TJ-SP susta licitação suspeita de favorecer amigo de Temer
O presidente do Tribunal de Justiça de São Paulo, desembargador Manoel de Queiroz Pereira Calças, suspendeu novamente uma licitação de R$ 260 milhões, suspeita de direcionamento para favorecer um amigo do presidente da República, Michel Temer.
O antecessor de Calças, desembargador Paulo Dimas Mascaretti, havia prorrogado um contrato –firmado em 2013 com o consórcio Argeplan-Concremat– para elaborar projetos e fiscalizar obras nos fóruns.
Um dos sócios da Argeplan é o coronel PM aposentado João Baptista Lima Filho, amigo de Temer e alvo de delação da JBS.
Em outubro de 2017, a Folha revelou que a desembargadora Maria Lúcia Pizzotti pediu o cancelamento da licitação e acusou Mascaretti de omissão, por não investigar irregularidades que apontou no contrato.
Procurados, a Argeplan e o coronel Lima Filho não se manifestaram.
“Nenhuma irregularidade existe”, disse o então vice-presidente, Ademir de Carvalho Benedito, à época presidente da Comissão de Assuntos Administrativos.
Na ocasião, em sessão do Órgão Especial, Calças manifestou “apoio e solidariedade” dos pares a Mascaretti, tendo criticado a “falaciosa reportagem”. Em nota pública, Mascaretti condenou a “despropositada e leviana” afirmação de que houve omissão.
Um mês atrás, Calças recebeu a desembargadora em audiência. Pizzotti apresentou dados sobre a impugnação ao contrato ainda vigente. Dias depois, ela se reuniu com assessores do presidente, quando questionou valores, considerados vultosos, e serviços pagos e não executados.
No dia 16 de fevereiro, as empresas concorrentes foram informadas da suspensão da licitação. A abertura dos envelopes de habilitação ocorreria no próximo dia 23.
Uma semana antes, Calças havia exonerado, a pedido, o então secretário da Administração, Eduardo Roberto Alcântara, responsável pela administração de mais de 700 prédios do tribunal e por licitações e contratos.
Numa reunião com desembargadores, em seu gabinete, Calças homenageou Alcântara, em agradecimento pela “lealdade, abnegação e esforço no desempenho das funções.”
A assessoria do tribunal informa que a exoneração de Alcântara faz parte das mudanças administrativas que o novo presidente realiza em seis secretarias.
Procurado pela Folha, o presidente Manoel Calças não se manifestou.
Mascaretti acha possível uma alteração do formato do contrato. “A ideia é um contrato menos abrangente. O problema não é a licitação”, diz o ex-presidente.
“Estou certa de que o presidente Calças pretende fazer uma gestão saneadora na área administrativa”, afirma a desembargadora Pizzotti. “A suspensão do edital de licitação vai exatamente na linha do que, durante dois anos, postulei ao presidente anterior”, diz a magistrada.
Trata-se do segundo edital suspenso. Em novembro último, a Folha revelou as restrições apresentadas pelo Sindicato Nacional das Empresas de Arquitetura e Engenharia Consultiva (Sinaenco).
Para o sindicato, o primeiro edital permitia vislumbrar “benefício injustificado a determinado licitante”. O Sinaenco pediu correções, para que a licitação “caminhe nos trilhos da legalidade”.
O TJ-SP publicou, então, novo edital. Reduziu as exigências, os prazos e o valor.
O sindicato entendeu que a mudança permitiria maior número de licitantes. Pizzotti achou as alterações insuficientes.
A pedido de Mascaretti, o Conselho Nacional de Justiça instaurou procedimento para avaliar eventual infração disciplinar da desembargadora, ao acusa-lo de omissão.
Pizzotti diz que, se não houver sindicância e investigação sobre os fatos anteriores, vai entregar pessoalmente à equipe do CNJ –que realiza inspeção no tribunal– cópia dos documentos que deixou com o presidente.
Obs. Texto corrigido às 13h58.