O que faz um general no Supremo?
O ruído causado pela recente entrevista do comandante do Exército, general Villas Bôas, que opinou indevidamente sobre as eleições, contrasta com o silêncio em torno do convite do ministro Dias Toffoli ao general Fernando Azevedo, ex-chefe do Estado-Maior do Exército, para assessorá-lo na presidência do Supremo Tribunal Federal.
Nesta quinta-feira (13), Toffoli tomará posse na presidência do STF, sucedendo à ministra Cármen Lúcia.
Ao que se informa, Azevedo –que recentemente passou para a reserva– foi indicado por Villas Bôas para auxiliar Toffoli, no STF e no Conselho Nacional de Justiça, nas análises e políticas para a área de segurança.
O convite é inusual e intrigante. O que o militar tem a ver com a dinâmica de um tribunal constitucional? Qual a especialidade do general relacionada às tarefas do CNJ?
Num cenário conturbado, entre outros motivos, pela campanha de um candidato à Presidência da República que instiga membros da corporação militar, elogia torturadores e prega o armamento da população, o convite de Toffoli ao general pode ter interpretações equivocadas.
Seria uma demonstração de subserviência ao chamado poder fardado, para fazer média com as Forças Armadas? Ou simplesmente o uso da prerrogativa para nomear e dar ocupação em cargo de confiança a um oficial recém-reformado?
Ex-conselheiro do CNJ, o procurador-geral de Justiça do Pará, Gilberto Valente Martins, diz que Toffoli “foi muito habilidoso nessa escolha”.
“Os militares das Forças Armadas são altamente qualificados. Certamente, um militar que chega ao generalato é bem formado. Na área da segurança institucional –atividade de inteligência– são os melhores”.
“Essa atividade é imprescindível para quem chefia um Poder, principalmente no momento que vivemos, com imensos desafios para o sistema de Justiça”, diz Martins.
Ele cita, por exemplo, o enfrentamento ao narcotráfico, às organizações criminosas.
Segundo o ex-conselheiro, “historicamente, no Judiciário, se deu pouca importância a essa atividade”.
Ele considera essencial o desenvolvimento de políticas públicas judiciárias na área de segurança orgânica, patrimonial, de seus membros, de seus dados, documentos sigilosos etc.
Os que discordam de Martins lembram que não compete ao ministro presidente do STF –escolhido pelos pares, a cada dois anos, em sistema de rodízio– formular políticas sobre segurança.
Por sua vez, a presidência do CNJ –um órgão colegiado– trata de regras gerais de segurança de juízes, servidores e fóruns.
O CNJ acaba de firmar com o Comando do Exército Brasileiro o primeiro aditivo ao Acordo de Cooperação Técnica para destruição ou doação de armas de fogo e munições sob a guarda do Poder Judiciário.
O presidente do STF cuida da segurança dos ministros, diz-se. Mas, no organograma da corte, o que mais aproximaria a toga de uma farda é a Secretaria de Segurança, vinculada à Secretaria do Tribunal.
Essa secretaria tem duas coordenadorias: a de segurança eletrônica e de dignitários (inclui seção de apoio aos ministros) e a de segurança de instalações e transportes.
A segurança dos ministros é feita pela Polícia Federal ou terceirizada. Ou seja, uma atribuição civil.
Há uma assessoria de articulação parlamentar, subordinada à Secretaria-Geral da Presidência. Mas não há uma assessoria de articulação militar.
Natural do Rio de Janeiro, o general Fernando Azevedo é bacharel em Ciências Militares, com mestrado em Aplicações Militares e Doutorado em Aplicações Planejamento e Estudos Militares, e especialização em Política, Estratégia e Alta Administração Militar (na Escola de Comando e Estado-Maior do Exército).
Tem MBA em administração de negócios pela FGV.
Azevedo presidiu a Autoridade Pública Olímpica, responsável pela coordenação de ações governamentais para o planejamento e a entrega das obras e dos serviços nas Olimpíadas 2016. Antes, foi presidente da Comissão Desportiva Militar do Brasil.
Organizar grandes eventos, por exemplo, não é o mesmo que cuidar da segurança em fóruns. Está na moda chamar generais como se fossem especialistas em tudo, diz uma ex-conselheira do CNJ.
Isso tem a ver com uma necessidade de aparentar ordem, organizar a burocracia. Mas para atividades que exigem conteúdo específico, é preciso ouvir as demandas, conhecer os problemas e propor soluções perenes que se adaptem a várias realidades.
Para isso, a simples hierarquia não serve, diz ela.