Maluf, Delfim e os excessos de protagonismo

Frederico Vasconcelos

Por uma mera coincidência, o ex-ministro Delfim Netto –pela segunda vez– dedica sua coluna na Folha ao Supremo Tribunal Federal no mesmo dia em que o noticiário trata da condenação do deputado Paulo Maluf (PP-SP).

Nesta terça-feira (10), a Primeira Turma do STF negou recurso de Maluf, condenado em maio a 7 anos, 9 meses e 10 dias de prisão por crimes de lavagem de dinheiro envolvendo desvios de dinheiro em obras em São Paulo.

Delfim Netto publica hoje (11) artigo sob o título “Sacralizamos o STF para garantir que ninguém esteja acima de seu controle“.

O colunista trata do “avanço da ‘judicialização da política’, acompanhado da ‘politização da Justiça'” e dos “perigos que podem advir da supremacia do Poder não eleito, o Judiciário, sobre os Poderes eleitos, o Executivo e o Legislativo”.

No dia 24 de maio, quando foi divulgada a condenação de Maluf, Delfim Netto publicou artigo na Folha sob o título “Brasil implora rapidez ao STF”.

Não há referências , nas duas peças, a  Maluf –“símbolo de corrupção ao longo de décadas no folclore brasileiro”, como já definiu o jornal, em editorial.

Diz o articulista nesta quarta-feira:

“A fundamental importância do Judiciário no controle e na harmonização da ação dos três Poderes pode ser prejudicada pelo ‘excesso de protagonismo’ quando a ‘mídia’ deixa de lado a sua obrigação de exercer a crítica e assume o papel de ‘juiz de instrução’: divulga seletivamente delações, constrange testemunhas, constrói ‘provas’ e condena. Esquece o caso (sem pedir desculpas!) quando o ‘culpado’ é eventualmente absolvido por falta de provas…”

A mídia comete excessos. Mas, para não deixarmos de lado a obrigação de exercer a crítica, o comentário do articulista permite algumas observações sobre o caso Maluf:

1) Sobre construção (e falta) de provas, a mídia registra que os advogados de Maluf juntaram novos documentos, obtidos junto a autoridades da Ilha Jersey, segundo os quais o deputado não teria como movimentar as contas onde se encontravam os valores pelos quais foi condenado, o que descaracterizaria as provas da acusação.

O ministro relator, Edson Fachin, votou por desconsiderar tais documentos, alegando que ao longo de oito anos de instrução processual o condenado teve a oportunidade de produzir provas de sua inocência, o que não fez.

Segundo o voto de Fachin, com o recurso, “o embargante [Maluf] intenta, na verdade, reabrir a discussão da causa, promover a reanálise dos fatos e provas, e atacar os fundamentos do acórdão condenatório visando à reforma do julgado, o que não cabe na via estreita dos embargos de declaração”.

Os ministros Luís Roberto Barroso, Rosa Weber e Luiz Fux acompanharam Fachin. Marco Aurélio foi voto vencido, e a decisão condenatória foi confirmada. Como houve decisão por maioria, Maluf poderá ajuizar novos embargos, desta feita infringentes.

2) Sobre contrangimentos de testemunhas, vale relembrar o que este Blog registrou, em maio, em post sob o título “Paulo Maluf e a morosidade da Justiça“, quando o STF condenou o deputado por lavagem de dinheiro:

Em 2009, em outra ação contra Maluf, o ministro Joaquim Barbosa ficou inconformado porque, depois de um ano e meio, uma intimação para ouvir Delfim Netto como testemunha de defesa ainda não havia sido entregue.

Segundo o advogado José Roberto Leal de Carvalho explicou na época, Delfim não foi intimado porque foi procurado no endereço errado em uma das oportunidades. Nas outras, ora não estava no Brasil, ora estava doente.

4) Sobre o direito de defesa de Maluf, as declarações de seu advogado, Antonio Carlos de Almeida Castro (Kakay), em maio, também valem para a decisão desta terça-feira. Kakay afirmou que vai recorrer e que o deputado segue confiando na Justiça”.

Igualmente, continua atual o editorial da Folha publicado em maio, ao afirmar que a condenação de Maluf representa a “combinação de incompetência dos investigadores e morosidade da Justiça, quase sempre resultando em prescrição, que alimenta o sentimento de impunidade no meio político”.