Investigar detentores de foro especial não requer autorização de tribunal estadual

O Conselho Nacional de Justiça determinou ao Tribunal de Justiça do Pará suprimir de seu Regimento Interno a exigência de autorização prévia pela corte estadual para investigações de crimes cometidos por autoridades com prerrogativa de foro –inclusive magistrados. (*)

Em decisão monocrática final, o conselheiro-relator, André Godinho, considerou “desarrazoada e incompatível com os postulados do sistema penal acusatório” a exigência de prévia autorização judicial pelo tribunal estadual para instauração de inquérito policial contra pessoas detentoras de foro especial, como prefeitos, deputados e juízes de direito.

O CNJ acolheu pedido do Ministério Público do Pará, que considerou a regra “descabida” e contrária à jurisprudência do Supremo Tribunal Federal e do Superior Tribunal de Justiça. Trata-se de uma resolução de maio de 2016.

O TJ do Pará e três outros tribunais estaduais passaram a exigir prévia autorização judicial, sob pena de nulidade da investigação.

O procurador-geral de Justiça do Pará, Gilberto Valente Martins, autor do pedido ao CNJ, questionou a exigência em sessão do Tribunal Pleno do TJ-PA. Na ocasião, o tribunal firmou posição, por maioria (13 votos contra 8), pela manutenção da autorização.

Gilberto Martins é ex-conselheiro do CNJ.

O MP estadual sustentou que a autorização para investigação de agente público com prerrogativa de foro é matéria administrativa, não jurisdicional, relacionada ao processo investigatório.

Tal exigência “fere o sistema acusatório brasileiro, mitiga indevidamente a atuação do Ministério Público enquanto titular da ação penal e causa evidentemente prejuízo à celeridade processual”.

O tribunal estadual informou ao CNJ que vinha exigindo a autorização, sem que houvesse qualquer insurgência do Ministério Público, que, recentemente, mudou seu entendimento –ressalvando-se os casos que demandem, por exemplo, quebras de sigilo, busca e apreensão e condução coercitiva.

Em sua decisão, Godinho sustentou que “o modelo de Estado Democrático de Direito estabelece que a jurisdição seja exercida na forma da imparcialidade do julgador”. Ou seja, “as funções de acusador e julgador são previamente estabelecidas e delimitadas, não podendo haver a substituição de um pelo outro”.

“É imprescindível a imparcialidade do julgador, devendo o magistrado intervir apenas quando necessário, e desde que seja provocado nesse sentido”, afirmou.

“A investigação pré-processual possui como destinatário o órgão acusador. Tal atividade deve ser desempenhada por órgão diverso daquele que julgará a ação penal, limitando-se o controle judicial, nesta fase, ao deferimento/indeferimento de medidas procedimentais que atinjam diretamente a reserva de jurisdição”.

O TJ-PA deverá informar a quantidade de comunicações por crime e contravenção penal recebidas nos últimos cinco anos e as medidas tomadas.

(*) PROCEDIMENTO DE CONTROLE ADMINISTRATIVO – 0002734-21.2018.2.00.0000