Protagonismo do Supremo entre a farda e a toga
De Conrado Hübner Mendes, doutor em direito e professor da USP, em artigo na revista Época:
“O governo eleito traz ao Judiciário um desafio cuja força e magnitude ainda desconhece. O primeiro mês já deu uma amostra das transformações jurídicas que o governo pretende empreender no regime constitucional brasileiro.
(…)
A tarefa judicial é monumental. Para que o direito dito pelo juiz seja crível e respeitável, há condições institucionais, éticas e argumentativas que uma Corte deve cumprir. É preciso se fazer respeitar pelo que diz e pelo que faz e pairar acima dos interesses políticos e econômicos que pretende arbitrar.
A imagem de imparcialidade se constrói e se administra, não vem de graça. A má notícia é que a magistocracia não tem essa vocação, e o STF, em particular, não se mostra à altura da ameaça da “nova era”.
Não bastaram o desgaste e o desprestígio que a Corte acumulou nos últimos anos. Declarações do presidente Dias Toffoli, em cujo gabinete já mora um segundo general, sugerem que o Judiciário deve “se recolher”, perder o protagonismo e apenas arbitrar conflitos à distância.
Ainda antecipou gratuitamente, dias atrás, juízo de constitucionalidade favorável a medida do governo.
Para além das palavras, Toffoli criou para si o poder de cassação de decisões monocráticas dos outros ministros (ao suspender, por exemplo, decisão do ministro Marco Aurélio, a qual, se equivocada e obstrucionista, deveria ser revista pelo plenário).
Como o presidente é também dono da pauta, seu projeto de controle é total. Cesarismo judicial para dentro, servilismo judicial para fora: é isso que estará nas entrelinhas de seu discurso na abertura do ano judiciário.
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Do presidente do Supremo Tribunal Federal, ministro Dias Toffoli, em discurso na instalação do Ano Judiciário de 2019:
Não há dúvidas de que, nos últimos anos, o Supremo Tribunal Federal passou a exercer um papel cada vez mais intenso na vida social, econômica e política brasileira, o que levou o Tribunal ao centro do debate das grandes questões nacionais.
Entretanto, não podemos ser uma instância recursiva do debate político.
Cumpre a esta Corte promover o equilíbrio institucional entre os poderes, com vistas ao fortalecimento do Estado Democrático de Direito.
Essa função se exerce sem predomínio ou interferências nas competências constitucionais dos Poderes da República.