Quem vai auxiliar Raquel Dodge na transição

Frederico Vasconcelos

Procuradora da República aposentada diz que previsão de aumento de 16,9% é ‘bofetada na cara’ de desempregados.

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A futura procuradora-geral da República, Raquel Dodge, indicou ao atual PGR, Rodrigo Janot, cinco procuradores que vão integrar a Comissão de Transição para discutir a próxima gestão do Ministério Público Federal.

São eles: Alexandre Espinosa Bravo Barbosa, Lauro Pinto Cardoso Neto, Raquel Branquinho Pimenta Mamede Nascimento, Alexandre Camanho de Assis e José Alfredo de Paula e Silva.

Todos atuam na Procuradoria Regional da República da 1ª Região (com sede em Brasília). Raquel Branquinho é a procuradora-chefe da PRR1.

No grupo escolhido por Dodge estão procuradores que atuaram no mensalão, na Operação Zelotes e na Operação Sanguessuga. Alexandre Camanho foi presidente da ANPR (Associação Nacional dos Procuradores da República). Lauro Pinto Cardoso Neto foi secretário-geral do Ministério Público Federal.

Já a equipe a ser indicada por Janot para a comissão provavelmente será formada pelos atuais ocupantes das secretarias e assessorias da PGR.

A nomeação de Raquel Dodge pelo presidente Michel Temer no dia seguinte à aprovação do Senado criou uma situação sem precedentes. “A escolha foi rápida, dando tempo para uma transição que mereça esse nome”, diz José Robalinho Neto, presidente da ANPR. As nomeações anteriores foram feitas no final dos mandatos.

O ritual de passagem já está sendo cumprido, como confirma a sessão extraordinária do Conselho Superior do Ministério Público Federal (CSMPF), realizada nesta terça-feira (25).

A principal decisão do CSMPF foi a aprovação da previsão de reajuste salarial de 16,7% aos procuradores, alterando a proposta orçamentária elaborada pela gestão de Janot.

A ANPR divulgou “Nota de Esclarecimento“, afirmando que “o texto aprovado não apresenta nenhuma novidade, são os mesmos valores encaminhados nos orçamentos de 2016 e 2017” [veja íntegra abaixo].

Conforme revelou reportagem de Reynaldo Turollo Junior, na Folha, “ao pedir a inclusão do reajuste, a futura procuradora-geral atendeu a pleito da ANPR, que está em campanha pelo aumento dos salários.

Ainda segundo o mesmo texto, “a peça orçamentária, cujo relator foi o vice-procurador-geral, José Bonifácio de Andrada, não previa o reajuste sob a justificativa de que a PEC 95, que estipulou no ano passado um teto de gastos para o serviço público, impôs sérias restrições”.

Raquel Dodge participou da votação como conselheira. Trouxe o voto escrito, com enfoque na sua gestão como PGR.

Para procuradores ligados ao atual PGR, Janot e Bonifácio foram os destaques da sessão, porque conduziram a solução do problema salarial. Dodge e Andrada, por sua vez, sugeriram atender integralmente o pedido de verbas da força-tarefa de Curitiba –o que foi aprovado pelo conselho.

Para procuradores ligados a Dodge, a atuação dela no CSMPF foi considerada excelente, muito ponderada, confirmando que estudou profundamente o tema.

O fato de Dodge ter enviado a Janot um ofício com 40 questões, no mesmo dia em que foi nomeada, sugere que ela deve ter percebido que seria a escolhida por Temer ainda durante a campanha para formação da lista tríplice da ANPR.

Para Robalinho, “foi a primeira vez que houve uma discussão mais séria sobre o orçamento”. Segundo ele, Dodge e Janot deram uma demonstração de “maturidade”, e a deferência do atual PGR resultou num “empoderamento” do Conselho Superior do MPF.

Essa não é, contudo, uma leitura unânime.

A procuradora regional da República aposentada Ana Lúcia Amaral, de São Paulo, classificou como um “show de hipocrisia” o fato de Janot cumprimentar Dodge e, em seguida, o conselho aprovar a decisão de incluir a previsão de reajuste de 16%.

“Isso reforçou minha certeza: as corporações instaladas em Brasilia distanciam-se da realidade. Aumento de 16% é uma bofetada na cara de 14 milhões de desempregados”, diz a procuradora.

Para o procurador da República Celso Três, do Rio Grande do Sul, “como todas as carreiras –exceto juízes e procuradores– já ganharam a reposição salarial de 16%, a presença desse item na proposta de orçamento era óbvia”.

Três diz que, “a exemplo da atual presidente do Supremo Tribunal Federal [ministra Cármen Lúcia], Janot busca a popularidade exibindo-se franciscano”.

“Valores republicanos, coisa pública acima das personalidades, imporiam a Rodrigo Janot declinar toda proposição orçamentária a Raquel Dodge, sob cuja gestão será executada. Mas, para aquele, nisto também vale sua máxima: ‘enquanto houver bambu, vai flecha'”, diz Celso Três.

Mais de 80% do orçamento do MPF previsto para 2018 está comprometido com gastos obrigatórios (salários e benefícios, principalmente). A previsão total é de R$ 3,84 bilhões, dos quais R$ 3,25 bilhões serão para esse fim.

Como observou a reportagem da Folha, “caberá à Comissão de Transição discutir os ajustes no orçamento solicitados pela futura procuradora-geral –por exemplo, de onde sairão os R$ 116 milhões necessários para o reajuste salarial pretendido”.

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Eis a íntegra da “Nota de Esclarecimento da ANPR”:

A Associação Nacional dos Procuradores da República (ANPR) vem a público esclarecer informações publicadas equivocadamente em diversos veículos de comunicação, sobre a Proposta de Orçamento para 2018 aprovado hoje, 25, no Conselho Superior do Ministério Público Federal (CSMPF).

O texto aprovado não apresenta nenhuma novidade, são os mesmos valores encaminhados nos orçamentos de 2016 e 2017. A medida vem sendo discutida desde 2015, através do PL 2647/15 da Câmara dos Deputados (PLC nº 28/2016 do Senado Federal). Tramita em conjunto o PL 27/2016 que também trata dos subsídios dos Ministros do Supremo Tribunal Federal, vez que há equiparação salarial entre o Procurador da República e juízes federais. Apenas depois de aprovado o Projeto de Lei é que haverá alteração dos subsídios.

O reajuste citado de 16,38% vem sendo amplamente discutido nos dois últimos anos e busca uma recomposição parcial das perdas sofridas em razão da inflação entre 2014 e 2015 e está dentro dos limites da Emenda Constitucional nº 95, respeitando o teto de gastos do funcionalismo público. Por esta razão não haverá nenhum aumento de gastos públicos.

O impacto estimado pelo Ministério Público da União (MPU) é de R$ 116 milhões que serão compensados, preservando integralmente as atividades fins da instituição, sem prejudicar o combate a corrupção e o compromisso com a missão constitucional do MPF.

Como prova do comprometimento total do MPF com a sua missão constitucional, o CSMPF aprovou também o valor integral de recursos de R$ 1,65 milhão para a Força Tarefa da Lava Jato, em Curitiba e determina prioridade para as demais forças tarefas. É compromisso do MPF continuar prestando os seus serviços de excelência e cumprir função constitucional.

A proposta será enviada ao poder Executivo para que seja inserida no projeto de lei do Orçamento de 2018, que precisa ainda ser aprovado pelo Congresso Nacional.