Duas decisões sobre ofensas a nordestinos

Frederico Vasconcelos

O Tribunal Regional Federal da 3ª Região (SP-MS) confirmou a condenação de um réu que publicou, em 2007, ofensas anônimas a nordestinos na rede social Orkut.(*)

Segundo informa o TRF-3, ele participava da comunidade virtual da rede “Sou Paulista, não Brasileiro” e propôs que todos os nordestinos deveriam ser expulsos de São Paulo em uma postagem que os comparava a vermes, chamada “Dia do Pé na Bunda deles”.

O réu foi condenado pela 1ª Vara Federal de Campinas a dois anos de reclusão pela prática de discriminação e preconceito por meio de publicação em rede social (artigo 20, §2º, da Lei nº 7.716/1989). A sentença também determinou a substituição da pena privativa de liberdade por restritivas de direitos além de pena pecuniária.

O réu alegou ausência de provas de sua autoria. Negou ter publicado todas as mensagens e argumentou que, embora tenha nascido em Santo André (SP), sua família tem origem em Pernambuco e na Bahia, e que, portanto, não seria capaz de produzir essas ofensas.

O desembargador federal Wilson Zauhy, relator do acordão, declarou que a autoria e a materialidade do crime estão devidamente comprovadas nos autos.

“No caso dos autos, resta evidenciado o dolo do acusado, primeiramente, pelo propósito discriminatório e segregacionista da comunidade virtual que participava (“Sou Paulista, não Brasileiro”), outrossim, a postagem incita a prática discriminatória ao propor expulsar todos os nordestinos de São Paulo e claramente ofende a dignidade desta parcela da população brasileira ao equipará-los a vermes”, declarou o desembargador.

A turma julgadora determinou o imediato cumprimento da pena, considerando o decidido pelo Supremo Tribunal Federal no HC nº 126.292 e nas ADCs 43 e 44.

No segundo caso, a Terceira Seção do Superior Tribunal de Justiça definiu que o processo sobre declarações do jornalista Diogo Mainardi no programa “Manhattan Connection“, da Globo News, logo após as eleições de 2014, deverá prosseguir na 13ª Vara da Justiça Federal em Pernambuco.

Segundo informa o STJ, Mainardi afirmou que o Nordeste “sempre foi retrógrado, sempre foi governista, sempre foi bovino”. Um cidadão representou contra o jornalista.

Ao decidir um conflito de competência entre a Justiça Federal no Rio de Janeiro e a Justiça de Pernambuco, os ministros do STJ decidiram que o suposto crime (racismo ou discriminação) deve ser processado e julgado por um terceiro juízo, que foi o primeiro a tomar conhecimento dos fatos.

O relator do caso, ministro Felix Fischer, acolhera o parecer do Ministério Público Federal, tendo votado pela concessão de habeas corpus de ofício para o trancamento da ação penal, por entender que não houve crime nas opiniões emitidas pelo jornalista.

A maioria, no entanto, seguiu a posição divergente do ministro Reynaldo Soares da Fonseca, que entendeu que não seria adequado reconhecer de ofício a atipicidade da conduta. Para ele, a dúvida existente sobre a tipificação das declarações feitas durante o programa é motivo suficiente para a atuação do juízo competente na investigação do fato.

“A simples sinalização da dúvida com relação à tipicidade do delito em discussão no feito em que se suscita o conflito já é suficiente para chamar a atenção do juízo competente para a questão, provocando sua deliberação, sem que haja prejuízo para qualquer das partes ou prolongamento excessivo ou injustificado do andamento do processo”, justificou o ministro.

Em novembro de 2014, a o portal “Imprensa” divulgou que Mainardi “pediu desculpas ao Nordeste após relacionar a região com termos pejorativos”.

Ainda segundo o portal, Mainardi explicou o contexto de suas declarações:

“Sei que o termo bovino ofendeu muita gente, peço mais uma vez desculpas, mas gostaria de esclarecer que há décadas e décadas nós usamos os termos curral eleitoral e voto de cabresto para designar compra de votos”.

“Imaginar um nordestino num curral ou um nordestino com um cabresto não é diferente de bovino. Não pretendi em momento algum culpar a vítima da manipulação e sim quem a pratica. Só isso”, completou.

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(*) Apelação Criminal 0003609-04.2011.4.03.6105/SP