “O amigo de 35 milhões”.
Nele, diz que as acusações são graves contra Lula “a ponto de, eventualmente, impedir sua candidatura à Presidência no ano que vem, caso seja condenado pelo juiz Sergio Moro e tenha a sentença confirmada em segunda instância”.
Como é de conhecimento, da leitura do site do STF, em 7 de dezembro de 2016, os réus em ação penal perante o Supremo Tribunal Federal (STF) não podem substituir presidente da República.
Com base nesse entendimento, o Plenário do STF decidiu que, na condição de réu, o senador Renan Calheiros (PMDB-AL) não poderia substituir o presidente da República em seus impedimentos eventuais. A maioria dos ministros, porém, votou pela manutenção no cargo de presidente do Senado, referendando parcialmente liminar concedida na no dia 5 de setembro de 2016, pelo ministro Marco Aurélio, que determinava o afastamento do senador da presidência daquela Casa.
O ministro Celso de Mello abriu a divergência no sentido de limitar os efeitos da liminar para impedir o exercício temporário da Presidência da República por quem figure como réu em ação penal no STF, sem, contudo, afastar o senador Renan Calheiros da presidência do próprio Senado.
O decano fundamentou seu voto nos princípios da independência e da harmonia entre os Poderes, e assinalou que, no caso concreto, não há urgência para o afastamento de Calheiros, porque a substituição imediata do presidente da República recairá sobre o presidente da Câmara dos Deputados. Ele ainda explicitou seu voto proferido no julgamento de mérito na ADPF 402, de modo a ajustar a parte dispositiva aos fundamentos que o embasaram.
Assim, ele esclareceu que julgou parcialmente procedente o pedido formulado na ADPF, para consignar que os substitutos eventuais do presidente da República, caso figurem na posição de réus criminais perante o Tribunal, ficarão unicamente impossibilitados de exercer a Presidência da República, embora possam exercer a chefia e direção de suas respectivas Casas.
O ministro Dias Toffoli acompanhou a divergência aberta pelo ministro Celso de Mello.
No mesmo sentido votou o ministro Teori Zavascki, lembrando que, em ação de sua relatoria que resultou no afastamento de Eduardo Cunha (PMDB-RJ) da Presidência da Câmara, o fato de ocupar a linha sucessória da presidência da República não foi o único motivo da decisão: Cunha também era acusado de interferir em investigações criminais em curso.
No caso do presidente do Senado, ele entende que a liminar deve se restringir aos limites estritamente necessários para estancar o dano irreparável. “Não me parece defluir da condição de presidente do Senado em fins de mandato outro risco de dano que não o eventual exercício do cargo de Presidente da República”, afirmou.
Dir-se-ia que Lula não pode ser candidato, mas se vencer, não poderá assumir a presidência da República.
Entendo, no entanto, que sendo réu, Lula já está impedido de se candidatar. Ele já é réu em cinco processos, três em Brasília e dois em Curitiba.
É o caso do entendimento do ex-ministro do TST Galba Veloso, ex-Consultor da República e da União: “Lula não pode disputar a titularidade de um cargo que não pode exercer sequer como interino, como decidiu o Supremo Tribunal Federal (STF) quanto a Renan Calheiros quando presidente do Senado”.
Lula é réu em vários processos. Os dois processos que estão mais maduros estão em Curitiba, com o juiz Sergio Moro, e em Brasília, com o juiz Vallisney de Oliveira.
No processo de Brasília, Lula já foi ouvido em março, e ele está nos procedimentos finais. A sentença pode sair a qualquer momento. Lula e o ex-senador Delcídio do Amaral são acusados de obstruir a Justiça comprando o silêncio do delator Néstor Cerveró, ex-dirigente da Petrobras.
Para impedir que ele delatasse integrantes do governo, a família de Cerveró teria recebido R$ 250 mil, a pedido de Lula. O ex-presidente pode ser enquadrado nos artigos 357 e 359 do Código Penal, sobre exploração de prestígio, quando alguém solicita ou oferece dinheiro com o objetivo de inibir o cumprimento de uma ordem judicial ou de uma diligência policial. Ou, ainda, influir sobre testemunha.
