Primeira denúncia da Lava Jato recebida no STJ

Frederico Vasconcelos

A denúncia contra o ex-ministro das Cidades Mário Negromonte, atual conselheiro do Tribunal de Contas dos Municípios da Bahia, foi a primeira vinculada à Operação Lava Jato recebida pelo Superior Tribunal de Justiça.

A denúncia por suposto crime de corrupção passiva foi recebida –por unanimidade– nesta quarta-feira (21) pela Corte Especial do STJ.

Negromonte é o primeiro réu de ação penal originária do STJ de fatos investigados naquela operação.

Foi também a única denúncia vinculada à Lava Jato oferecida até agora no STJ pelo Ministério Público Federal. Nos demais casos, o órgão requereu diligências e ainda não ofereceu denúncia.

A peça de acusação foi oferecida em setembro de 2017. O relator, ministro Luis Felipe Salomão, acredita que há chance de o tribunal julgar o caso até o final do ano.

Para auxiliá-lo em seu gabinete, Salomão convocou em 2016 o então juiz e hoje desembargador Carlos Vieira von Adamek, do Tribunal de Justiça de São Paulo. Ele também é juiz auxiliar da Corregedoria Nacional de Justiça.

O ministro levou em conta a experiência de Adamek como juiz instrutor no gabinete do ministro Dias Toffoli, no Supremo Tribunal Federal, durante o julgamento do mensalão.

Salomão conhece Adamek há muitos anos, nos contatos de associações de magistrados, e precisava de alguém de confiança para ajudá-lo nas ações da Lava Jato no STJ, das quais é o relator.

Indícios, acusação e defesa

Salomão recebeu integralmente a denúncia, por entender que estavam “presentes indícios suficientes de materialidade e autoria” do crime de corrupção passiva, “ressalvando, de forma objetiva, que essa conclusão não implica convencimento definitivo da prática de delito por parte do denunciado”.

De acordo com o MPF, quando ocupava o cargo de ministro das Cidades, Negromonte teria solicitado a representantes do Sindicato Nacional da Indústria de Componentes para Veículos Automotores (Sindipeças) a quantia de R$ 25 milhões para subsidiar campanhas eleitorais dos candidatos do Partido Progressista (PP).

Em contrapartida, os representantes teriam solicitado ao então ministro a adoção de medidas para implementação do Sistema Integrado de Monitoramento e Registro Automático de Veículos (Simrav).

Em resumo, a defesa de Negromonte alegou nos autos que:

a) não há conexão dos fatos com a Operação Lava Jato;

b) não haveria indícios suficientes para a demonstração da conduta tida por delituosa;

c) os depoimentos de Pedro Correa e Alberto Youssef não são meios idôneos de prova, por tratar-se de colaboração premiada, o que impediria uma possível condenação baseada unicamente em seus termos;

d) os registros de voos não demonstram sequer os encontros entre os agentes denunciados;

e) Youssef jamais teve influência nas atividades do Ministério das Cidades;

f) a implementação dos chamados rastreadores veiculares já havia sido aprovada e o Ministério das Cidades estaria apenas dando cumprimento à legislação, o que não configura ato ilícito;

g) o deputado Negromonte sempre foi militante da causa da segurança nos transportes, tendo apresentado projetos de lei desde 1999 sobre o tema, além de compor Comissão Parlamentar Mista que investigou o roubo de cargas no Brasil entre 2001 e 2002.

O STJ decidiu afastar Negromonte do cargo de conselheiro do Tribunal de Contas até o encerramento da instrução criminal do processo. O relator considerou a equiparação em direitos e garantias dos Conselheiros dos Tribunais de Contas com os membros da magistratura.

Em seu voto, Salomão julgou incompatível a permanência de Negromonte no Tribunal de Contas.

A despeito dos fatos narrados na denúncia remeterem aos atos praticados no exercício do cargo de ministro das Cidades, “as práticas delituosas a ele imputadas contrapõem-se de maneira insuperável – a meu juízo – ao mínimo ético exigido à execução das funções necessárias à fiscalização da regularidade das contas da administração pública”.

Segundo informou o repórter João Pedro Pitombo, da Folha, a defesa de Negromonte classificou a decisão do STJ como um precedente extremamente perigoso por se basear na palavra de um delator. Considerou que não havia indícios suficientes para o recebimento da denúncia.

Segundo o advogado Carlos Fauaze, que representa o ex-ministro, com base em elementos extremamente frágeis e contestáveis não só foi recebida a denúncia como também decretado o afastamento do cargo, sem que houvesse requerimento do Ministério Público nesse sentido por oportunidade do oferecimento da denúncia, o que aponta para a absoluta desnecessidade da medida.