O fiasco supremo

Frederico Vasconcelos

O artigo a seguir é de autoria de Newton Fabrício, desembargador do Tribunal de Justiça do Rio Grande do Sul.

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O Supremo Tribunal Federal produz, hoje, um fiasco em um dia, e no outro também. Não, não vou falar sobre o bate-boca entre dois ministros do STF, em plena sessão de julgamento (mais um envolvendo Gilmar Mendes).

Também não vou abordar a visita de um presidente da República (investigado em inquérito policial), em pleno sábado, à residência da presidente do STF para, supostamente, conversarem sobre “segurança pública”.

Não, nada vou escrever sobre esses fatos. O meu tema é outro fiasco. O fiasco supremo.

É de atordoar: o país inteiro assistindo àquele que seria o julgamento mais importante do Supremo Tribunal Federal nesses tempos difíceis da vida nacional. O julgamento que decidiria, ao fim e ao cabo, se o ex-presidente Lula poderia ser preso ou não nos próximos dias.

Por mais incrível que pareça, o Supremo Tribunal Federal discutiu, durante longas quatro horas e meia, se o habeas corpus poderia ser apreciado ou não.

Cabe destacar que essa questão jurídica, corriqueira em todos os tribunais do país, costuma ser resolvida em poucos minutos, jamais em quatro horas e meia.

Mas isso não é o pior. Não, ainda não. O pior do pior viria a seguir.

Depois de decidida a questão preliminar que demandou a análise durante toda a tarde, viria o fiasco maior.

O ministro Marco Aurélio Mello suscita uma questão de ordem: tinha de se ausentar –estava com vôo marcado para o Rio de Janeiro onde receberia, no dia seguinte, uma homenagem.

Ou seja: às favas o processo, o que interessava ao ministro era um compromisso particular.

Mas tem mais: quem pensa que o fiasco terminaria por aqui está redondamente enganado –o ministro Ricardo Levandowski também invoca compromissos particulares. Tinha de se ausentar. O processo e o julgamento que ficassem para outro dia.

É de estarrecer: dois ministros do Supremo Tribunal Federal invocando compromissos particulares em detrimento do julgamento aguardado por todo o país.

Mas tem mais: como aquela quarta-feira antecedia a Páscoa, seria feriado para o Supremo Tribunal Federal. Não é dia de trabalho; é de folga. Afinal, era quase Páscoa. O STF tem de fechar. Assim, o julgamento ficou postergado para a outra quarta-feira, dia 4 de abril.

Não vou analisar aqui o desrespeito ao Regimento Interno do STF que estabelece que, iniciado o julgamento de um habeas corpus, ele não pode ser interrompido.

Também não vou aqui analisar a liminar deferida, que contraria a jurisprudência do próprio Supremo Tribunal Federal. Não. Isso seria tema para outro artigo, não este.

Neste fico restrito ao acima relatado: na inacreditável postura de dois ministros do Supremo Tribunal Federal que resolvem se ausentar do julgamento porque teriam compromissos particulares a atender.

Esse é o fiasco maior.

Onde fica o princípio da supremacia do interesse público? Onde fica a consciência dos ministros com o cargo que ocupam? Não têm ambos o discernimento que a toga que envergam (ainda que por indicação política) exige responsabilidade e postura?

Em síntese, esse é o fiasco supremo, expresso e sintetizado na triste figura do ministro Marco Aurélio Mello, sorrindo e mostrando o comprovante de check-in.