Marketing e pragmatismo na escolha do secretário de Justiça de Dória

A escolha do desembargador Paulo Dimas Mascaretti, ex-presidente do Tribunal de Justiça de São Paulo, para secretário de Justiça do governo João Dória (PSDB) aparentemente mistura estratégia de marketing e pragmatismo.

Mascaretti é um magistrado que circula com desenvoltura no meio político, tem longa trajetória associativa, boa imagem entre os colegas e trânsito entre as entidades do Judiciário, do Ministério Público e da Defensoria Pública. É bem relacionado no Judiciário.

Segundo os mais críticos, são requisitos para uma gestão eficiente ou para o exercício do lobby.

Para o cidadão comum, sua indicação pode ser vista como a repetição, no plano estadual, da opção do presidente eleito Jair Bolsonaro (PSL), que retirou o juiz Sergio Moro da toga para comandar seu superministério da Justiça a partir de 2019.

As primeiras associações no caso de Mascaretti remetem ao exemplo do ex-presidente do TJ-SP Renato Nalini, que se aposentou e assumiu a secretaria da Educação na gestão do governador tucano Geraldo Alckmin.

Há outro precedente. Em 1993, o então presidente do TJ-SP, desembargador Odyr Porto, aposentou-se e, no ano seguinte, sucedeu a Michel Temer no comando da secretaria estadual da Segurança Pública, na gestão do governador Luiz Antonio Fleury Filho (na época, no PMDB). Porto também foi secretário estadual da Justiça. Morreu em 1998.

Mascaretti perdeu para Nalini a eleição para suceder ao presidente Ivan Sartori. Venceria no pleito seguinte a eleição para a presidência, que disputou com o desembargador Eros Piceli.

Alguns juízes veem na escolha de Mascaretti uma extensão da “blindagem” do governo tucano por uma “elite jurídica” na segurança pública e no sistema prisional. É a tese de doutourado de Luciana Zaffalon, da Escola de Administração de Empresas de São Paulo da Fundação Getúlio Vargas (FGV), que analisou a “politização” da Justiça do Estado de São Paulo.

Em julho último, a Assembleia Legislativa de São Paulo aprovou o Projeto de Lei Complementar 14/2017 para a criação de cargos de juiz de direito substituto no TJ-SP, uma proposta de Mascaretti apoiada pelo atual presidente, desembargador Manoel Pereira Calças. O projeto venceu a resistência dos que entendem que não se justificaria criar mais cargos de juiz substituto de segundo grau, e sim, cargos de desembargador.

Mascaretti não deverá ter dificuldades para dialogar com a cúpula do Poder Judiciário. São magistrados do TJ-SP vários juízes auxiliares do presidente do STF, ministro Dias Toffoli: o desembargador Carlos Vieira von Adamek, secretário-geral do CNJ, os juízes Luis Geraldo Sant Ana Lanfredi, Rodrigo Capez e Richard Pae Kim.

O futuro secretário de Justiça de São Paulo mantém boas relações com o ministro Ricardo Lewandowski, do STF, também oriundo do tribunal paulista.

Em fevereiro de 2016, então presidente do Conselho Nacional de Justiça, Lewandowski saudou Mascaretti, recém-eleito, que assistia a sessão: “O CNJ hoje é a casa dos magistrados. Fique à vontade para considerá-la como sua casa. Seus pleitos serão bem recebidos.”

Mascaretti foi presidente da Apamagis (Associação Paulista de Magistrados), tendo realizado uma gestão considerada muito ativa. A entidade atualmente é presidida pelo juiz Fernando Bartoletti, que foi chefe do gabinete civil na presidência do TJ-SP na gestão de Mascaretti.

Quando presidente da Apamagis, Mascaretti recebeu apoio da magistratura ao criticar declarações da então corregedora nacional de Justiça, ministra Eliana Calmon, contra o corporativismo e os chamados “bandidos de toga” no Judiciário.

Sem citar nomes, Eliana afirmara durante uma entrevista, em 2010, que uma execução havia sido obstada em São Paulo porque uma das partes teria “molhado a mão do juiz”.

Mascaretti assinou nota afirmando que, “em São Paulo, não admitimos que juízes molhem as mãos na corrupção, como também não toleramos conviver com inverdades e injustiça”. Foi convidado pela ministra para uma reunião no CNJ, em Brasília.

Em 2014, os fatos mostraram que a Apamagis se excedera. O TJ-SP condenou o juiz paulista Gercino Donizete do Prado, denunciado sob a acusação de receber propina mensal de um empresário e exigir até décimo terceiro do extorquido. Eliana confirmou que Gercino Donizete do Prado é o magistrado cujo nome não citara na polêmica entrevista quatro anos antes.

Como herança da administração Mascaretti, em março deste ano o presidente do TJ-SP, Pereira Calças, suspendeu uma licitação de R$ 260 milhões, suspeita de direcionamento para favorecer um amigo do presidente da República, Michel Temer.

Mascaretti havia prorrogado um contrato –firmado em 2013 com o consórcio Argeplan-Concremat– para elaborar projetos e fiscalizar obras nos fóruns. Um dos sócios da Argeplan é o coronel PM aposentado João Baptista Lima Filho, amigo de Temer e alvo de delação da JBS.

Em outubro de 2017, a Folha revelou que a desembargadora Maria Lúcia Pizzotti pediu o cancelamento da licitação e acusou Mascaretti de omissão, por não investigar irregularidades que apontou no contrato. Mascaretti representou contra a desembargadora no CNJ.

Em dezembro de 2017, ao fazer um balanço de sua gestão, Mascaretti disse que a ampliação da eficiência foi reconhecida pelo Conselho Nacional de Justiça. Um mês antes, o estudo estatístico  “Justiça em números” atribuiu Selo Ouro ao Judiciário paulista.

Em março deste ano, Mascaretti perdeu para o desembargador Silmar Fernandes a eleição para compor o Tribunal Regional Eleitoral (TRE-SP) como juiz substituto, classe desembargador. Fernandes recebeu 163 votos, contra 146 votos obtidos por Mascaretti.

“Estou aqui para agregar e modernizar a administração pública, não para ter nenhuma vantagem e nenhum privilégio”, disse Mascaretti, durante o anúncio de seu nome pelo governador eleito João Dória, nesta segunda-feira (12).