Juiz rejeita ação de indenização contra repórter da Folha

Frederico Vasconcelos

O juiz de direito Alexandre Bucci, da 10a. Vara Cível de São Paulo, julgou improcedente uma ação de indenização por danos morais proposta pelo desembargador aposentado Armando Toledo, do Tribunal de Justiça de São Paulo, contra o jornalista Frederico Vasconcelos, editor deste Blog.

Toledo se sentiu ofendido com a reportagem publicada na Folha, em 13 de agosto de 2017, sob o título “Em 3 dias, desembargador de SP virou consultor de Bendine”.

Como a matéria jornalística foi editada ao lado de texto sobre a Operação Lava Jato, Toledo entendeu que houve a intenção de associar sua imagem à operação, causando-lhe constrangimento.

O desembargador sustentou, ainda, que a reportagem permitia a interpretação de que não seria pessoa bem aceita por seus pares do Tribunal.

O juiz Bucci considerou a reportagem “eminentemente informativa”, “saltando aos olhos que os fatos lá explicitados, ainda que pudessem em algum momento ganhar alguns reflexos pessoais em relação ao autor” [Toledo], não se mostravam indenizáveis.

O jornalista foi representado pela advogada Taís Borja Gasparian. Cabe recurso da decisão.

Aposentadoria antecipada

A reportagem questionada registra que em março de 2015 Toledo surpreendeu os colegas ao antecipar em 11 anos sua aposentadoria, tendo distribuído no tribunal, três dias depois, cartão de visitas como consultor do então presidente da Petrobras, Aldemir Bendine.

Com base em documentos oficiais do TJ-SP e do Conselho Nacional de Justiça, a Folha revelara –um mês antes da aposentadoria de Toledo– que o desembargador retardou a tramitação de uma ação penal contra o ex-presidente da Assembleia Legislativa de São Paulo, deputado José Antonio Barros Munhoz (PSDB), supostamente para beneficiar o parlamentar com a prescrição.

A reportagem que motivou a ação de indenização reproduz afirmações do desembargador, de que, desde o final de maio de 2016, ao se retirar da Petrobras, não teve contato com Bendine. “Estou tomando conhecimento das ocorrências apenas agora, pelas notícias de jornais e televisão”, disse Toledo na ocasião.

No dia 26 de agosto de 2017, este Blog registrou que o corregedor nacional de Justiça, ministro João Otávio de Noronha, arquivara uma reclamação que pretendia a abertura de processo administrativa disciplinar contra Toledo pela tramitação demorada da ação penal contra Barros Munhoz.

A reclamação havia sido autuada no Conselho Nacional de Justiça em 2013. A decisão de Noronha pelo arquivamento contrariou o entendimento de dois corregedores que o antecederam, os ministros Francisco Falcão e Nancy Andrighi.

Falcão e Andrighi haviam votado pela abertura da investigação.

O arquivamento da reclamação não constava na reportagem questionada porque essa informação não foi fornecida quando o repórter consultou a Corregedoria Nacional de Justiça e o desembargador Armando Toledo dias antes da publicação da matéria jornalística, na edição de 13 de agosto de 2017.

Noronha arquivara a reclamação no dia 29 de junho de 2017.

Liberdade de imprensa

Segundo o juiz Alexandre Bucci, “não se viu intenção alguma de criminalizar as condutas” do desembargador, “limitando-se o jornalista a narrar episódios relevantes envolvendo um processo atrelado ao então deputado Barros Munhoz, bem assim a súbita vinculação do autor à presidência da Petrobras então exercida por Aldemir Bendine”.

Bucci também considerou “possível e natural que se utilizasse, para ilustrar a matéria, de uma fotografia, mesmo que antiga, na qual apareciam o autor e o referido deputado Barros Munhoz”.

“Também não foram extrapolados os limites do exercício regular da liberdade de imprensa, acredita-se, quando se divulgaram possíveis relações existentes entre a nomeação do autor como consultor da Petrobras e a ventilada intermediação de contratos do Tribunal de Justiça com o Banco do Brasil”, julgou o magistrado.

Bucci registrou ainda que a reportagem divulgou, “em favor do autor [Toledo], posicionamento emitido pelo Tribunal de Justiça no sentido da regularidade do contrato de gerenciamento de depósitos judiciais”.

Blindagem inadmissível

“Considerando o cargo então ocupado por Aldemir Bendine, pessoa também envolvida nos fatos, absolutamente natural que as notícias a ele relacionadas fossem agrupadas (física e jornalisticamente) próximas às demais notícias da Operação Lava Jato, sem que disto, contudo, pudesse decorrer qualquer mácula direta à pessoa do autor [Toledo]”, decidiu Bucci.

Concordar com a indenização, segundo o juiz, “seria compactuar com a criação de um inadmissível escudo de blindagem do homem público em relação à imprensa livre”.

“Merece ser preservado o embate público de ideias e opiniões, muitas vezes contrárias, o que se mostra democrático e deve ser absorvido, em especial, tratando-se o autor [o repórter], na situação em foco, de um profissional experiente e certamente adaptado ao jornalismo investigativo e às críticas inerentes a seu campo de atuação˜.

Bucci condenou o desembargador Armando Toledo ao pagamento dos honorários advocatícios.