Expectativas em torno do pacote anticrime de Sergio Moro

O ministro da Justiça e Segurança Pública, Sergio Moro, apresentará nesta segunda-feira (4) a governadores e secretários de segurança pública seu Projeto de Lei Anticrime.

O ex-juiz da Lava Jato propõe “medidas pontuais e eficazes em relação ao crime organizado, crimes violentos e corrupção”.

“É um projeto simples, mas robusto, com medidas bastante objetivas”, explicou. Em video gravado neste domingo, ele diz que as medidas a serem anunciadas são “bem fáceis de serem explicadas ponto a ponto”.

O texto do projeto preparado pela equipe de Moro foi enviado à Casa Civil na última sexta-feira (1º) para ajustes finais, informa a Folha.

Juízes e membros do Ministério Público consultados pelo Blog têm expectativas diferentes sobre o sucesso das propostas e avaliam em que medida o timing da divulgação reflete uma estratégia do ministro. Ou seja, se o pacote de medidas será capaz de reverter e reduzir as críticas que vinha recebendo pela cautela –ou inércia, segundo alguns–, diante de fatos graves envolvendo declarações de ministros e suspeitas que atingem familiares do presidente Jair Bolsonaro.

O procurador regional da República Vladimir Aras, que atuou no caso Banestado e na Lava Jato, acha “bem adequado” o momento da apresentação do projeto, “logo depois da definição das presidências da Câmara Federal e do Senado Federal”.

“Agora começam os trabalhos legislativos, e o texto deve iniciar sua tramitação na Câmara dos Deputados, o que permitirá também que a comunidade jurídica conheça e debata o projeto”, diz Aras.

O Projeto de Lei Anticrime é uma das metas prioritárias dos primeiros 100 dias de governo. Já se previa que o texto seria enviado ao Congresso Nacional no início dos trabalhos do Legislativo.

Gilson Dipp, ministro aposentado do Superior Tribunal de Justiça, não identifica na iniciativa de Moro a imagem de estrategista que atribuem ao ex-juiz federal.

“Me parece apenas apresentar [o projeto] ao Congresso recém empossado e sem pauta. Depois virão as tentativas de reformas, que é o que vai interessar e talvez não haja espaço e repercussão maior. Não acredito em estratégias e enxadrismo”, diz Dipp.

O juiz Renato Soares de Melo Filho, do Tribunal de Justiça de São Paulo, diz que Moro “continua revelando seu lado estrategista, embora agora na posição de vidraça, com cobranças imensamente maiores”.

“Encerradas as disputas pelas presidências da Câmara e Senado, seu pacote de reformas penais e processuais penais veio em bom momento, considerando que as da previdência e tributária demandarão articulação bem mais complexa junto às casas legislativas”, afirma.

“Afinal, a pressão popular pelas prisões após condenação em segunda instância ou pelo Tribunal do júri, bem como o recrudescimento nas condições de progressão de regime, entre outras medidas, são mais consensuais, simples e objetivas do que mudanças nas aposentadorias e tributos”, diz.

Moro tem sido cobrado pelo silêncio em relação a questões sensíveis envolvendo figuras próximas ao presidente Jair Bolsonaro.

Para o juiz Renato Soares de Melo Filho, “é importante que ele mantenha discrição, desde que a mesma coerência seja tomada em relação aos opositores, o que vem sendo feito”.

Alguns magistrados viram como reflexo da pressão sobre o ex-juiz federal paranaense o artigo que o cineasta José Padilha publicou na Folha, na edição de 20 de janeiro, sob o título “Sergio Bolsomoro”, em que sustentou que o “ministro corre risco se abdicar de convicções éticas”.

“Ninguém movimenta recursos de maneira tão anormal quanto Flávio Bolsonaro [senador eleito, filho do Presidente] e seu ex-assessor”, afirmou Padilha, para questionar em seguida: “Sergio Moro, o novo e poderoso ministro da Justiça, ungido pela eficiente luta contra a corrupção empreendida no âmbito da Operação Lava Jato, vai ficar assistindo a tudo isso sem fazer ou falar nada?”

“Sergio Moro criou um capital moral, e os brasileiros apostaram nele. Resta ver se este capital vai produzir algo de concreto”, conclui Padilha.

Um juiz federal da área criminal diz que o ministro da Justiça continua devendo uma boa explicação sobre o silêncio. Segundo ele, o episódio é muito grave e rompe com tudo que o juiz da Lava Jato sempre atacou e combateu.

Ele acha que o pacote –que pretende alterar 14 leis– vai ficar parado na Câmara Federal. Cético, ele lembra que o projeto do novo Código Penal e de Processo Penal –mais importantes, a seu ver– está parado há oito anos.

Um procurador da República, que preferiu não ser identificado, entende que quem tem de se manifestar sobre os atos do senador filho do presidente da República é o Ministério Público do Rio de Janeiro ou a Procuradoria Geral da República.