A pena é de multa e reclusão de um a cinco anos. A “obstrução da justiça” propriamente dita não é tipificada no Código Penal brasileiro. A Lei 12.850, de agosto de 2013, que define organização criminosa e dispõe sobre a investigação criminal e os meios de obtenção da prova, prevê que: “nas mesmas penas incorre quem impede ou, de qualquer forma, embaraça a investigação de infração penal que envolva organização criminosa” (art. 2º, $ 1º da Lei nº 12.850/2013). A pena prevista é de reclusão, de três a oito anos, e multa. Se condenado nas instâncias ordinárias processuais, Lula deveria ser preso.
Mas independente disso é inelegível, por simetria ao que se aplica em casos similares.
Trata-se de aplicação do instituto da analogia.
A analogia, do ponto de vista jurídico, é a aplicação a um caso não previsto em lei, de disposição relativa a uma hipótese semelhante. O fundamento da analogia, na lição de Carlos Maximiliano (Hermenêutica e Aplicação do Direito, pág. 228, n. 240), é o principio da verdadeira justiça, de igualdade jurídica, o qual exige que as espécies semelhantes sejam reguladas por normas semelhantes”.
São pressupostos da analogia: a) caso não previsto em lei; b) semelhança entre os casos, o não previsto em lei e o previsto; c) a semelhança fundamental e real, e não simplesmente acidental e formal, entre os casos.
Há a analogia legis e a analogia iuris. A primeira é a prevista na Lei como se vê na Lei de Introdução, artigo 7º. Na lição de Carlos Maximiliano(obra citada, pág. 229) a analogia legis apoia-se em uma regra existente, aplicável à hipótese semelhante à essência; a analogia juris lança mão do conjunto de normas disciplinadoras de um instituto que tenha pontos fundamentais de contato com aquele que os textos positivos deixaram de contemplar.
Seria caso de ajuizamento, a seu tempo, caso Lula seja candidato, de Ação de Impugnação de Registro de Candidatura – AIRC.
Todos aqueles que desejarem concorrer a qualquer cargo eletivo deverão preencher condições de elegibilidade, além de não incidirem em quaisquer dos casos legalmente previstos de inelegibilidade.
A Constituição Federal prevê no §3.º do seu art. 14 as condições de elegibilidade, na forma da lei, ao passo que a Lei Complementar n.º 64/90 dispõe, de acordo com o art. 14, § 9º da CF, sobre os casos de inelegibilidade.
Assim, os partidos políticos e as coligações deverão requerer ao Juízo Eleitoral competente o registro de candidatura na forma prevista em lei e em resolução específica editada pelo Tribunal Superior Eleitoral para cada eleição.
Os pedidos de registro de candidatura que não preencherem as condições de elegibilidade, ou cujos candidatos tenham incidido nalguma das hipóteses de inelegibilidade, ou ainda, daqueles candidatos que não tenham apresentado documentos indispensáveis, de acordo com o § 1.º, do art. 11 da Lei n.º 9.504/97, poderão ser impugnados por meio da chamada Ação de Impugnação de Registro de Candidatura – AIRC, prevista no art. 3.º da LC 64/90, a qual se trata de verdadeira ação judicial eleitoral prevista especificamente para essa finalidade.
O Ministério Público Eleitoral e Partidos Políticos estão legitimados para tal.
O prazo para propositura da ação de impugnação de registro de candidatura é decadencial e está previsto no artigo 3.º da LC 64/90, de cinco dias, contados da publicação do edital do pedido de registro de candidatura na imprensa, seja oficial ou não, ou da publicação do edital por afixação na sede da Zona Eleitoral ou Tribunal Regional Eleitoral.
O procedimento tem rito célere.
Consequência do que é previsto no art. 15 da Lei Complementar 64/90 é que uma vez transitada em julgado ou publicada a decisão proferida por órgão colegiado que declarar a inelegibilidade do candidato, o registro será negado, ou se já tiver sido feito será cancelado, ou ainda, declarado nulo o diploma se já tiver sido expedido.
Ademais, a declaração de inelegibilidade de candidatos a chefe do Executivo de qualquer ente federativo não atingirá os candidatos a vice, nem a destes a daqueles, conforme reza o art. 18 da LC 64/90.