Tribunais estaduais resistem à valorização do 1º grau, diz Cármen Lúcia
A presidente do Conselho Nacional de Justiça, ministra Cármen Lúcia, entende que “a priorização do primeiro grau é uma das maiores necessidades do Judiciário”.
Em entrevista concedida à Folha na última terça-feira (22), ela foi questionada sobre a reclamação de juízes diante da falta de valorização da primeira instância. Eles protestam porque a democratização nos tribunais estaduais não avançou.
“Tenho me empenhado muito nisso, porque os juízes têm razão”, afirmou Cármen Lúcia. “A massa de processos chega no primeiro grau. Os juízes às vezes não têm servidores, trabalham loucamente, em condições muito precárias. Nós temos que avançar cada vez mais”, afirmou.
A atenção prioritária ao primeiro grau foi instituída em maio de 2014, com a Resolução nº 194, assinada pelo ministro Joaquim Barbosa, então presidente do CNJ.
Segundo a presidente do CNJ, a força de trabalho deveria se voltar ao primeiro grau, mas há resistência dos tribunais.
“Em alguns Estados mais da metade das comarcas estão vagas. Isto é gravíssimo. Uma comarca sem juiz é o Estado sem a autoridade da lei. Temos que diminuir mesmo os juízes auxiliares na segunda instância”, concluiu.
Em setembro de 2013, ao abrir a primeira sessão do novo colegiado, Joaquim Barbosa anunciou a criação de um grupo de trabalho para estudar propostas e iniciativas para implementar uma política nacional de priorização do primeiro grau da Justiça.
Segundo Barbosa, o primeiro grau tem a maior carga de trabalho e a maior taxa de congestionamento de processos, “porém a força de trabalho dos servidores e os recursos disponíveis não se encontram no primeiro grau, e sim no segundo”.
Em março de 2016, o CNJ encaminhou aos magistrados de todo o país um questionário com o objetivo de reunir subsídios para acompanhamento e eventual adequação da Política de Atenção Prioritária ao Primeiro Grau de Jurisdição.
Desde então, a única demonstração efetiva de valorização da Justiça de primeiro grau foi a intervenção no Tribunal de Justiça da Bahia –de maio a outubro de 2015– determinada pela então corregedora nacional de Justiça, ministra Nancy Andrighi.
Na ocasião, houve o deslocamento de 264 servidores de gabinetes de desembargadores e das áreas administrativas para prestar serviços nas varas, em Salvador. Essa tropa temporária atuou para reduzir o estoque de processos, suprindo as deficiências da primeira instância.
No último dia 30 de abril, Cármen Lúcia assinou despacho intimando os Tribunais de Justiça do Amazonas e do Acre e o Tribunal Regional Federal da 2ª Região (RJ/ES) a solucionarem pendências em relação à Política Nacional de Atenção Prioritária ao Primeiro Grau de Jurisdição.
Na véspera, ela discutira o assunto em reunião com representantes de associações de magistrados. Algumas associações informaram que estão tendo dificuldades para implementar a medida.
“Por um lado, se entende a dificuldade de baixar o servidor do 2º grau para o 1º grau, porque tem demandas no 2º grau, por outro lado, é preciso reequilibrar a força de trabalho”, disse o presidente da Associação dos Magistrados Brasileiros, Jayme de Oliveira.
Na última sexta-feira, Cármen Lúcia participou em Maceió do 23º Congresso Brasileiros de Magistrados, realizado pela AMB.
“Há muita coisa a ser feita, mas não temos um Judiciário construído, temos um Judiciário permanentemente em construção para atender às demandas da cidadania”, disse na sua exposição.