Juíza manda apurar compra suspeita de imóveis pelo TRE de Pernambuco

Frederico Vasconcelos
Desembargador Ricardo Paes Barreto, em evento do Tribunal de Justiça de Pernambuco em 2016 (Assis Lima/TJ-PE – Divulgação)

A juíza federal Madja de Sousa Moura Florêncio, da 12ª Vara Federal de Pernambuco, recebeu a petição inicial em ação de improbidade administrativa ajuizada pelo Ministério Público Federal envolvendo o desembargador Ricardo de Oliveira Paes Barreto, ex-presidente do Tribunal Regional Eleitoral de Pernambuco.

De acordo com o MPF, em dezembro de 2011 foram pagos R$ 5,5 milhões por imóveis que uma imobiliária havia adquirido, seis meses antes, por R$ 1,3 milhão.

O MPF calculou em R$ 7,2 milhões —em valores atualizados— o dano ao erário. A Procuradoria da República em Pernambuco considerou que a compra foi realizada por valor “extremamente superior ao de mercado”.

Reportagem publicada na Folha no último dia 12 revelou que o ministro Humberto Martins, que assume nesta terça-feira (28) o cargo de corregedor nacional de Justiça, prorrogara até o final deste mês a convocação do ex-presidente do TRE-PE como juiz instrutor em seu gabinete.

Nesta segunda-feira (27), a presidente do Superior Tribunal de Justiça, ministra Laurita Vaz, convocou o desembargador Paes Barreto para atuar como juiz auxiliar no gabinete de Martins, pelo período de um ano, prorrogável. (*)

Na reportagem, Paes Barreto afirmou que a ação apresentada pelo Ministério Público Federal “não prospera em qualquer de seus argumentos”.

“Apesar da sua propositura há muitos meses, a inicial não foi sequer recebida”, disse, na ocasião [veja, abaixo, os demais argumentos do desembargador].

A ação de improbidade foi proposta em 24 de agosto de 2017 pela procuradora da República Silvia Regina Pontes Lopes.

Um parecer técnico, elaborado depois da compra, revelou que o terreno, próximo ao rio Capibaribe, está sujeito a alagamentos.

Em decisão anterior, o juiz federal Augusto César Carvalho de Leal registrou que, “apesar de adquiridos em regime de urgência, os imóveis teriam permanecido mais de cinco anos em estado de abandono”.

Em maio de 2017, diligência do MPF no local encontrou “uns quatro bois pastando e construções antigas em ruínas”.

O juiz Carvalho Leal viu indícios de que Paes Barreto teria participado do procedimento de dispensa de licitação e da compra dos imóveis, sem a cautela de exigir estudo, “tendo contribuído culposamente para a ocorrência de milionário prejuízo ao erário”.

A ação de improbidade teve como origem dois inquéritos instaurados na procuradoria eleitoral estadual.

O então vice-presidente do TRE-PE, desembargador Alberto Nogueira Virgínio, questionou em voto a aquisição do imóvel em “caráter urgentíssimo”. A negociação foi realizada em seis dias, com dispensa de licitação.

No último dia 14, a juíza Madja de Sousa Moura Florêncio determinou a citação –além de Paes Barreto– dos acusados Marília Gonçalves Berquó, João Maria de Souza, Carlos Frederico de Almeida, Imobiliária Carranca Ltda, Mauro Carneiro Pessoa e Oruam Consultoria Ltda.  Eles deverão especificar as provas que desejam produzir.

A magistrada não admitiu como prova um depoimento colhido unilateralmente pelo MPF –em junho deste ano– sem observância do contraditório e da ampla defesa, quando a ação de improbidade já estava tramitando. O MPF deverá repetir a oitiva em juízo, na fase de instrução probatória.

Igualmente, não apreciou parecer técnico realizado (perícia de campo no imóvel) em novembro de 2017, sem autorização do juízo, que deverá ser repetido integralmente em juízo.

A magistrada registrou também que “não passou despercebido” laudo pericial elaborado pela Caixa Econômica Federal, indicando como valor médio do mercado o montante de R$ 6,1 milhão.

Ela entendeu que o parecer não foi suficiente para enfraquecer os indícios de prejuízo ao erário –“o que apenas poderá ser comprovado na fase de instrução do processo”.

“Diante dos fatos descritos na inicial, deve ser apurada a configuração da improbidade administrativa”, decidiu a juíza.

OUTRO LADO

O desembargador Ricardo de Oliveira Paes Barreto afirmou no início deste mês que a aquisição de imóvel para armazenar urnas eletrônicas decorreu de planejamento do TRE-PE de 2010 a 2014, ano em que ele assumiu a corte.

“A verba para aquisição estava rubricada desde o exercício da gestão anterior”, diz.

Segundo o magistrado, “todos os procedimentos legais foram observados para a aquisição pela União, com mera interveniência por parte do TRE-PE, com autorização prévia da Secretaria de Patrimônio da União-SPU”.

“O imóvel é sólido, plano e adequado à construção”, diz. “Tais conclusões constam inclusive de avaliação do setor de engenharia da Caixa Econômica Federal.”

Segundo informa, há nos autos certidão do TRE-PE de que o terreno está murado e que nunca houve alagamento ou invasões.

“Há projeto para edificação dos edifícios para guarda de urna, no setor de engenharia do TRE-PE, onde se constata a adequação do terreno à construção.”

Paes Barreto diz que o MPF representou à Procuradoria-Geral da República e o expediente foi arquivado por falta de fundamento. O desembargador informa ainda que uma representação ao TCU foi distribuída ao ministro José Múcio Monteiro, que determinou a realização de perícia e concluiu pela inexistência de superfaturamento.

Consultado na ocasião, o ministro Humberto Martins não se manifestou.

(*) Com acréscimo de informações às 10h47.