Eleições e imagem dos xerifes

Frederico Vasconcelos
Ministros Eliana Calmon (aposentada), João Otávio de Noronha e Humberto Martins. (Divulgação)

O corregedor nacional de Justiça, ministro Humberto Martins, incluiu a desembargadora Kenarik Boujikian, do Tribunal de Justiça de São Paulo, entre os magistrados que deverão prestar esclarecimentos sobre manifestações públicas durante o atual período eleitoral.

Na véspera das eleições, Martins divulgou nota em que afirma “a necessidade de resguardar a imagem da magistratura brasileira, que não pode se envolver, de modo público, em discussões político-partidárias de qualquer natureza”.

O corregedor recomendou aos magistrados brasileiros –com exceção do Supremo Tribunal Federal–que se abstenham de participar de manifestações públicas ou de emitir posições político-partidárias em redes sociais, “de modo a afastar mácula à imagem de independência do Poder Judiciário brasileiro”.

A imagem de independência do Judiciário também pode ser afetada por preferências pessoais de ministros e corregedores.

Eis alguns exemplos.

1) No bloco de magistrados que Martins intimou havia juízes que apoiariam a candidatura de Jair Bolsonaro (PSL). A recente inclusão da desembargadora Kenarik Boujikian –que está longe de integrar aquele time– foi interpretada como uma eventual forma de contrabalançar a fiscalização do atual xerife, que atingiu, por exemplo, o ex-presidente do TJ paulista Ivan Sartori e o juiz federal Marcelo Bretas, do TRF-1.

Martins foi advogado do senador Renan Calheiros (PMDB) e chegou ao STJ numa carreira rápida graças ao apoio atribuído ao político alagoano. Como ministro, foi alvo de homenagem em Alagoas com a presença do então governador Renan Filho (PMDB).

Os Calheiros, como se sabe, fazem oposição aos Bolsonaros.

2) O então corregedor nacional de Justiça João Otávio de Noronha propôs a reabertura de procedimento instaurado pela corregedoria do Tribunal de Justiça do Rio de Janeiro contra quatro juízes que participaram, em 2017, de ato contra o impeachment de Dilma Rousseff (PT).

O procedimento havia sido arquivado pelo Órgão Especial do tribunal estadual.

Noronha –que não esconde a antipatia pelo PT, segundo seus colegas– ganhou o caso no Conselho Nacional de Justiça, mas perdeu no Supremo Tribunal Federal.

3) A ex-corregedora nacional de Justiça Eliana Calmon anunciou nesta semana que vai apoiar a candidatura de Jair Bolsonaro. Ministra aposentada do STJ, ela não se enquadra nas restrições da nota pública de Martins.

Eliana Calmon disse ao jornalista João Pedro Pitombo, da Folha, que tomou a decisão depois de ter lido o programa de governo de Fernando Haddad (PT).

Afirmou que aposta na promessa do capitão reformado de empunhar as bandeiras do combate à corrupção, do fortalecimento dos órgãos de investigação e da defesa das mulheres.

A ministra disse ainda que não ocuparia cargos em eventual governo de Bolsonaro, mas atuaria como “uma espécie de conselheira e ponte com o Poder Judiciário”.

Seu desempenho no combate à corrupção quando foi corregedora, tendo afirmado a existência de “bandidos de toga”, poderá reavivar antipatias e criar obstáculos, estreitando a tal ponte com o Judiciário.