Os sinais emitidos por Cármen Lúcia
Ao afirmar que o Supremo Tribunal Federal vai se “apequenar” se a condenação de Lula servir de justificativa para a Corte rediscutir a prisão em segunda instância, a ministra Cármen Lúcia, aparentemente, emite sinais para o público externo e interno.
“Não creio que um caso específico geraria uma pauta diferente. Isso seria realmente apequenar o Supremo”, disse na noite desta segunda-feira (29), em evento organizado pelo site “Poder 360”, em Brasília.
“Se acontecer de alguém levar em mesa, é outra coisa, não é pauta do presidente”, afirmou, segundo relato de Leandro Colon, da Folha.
A ministra estaria se antecipando aos pares, diante das notícias de bastidores que acenam com nova votação sobre o tema, hipótese estimulada pelo receio de uma convulsão social com a prisão do ex-presidente.
Para o público externo, o STF já teria mandado recado ao PT: “Se alguma chance existe de a corte soltar Lula caso ele seja preso, ela pode desaparecer caso a legenda suba o tom de suas críticas contra o Judiciário”, informa a colunista Mônica Bergamo.
Não parece assustar o STF a iniciativa do advogado britânico Geoffrey Robertson, contratado pelo ex-presidente, de enviar à Comissão de Direitos Humanos das Nações Unidas documento com avaliação de que Lula não teve um julgamento “justo”, e que o sistema judicial brasileiro é “arcaico”.
Segundo relata o “Valor“, Robertson diz que “é bizarro e surpreendente” ter visto o procurador-regional da República sentado ao lado do presidente da Turma do TRF-4, quando o tribunal regional manteve a condenação e ampliou a pena aplicada ao ex-presidente pelo juiz Sergio Moro.
Se o STF voltar a discutir a prisão em segunda instância, provavelmente a procuradora-geral da República estará sentada ao lado da presidente da Corte.
As declarações de Cármen Lúcia ocorrem quando o STF está na berlinda, na mira dos que condenam o “desgoverno procedimental” do Supremo.
É uma crítica que alcança os onze membros de uma corte, onde –no dizer do professor Conrado Hübner Mendes– “quando um não quer, 11 não decidem; quando um quer, decide sozinho por liminar e sujeita o tribunal ao seu juízo de oportunidade”.
Em relação ao público interno, a presidente do STF também está sob pressão de associações da magistratura e do Ministério Público, que deverão entregar, nesta quinta-feira, carta aberta com reivindicações sobre a revisão dos subsídios.
Durante 2017, Cármen Lúcia foi criticada por não colocar em pauta a questão do auxílio-moradia.
No início de 2018, ela emitiu dois sinais: a) não tomará a iniciativa de rediscutir a possibilidade de prisão em segunda instância; b) colocará em pauta, em março, a liminar que estendeu o auxílio-moradia a todos os magistrados e abriu a porteira para a concessão do benefício a membros do Ministério Público.
Parece improvável que Cármen Lúcia reveja sua opinião sobre o início do cumprimento da pena após condenação em segunda instância: foi dela o voto de desempate, em 2016, quando o STF admitiu essa possibilidade.
Em 2009, Cármen Lúcia e os ministros Joaquim Barbosa e Menezes Direito ficaram vencidos quando o STF, no julgamento do Habeas Corpus 84078, passou a condicionar a execução da pena ao trânsito em julgado da condenação.
Em junho de 2013, Cármen Lúcia voltaria a rever a decisão colegiada de 2009, ao determinar a antecipação do trânsito em julgado da condenação do ex-deputado Natan Donadon, mesmo na pendência de embargos de declaração, tidos como protelatórios.
Essa decisão, por sinal, foi mencionada pelo juiz Sergio Moro, ao manifestar neste Blog, em agosto de 2016, o que esperava da gestão de Cármen Lúcia no comando do STF:
“Há grande expectativa pela presidência da ministra Cármen Lúcia, considerando a sua excelente reputação como magistrada, responsável por decisões importantes no Supremo Tribunal Federal, como a relatoria da Ação Penal 360, que resultou na condenação e prisão do ex-Deputado Federal Natan Donadon por desvios de recursos públicos, rompendo com um tradição de impunidade em relação a crimes dessa espécie”.