O indecente auxílio-moradia retroativo

Frederico Vasconcelos

O corregedor nacional de Justiça, ministro João Otávio de Noronha, suspendeu liminarmente ato do Tribunal de Justiça do Rio Grande do Norte que concedia o pagamento de auxílio-moradia retroativo aos magistrados estaduais.

O ato derrubado provisoriamente considera que “a ajuda de custo para moradia representa um direito preexistente aos magistrados” e reconhece como “escorreita sua percepção retroativa há cinco anos, mediante incidência de correção monetária e juros”.

O auxílio-moradia é definido pelo ministro Gilmar Mendes como “maldito e malfadado”. O benefício retroativo, em tempos de crise econômica, é algo no mínimo indecente.

Noronha justificou a medida liminar, entre outros motivos, pelo receio de dano irreparável.

A medida viola decisões do Supremo Tribunal Federal e do Conselho Nacional de Justiça.

“Se o pagamento for efetuado e posteriormente declarado inconstitucional (pelo STF) ou até mesmo ilegal (pelo CNJ) trará sérios problemas devido a dificuldade de ressarcimento ao erário”, registrou o corregedor nacional.

Como todos os tribunais do país, o Tribunal de Justiça do Rio Grande do Norte sofreu contingenciamento em seus orçamentos.

Inspeção recente naquele tribunal revelou “inúmeras outras necessidades, tais como reformas de infraestrutura”, apontou o ministro.

A pretensão retroativa dos magistrados do Rio Grande do Norte não é isolada e tem antecedentes.

Em julho de 2016, o ministro Dias Toffoli, do STF, julgou inviável mandado de segurança em que a Associação dos Magistrados do Estado do Amapá (Amaap) tentava anular suspensão do pagamento retroativo do auxílio-moradia pelo tribunal estadual. A entidade buscava anular decisão do Conselho Nacional de Justiça.

Na mesma época, o Conselho Nacional do Ministério Público (CNMP) suspendeu em medida liminar decisão do Ministério Público do Rio de Janeiro, que pretendia reajustar o valor do auxílio-transporte como forma de compensação pela proibição de pagamento retroativo do auxílio-moradia.

Em dezembro de 2014, a Associação dos Magistrados do Estado de Goiás divulgou nota sobre a paralisação que os servidores do Tribunal de Justiça de Goiás pretendiam realizar em protesto contra o pagamento do auxílio-moradia retroativo a cinco anos para os magistrados. Segundo sustentou a entidade, trata-se de “um direito da magistratura”.

Em novembro de 2014, o Tribunal de Justiça de São Paulo considerou “mera especulação” o pedido de entidade dos servidores ao Conselho Nacional de Justiça e negou que pretendesse fazer pagamentos do auxílio-moradia de forma retroativa, como alegou a Assojuris (Associação dos Servidores do Poder Judiciário do Estado de São Paulo) em requerimento protocolado no CNJ.

Em junho de 2013, o então conselheiro do CNJ Bruno Dantas (hoje ministro do TCU) concedeu liminar que suspendeu o pagamento de auxílio-alimentação retroativo a magistrados de oito estados.

Em agosto deste ano, os magistrados estaduais de Pernambuco anunciaram que receberiam R$ 7 milhões a título de pagamento retroativo de auxílio-alimentação durante as férias. O benefício foi obtido a partir de requerimento da Associação dos Magistrados de Pernambuco (Amepe) ao Tribunal de Justiça de Pernambuco.