Primeiro de maio e retrocessos
Sob o título “1° de Maio: comemoramos retrocessos?”, o artigo a seguir é de autoria de Vanessa Anitablian Baltazar, juíza do Trabalho e diretora da Amatra-2 (Associação dos Magistrados da 2a. Região), mestre e especialista em Direito e Processo ,do Trabalho.
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Chicago (EUA), 1° de Maio de 1886. Protestos operários por melhores condições de trabalho. Milhares de mortos, presos e, não fosse o bastante, líderes operários condenados à forca ou à prisão perpétua.
Da esperança por melhoras nas sofríveis condições de trabalho – retratadas de forma pioneira nas minas de carvão por Émile Zola em Germinal (1884) – surgiram movimentos sociais que resultaram nas primeiras normas do que hoje chamamos Direito do Trabalho.
Mais de um século depois, a história brasileira traz à tona, sob diferentes perspectivas, adversidades como a que enfrentamos com os desdobramentos da famigerada Reforma Trabalhista (Lei n. 13.467/17), para falar o mínimo, em relação à criação do contrato de trabalho intermitente e à dispensa coletiva imotivada.
Isso sem falar da (des)regulamentação da terceirização de mão de obra, que abandonou ideias avançadas de projetos de lei que previam a responsabilidade solidária dos tomadores de serviços, bem como a igualdade salarial e de benefícios (esses últimos, pasmem, vieram como mera faculdade do empregador).
Para falarmos da criação e recente queda da MPV 808, que durou meros 5 meses. Ela teve por resultado tão somente a criação de situações inseguras, como em profissionais da área de saúde que firmaram contratos individuais para o trabalho em escala 12×36.
E, ainda, retrocedeu em casos como das trabalhadoras gestantes que, nas atividades consideradas insalubres em grau mínimo e médio, só serão afastadas por recomendação médica, ao passo que a MPV 808 só permitia o trabalho nessas situações por opção da mulher aliado à autorização por atestado de saúde.
No entanto, a maior derrocada veio com o retorno ao texto original que prevê a referência da indenização por danos morais atrelado ao salário, de 03 a 50 vezes, enquanto que a MPV 808 estabelecia o teto do INSS como parâmetro da condenação, permitindo sua limitação a até 50 vezes o teto.
Vozes ousam ecoar em contrário, mas reforço: somos uma nação democrática (ainda embrionária, é verdade), que tem como fundamento os valores sociais do trabalho e a dignidade da pessoa humana, bem como objetivos de construir uma sociedade justa, reduzir as desigualdades e promover o bem de todos, sem quaisquer formas de discriminação.
A força normativa da Constituição sobre as relações de trabalho não permite afrontas como balizar o dano ao indivíduo pelo salário.
O povo brasileiro não merece mais a velha política romana do pão e circo, precisamos entender e compreender, para agir e reagir, na constante busca do consenso para uma convivência pacífica.
Temos um Copa do Mundo por vir, mas queremos mais, queremos mudanças, por meio da atividade consciente e social do homem, visando transformar o meio em que vivemos.
Voltando a Zola, no épico Germinal, somos responsáveis pelo nosso papel evolutivo. Ainda que arranquem os brotos da metamorfose social, não se esqueçam, eles tornam a germinar.