Criminalistas têm restrições à proposta do ‘plea bargain’ defendida por Moro

Em artigos publicados neste final de semana, os advogados criminais Luís Francisco Carvalho Filho e Pierpaolo Cruz Bottini manifestam ceticismo diante da proposta do “plea bargain” defendida pelo ministro da Justiça, Sergio Moro.

Trata-se de acordo penal em que os réus negociam com promotores a confissão de crimes em troca de penas menores, abrindo mão da defesa para abreviar os processos.

“Se a ideia é enfrentar a morosidade, há outros meios”, observa Bottini.

“Tais instrumentos, largamente usados pelo juiz Sergio Moro na Lava Jato, poderiam ser incentivados pelo ministro Sergio Moro no Executivo, como intercâmbio de experiências e convênios com o Poder Judiciário. Parte do problema seria resolvido sem os riscos do ‘plea bargain’, diz o advogado.

Carvalho Filho foi presidente da Comissão Especial de Mortos e Desaparecidos Políticos (2001-2004). Bottini foi secretário de Reforma do Judiciário no Ministério da Justiça (2005-2007).

A seguir, trechos dos artigos dos criminalistas:

Repleto de ministros birutas, o governo Bolsonaro, pela voz aparentemente sóbria de Sergio Moro, quer instituir, por reforma legislativa, o chamado “plea bargain”, sistema existente na Justiça norte-americana e identificado por muitos como uma fábrica de presos, ainda que inocentes: para evitar vereditos extremos, o réu se declara culpado e “negocia” a pena com o órgão acusador.

A proposta de Moro foi recebida com entusiasmo por juízes e promotores, como medida capaz de conter a criminalidade e desafogar o Judiciário. Mas a negociação da pena faz sentido teórico no sistema judicial caríssimo dos EUA: todo julgamento é realizado pelo júri, marcado pela oralidade e pelos rituais que o cinema difunde. 

[Luís Francisco Carvalho Filho, em artigo na Folha]

(…)

Como um cobertor curto, a ideia aparentemente resolve o problema do tempo processual, mas cria outros maiores. Nos Estados Unidos, esse sistema é alvo de intensas críticas por levar muitos inocentes a aceitar as penas propostas diante dos custos financeiros e de reputação que um processo envolve.

No Brasil, um instituto que permita a renúncia de garantias sem o fortalecimento da Defensoria Pública e sem um controle judicial efetivo dos acordos, levará a um encarceramento em massa que apenas agravará a crise do sistema prisional. É preciso sopesar as consequências de cada caso, sob o risco de retrocesso.

[Pierpaolo Cruz Bottini, em artigo na revista Época]