Desembargador critica Gilmar Mendes

“Ouvi hoje pela manhã, estarrecido, perplexo, estupefacto, que o senhor ministro Gilmar Mendes teria dito, de Portugal, que o Superior Tribunal de Justiça podia até ser fechado se continuar agindo como age. Ou algo parecido com isso. Uma autoridade judiciária dizendo que outra autoridade judiciária não cumpre o seu dever judiciário…”

“Fiquei estarrecido. Mas alguém dirá: não dá mais para ficar estarrecido com o que diz esse ministro.”

O autor da crítica é o desembargador Dimas Borelli Thomaz Júnior, do Tribunal de Justiça de São Paulo. A manifestação aconteceu em abril, durante julgamento de processo administrativo disciplinar, quando o Órgão Especial, por maioria, rejeitou a aplicação de censura ao juiz Fernanando Antonio de Lima, de Jales (SP).

A Telefonica oferecera reclamação contra o juiz Lima, que, durante uma entrevista em maio de 2015,  criticou a privatização e defendeu o direito do povo de protestar “contra serviços públicos mal prestados por grandes bancos e grandes empresas”.

Borelli chegou a sugerir que o juiz de Jales poderia ter falado “inspirado pelo ministro Gilmar Mendes”, tendo comentado: “Que má inspiração, ou que falta de inspiração”…

Em março de 2017, quando a corte decidiu pela abertura do processo disciplinar, o então corregedor-geral, desembargador Pereira Calças, afirmou que “quando [um juiz] é procurado pela imprensa local para uma entrevista na condição de titular da vara, não é procurado como um cidadão comum”.

Segundo informou o Consultor Jurídico, o então presidente do TJ, Paulo Dimas Mascaretti, considerou “drástico” abrir um processo administrativo disciplinar por uma entrevista, “mesmo que a conduta do juiz tenha sido infeliz”.

No julgamento de abril, apenas cinco desembargadores votaram pela aplicação de censura ao juiz de Jales.

O desembargador Borelli também criticou o fato de Gilmar Mendes ter afirmado que os juízes ganham muito.

“Não é porque se diz inatacável ou inatingível que poderá continuar detratando ministros, juízes e [insinuar] no meio de uma fala técnica que juiz ganha muito –seja no plenário do STF, seja numa universidade, seja na imprensa. Esse é o mau exemplo que nós temos tido. Essa é uma conduta que nós não podemos aceitar”, disse Borelli.

“No nosso dia a dia tem acontecido de juízes falarem mais que a boca, e escreverem muito menos que deveriam. Esses ministros do STF, que até hoje não conseguiram julgar se a caderneta de poupança vai ou não vai pagar juros, enquanto temos 100.000 processos parados no Tribunal de Justiça de São Paulo”.

Ainda Borelli: “Juízes estão para escrever, têm que escrever seus votos, suas sentenças, seus despachos”.

(…)

“Parece que alguns ministros do Supremo têm mesmo o prazer, adoram ser ministros, mas são loucos por um avião. Saem da sessão para pegar, de afogadilho, um avião. É o exemplo que o STF nos dá”, disse.

Nesta semana, a juíza federal Renata Andrade Lotufo, da 4ª Vara Criminal Federal de São Paulo, rejeitou denúncia do Ministério Público Federal contra Ricardo Rocchi, manifestante que jogou tomates no ministro Gilmar Mendes.

Entre outros motivos, a magistrada considerou “a importância elevada do direito à liberdade de expressão (ainda mais em um país com trágicas experiências recentes autoritárias de violação a este direito) :  a maior sujeição a críticas a que estão submetidas autoridades públicas, e a ausência de comprovação pelo MPF de qualquer conduta do investigado que incorresse em ofensas físicas ou pessoais”.

Segundo o site Jota, para a juíza federal, se o chefe do Executivo está sujeito ao controle do voto e a processos de impeachment, ministros do STF –apesar da necessidade de uma “constante postura contramajoritária”– não estão sujeitos a fiscalização quanto da demora na prolação de decisões”.

“À população resta, tão somente, o protesto como forma de exteriorização de sua discordância”, anotou a magistrada.