Retorno de Aécio “afronta regras processuais”

Frederico Vasconcelos

Eleito pelo povo, senador não está acima da lei, afirma advogado.

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Sob o título “Uma decisão lamentável“, o artigo a seguir é de autoria de Rogério Tadeu Romano, advogado e procurador regional da República aposentado.

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O ministro Marco Aurélio determinou que o senador Aécio Neves, gravado pedindo R$2 milhões a Joesley Batista, dono da JBS, retome o seu mandato de senador de que estava afastado desde 18 de maio do corrente ano.

Ao assumir os processos de Aécio Neves, em discussão para tema, o ministro disse inicialmente que não tomaria sozinho decisões em recursos contra determinações do ministro Edson Fachin, levando-os para julgamento da Primeira Turma, composta por cinco dos onze ministros do Supremo Tribunal Federal. Mas, com a chegada do recesso de julho, quando o tribunal para de funcionar, ele mudou de opinião e resolveu decidir sozinho.

O ministro Marco Aurélio afirmou que “o Judiciário não pode substituir-se ao Legislativo, muito menos em ato de força a conflitar com a harmonia e independência dos poderes”.

Foi negada ainda pelo ministro a prisão do senador.

“A controvérsia reveste-se de importância maior, envolvendo, sob a óptica da atuação parlamentar, a separação, independência e harmonia de poderes reveladas na Constituição Federal”, escreveu ele na decisão.

Na decisão, Marco Aurélio informou que restabelece “a situação jurídico-parlamentar então detida, afastando as demais restrições implementadas”.

Ao negar o pedido de prisão, afirmou que o voto do eleitor deve ser respeitado.

“A liminar de afastamento é, de regra, incabível, sobretudo se considerado o fato de o desempenho parlamentar estar vinculado a mandato que se exaure no tempo”, escreveu o magistrado.

“Em síntese, o afastamento do exercício do mandato implica esvaziamento irreparável e irreversível da representação democrática conferida pelo voto popular.”

Com o devido respeito a decisão reportada afronta regras processuais e ademais aos princípios da jurisdição, igualdade e da república.

Com o devido respeito, houve um excesso processual na decisão monocrática que determinou o retorno do senador Aécio Neves ao Senado.

Caberia ao novo relator, ministro Marco Aurélio, submeter a matéria à 1ª Turma do STF, órgão de controle fracionário, diante do agravo regimental que fora ajuizado.

Um ministro não revoga decisão monocrática de outro colega.

A sessão de terça-feira passada (27) era própria para o ministro Marco Aurélio Mello submeter a decisão interlocutória tomada pelo antigo relator ministro Edson Fachin ao órgão colegiado.

Não o fez: resolveu decidir de forma monocrática, não tomando conhecimento do órgão fracionário de que faz parte, e das regras concernentes do agravo regimental, próprias para o reexame de decisão monocrática de presidente, relator do tribunal, para rediscussão pelos seus colegas.

A decisão foi tomada no último dia, antes do recesso forense de julho, em absoluta posição de surpresa para a acusação.

Afrontou a decisão o artigo 319 do Código de Processo Penal, negando sua vigência, outrossim, ao não dar conhecimento ao direito fundamental à jurisdição e ao negar incidência à tutela cautelar, ao poder cautelar próprio que é emanado da Constituição.

A ele estão submetidos todos, inclusive aqueles que exercem um mandato parlamentar.

Por ser eleito pelo povo, o parlamentar não está acima da lei. Ele não está submetido a decisão apenas por seus pares. Ele, parlamentar, como todos, estão sujeitos ao crivo do Poder Judiciário seja em sede de medidas cautelares ou ainda executivas que se seguirem a uma eventual condenação, situação essa cuja execução independe do crivo do Parlamento.

Em parecer enviado ao Supremo, o procurador-geral da República, Rodrigo Janot, manifestou-se contra a necessidade de autorização pelo Congresso para a aplicação de medidas cautelares contra parlamentares, como o afastamento temporário de suas funções. Para ele, essas medidas no processo penal possuem caráter acessório e visam a garantir efetividade de ações principais.

A manifestação foi dada na Ação Direta de Inconstitucionalidade (ADI) 5526 proposta pelos partidos Progressista (PP), Social Cristão (PSC) e Solidariedade (SD).

Por conferirem tratamento especial perante o estado, no que toca ao sistema penal e processual penal –ou seja, por significarem tratamento distinto do aplicável aos demais cidadãos–, os preceitos constitucionais que asseguram prerrogativas parlamentares deve ser interpretados de forma restritiva, sustenta.

De acordo com Janot, o próprio texto constitucional prevê a possibilidade de o Judiciário exercer poder cautelar.

Ele explica que o artigo 5º, inciso XXXV, ao dispor que ‘a lei não excluirá da apreciação do Poder Judiciário lesão ou ameça a direito’, assegura tutela jurisdicional adequada e concede a magistrados judiciais poderes para evitar que o provimento jurisdicional final perca utilidade.

“Não faria sentido que a Constituição reputasse direito fundamental o acesso à via judicial, impondo que pedidos sejam apreciados em prazo razoável, para que a solução oferecida pelo provimento jurisdicional fosse inócua, inútil, dada a impossibilidade de assegurá-la com medidas cautelares”, afirma o procurador-geral.

Para Janot, a determinação judicial de afastamento provisório do exercício de mandato parlamentar constitui medida que, apesar de excepcional, não se equipara à decretação de prisão cautelar, razão pela qual não incide sobre ela a garantia da incoercibilidade pessoal relativa do artigo 53, parágrafo 2º, da Constituição.

O procurador-geral alertou que “submeter medidas cautelares do sistema processual penal a crivo da casa legislativa, quando deferidas contra membros do Congresso Nacional, malferiria o princípio da inafastabilidade da jurisdição, ofenderia o princípio da isonomia e fragilizaria indevidamente a persecução criminal”.

Ele observa que “seria ampliação indevida do alcance das imunidades parlamentares, com manejo de ação de controle concentrado de constitucionalidade para instituir procedimento absolutamente novo, não previsto pelo constituinte de 1988”.

A matéria já foi enfrentada pelo STF quando o ministro Teori Zavascki concedeu a liminar em ação pedida pelo procurador-geral da República, Rodrigo Janot, em dezembro de 2015, que argumentou que Cunha estava atrapalhando as investigações da Lava Jato, na qual o deputado é réu em uma ação e investigado em vários procedimentos.

Numa República é inconcebível um tratamento diferenciado.