Diálogos de Barroso com a academia

A Editora FGV lançou “A Razão e o voto – Diálogos Constitucionais com Luís Roberto Barroso”. A convite de Oscar Vilhena Vieira, diretor da FGV Direito SP, Barroso aceitou submeter suas ideias sobre o Supremo Tribunal Federal ao escrutínio de um grupo de colegas de academia, alguns deles seus ex-alunos.

Barroso é professor titular de direito constitucional da Universidade Federal do Estado do Rio de Janeiro (Uerj).

“O embate direto e rigoroso, ainda que imensamente cordial, não é prática comum em nossa academia jurídica”, diz o diretor da FGV Direito SP. Segundo ele, as críticas mais contundentes vieram de autores muito jovens, que não se deixaram intimidar pela cátedra ou pela toga”.

Organizado por Vilhena e Rubens Glezer, professor da FGV Direito SP, o livro reúne 18 artigos sobre texto do ministro, intitulado “A razão sem voto: o Supremo Tribunal Federal e o governo da maioria“.

Em síntese, o argumento fundamental de Barroso nesse artigo, segundo Vilhena, é que “o Supremo Tribunal Federal, além de exercer a clássica função ‘contramajoritária’, inerente ao exercício do controle da constitucionalidade das leis, passou também a exercer a função ‘representativa’ e, mais do que isso, a desempenhar o papel de ‘vanguarda iluminista'”.

Segundo Barroso, seu texto explora o tema do papel representativo das cortes supremas, sua função iluminista e as situações em que elas podem, legitimamente, ‘empurrar a história’.

Ele conclui que “em alguns cenários, em razão das múltiplas circunstâncias que paralisam o processo político majoritário, cabe ao Supremo Tribunal Federal assegurar o governo da maioria e a igual dignidade de todos os cidadãos”.

“O Brasil enfrenta muitos problemas que vêm de longe. Conseguimos avançar muito, mas ainda estamos atrasados e com pressa”, escreveu Barroso, em dezembro de 2015.

A chegada de Barroso ao Supremo, segundo Vilhena, permitiu ao acadêmico e advogado “buscar colocar em prática suas concepções de como bem interpretar e aplicar a Constituição”.

Barroso pareceu animado com o convite e “se dispôs a debater de forma aberta e objetiva sua descrição das operações teóricas, políticas e morais que estruturam as decisões do Supremo Tribunal Federal nos dias de hoje”, comenta Vilhena, na apresentação do livro.

O projeto envolveu a cooperação de professores dos programas de pós-graduação em direito da Uerj, PUC-SP, PUC-RS, UFPR, Universidade Federal Fluminense, FGV Direito Rio e FGV Direito SP. (*)

Todos foram convidados a produzir um ensaio curto sobre o texto e as ideias de Barroso. Esses textos foram previamente encaminhados a todos os participantes do projeto, que se reuniram em um seminário na FGV Direito SP, para uma jornada de debates, com a participação do ministro.

Findo o encontro, foi dado prazo a cada um dos participantes, inclusive Barroso, para que pudessem enriquecer seus respectivos textos a partir das críticas e proposições debatidas no seminário.

Barroso extraiu três críticas recorrentes no conjunto de textos: a) que ele fornece uma legitimação móvel e apriorística para qualquer atuação do Tribunal; b) o risco democrático de o STF se arvorar em representante da sociedade e c) a impossibilidade de prestação de uma jurisdição constitucional de qualidade, à vista do volume de processos apreciados pelo Tribunal.

Ele diz que a terceira crítica talvez seja a mais difícil de responder.

“Desde que ingressei no Tribunal, venho insistindo, em conversas internas e em manifestações públicas, na necessidade de se fazerem mudanças profundas, revolucionárias, no modo como o Supremo Federal atua”, diz.

“Sem tempo para se prepararem adequadamente, os ministros votam com pouca reflexão ou pedem vista”, afirma.

Ele também acha procedente a crítica de que o volume astronômico transforma o processo decisório do Tribunal, em mais de 90% dos casos, em uma Corte de decisões monocráticas”.

Sobre a iniciativa do debate proposto por Vilhena, Barroso escreveu:

“Oscar é uma dessas pessoas diferenciadas, que além de brilhar com luz própria, ilumina o caminho para os outros. Sua integridade, gentileza e modéstia dão um toque de classe à seriedade científica e consistência teórica da sua produção acadêmica”.

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(*) Participaram do projeto os seguintes professores, cujos textos estão publicados na obra:

Diego Werneck Arguelhes (FGV Direito Rio); Fernando Leal (FGV Direito Rio); Rubens Glezer (FGV Direito SP); Ivar A. Hartmann (FGV Direito Rio, coordenador do projeto Supremo em Números); Daniel Chada (Engenheiro-líder do projeto Supremo em Números); Dimitri Dimoulis (FGV Direito SP); Soraya Lunardi (Unesp); Joaquim Falcão (FGV Direito Rio); Gustavo Binenbojm (Uerj); Ana Paula de Barcellos (Uerj); Adriana Ancona de Faria (PUC-SP); Roberto Dias (PUC-SP); Ingo Wolfgang Sarlet (PUC-RS); Jane Reis Gonçalves Pereira (Uerj); Daniel Sarmento (Uerj); Eloisa Machado de Almeida (FGV SP); Rodrigo Brandão (Uerj); Marcelo Figueiredo (PUC-SP); Clèmerson Melin Clève (UFPR); Bruno Meneses Lorenzetto (PUC-PR); Eduardo Mendonça (Uniceub) e Cláudio Pereira de Souza Neto (Universidade Federal Fluminense).