Moro e ministros advogados do governo

Questionado pela revista Veja sobre suspeitas envolvendo o ministro-chefe da Casa Civil, Onyx Lorenzoni, e o senador eleito Flávio Bolsonaro (PSL-RJ), o ministro Sergio Moro, da Justiça e Segurança Pública, voltou a afirmar que seu papel “não é ficar advogando, como fizeram outros ministros da Justiça do passado”.

Eis trecho da entrevista concedida à jornalista Laryssa Borges, nas Páginas Amarelas:

Veja – Incomoda o senhor ser indagado sobre o caixa dois do ministro Lorenzoni ou sobre as suspeitas do Coaf contra o senador Flavio Bolsonaro?

Sergio Moro – O ministro da Justiça não é advogado dos integrantes do governo ou de pessoas que nem sequer entraram no governo. Meu papel é dar estrutura, liberdade e autonomia aos órgãos que atuam dentro do Ministério da Justiça, e entre eles estão o Coaf e a Polícia Federal. Meu papel é diferente, não é ficar advogando, como faziam outros ministros da Justiça do passado. Acho uma conduta inapropriada”.

O assunto havia sido tratado no Painel da Folha na edição da última terça-feira (5):

Carapuça – “O ministro da Justiça defende a aplicação da lei, e não governantes. Mas voltou o tempo dos que, diante de situações constrangedoras, dizem: ‘nada a declarar'”. A fala é de José Eduardo Cardozo, ministro da Justiça na era Dilma Rousseff, e o destinatário é Sergio Moro.

Carapuça 2 – Nesta segunda (4), questionado sobre reportagem da Folha que mostrou que o ministro do Turismo é suspeito de integrar esquema de desvio de dinheiro na eleição, Moro disse que o tempo de titulares de Justiça que se portavam como advogados do governo havia passado.

Carapuça 3 – É a esta fala que Cardozo responde fazendo referência a Armando Falcão, conhecido como “ministro nada a declarar”. Falcão ocupou a pasta no governo Geisel, durante a ditadura militar.

Sergio Moro não citou nomes de ex-ministros advogados.

Episódios envolvendo dois ex-titulares da pasta da Justiça poderiam ilustrar seus comentários:

1. Então ministro da Justiça no governo Dilma Rousseff, José Eduardo Cardozo defendeu Lula em entrevista ao Valor Econômico, em 2015:

“Conheço Lula há muitos anos e tenho a total confiança de que ele não se envolveu nem permitiria que alguém próximo dele se envolvesse em desmandos”.

2. O ministro Cardozo também negou o envolvimento de Lula nas irregularidades investigadas na Operação Porto Seguro. Segundo o jornalista Reinaldo Azevedo, a suspeita foi levantada pelo deputado Anthony Garotinho (PDT-RJ), pelo fato de Lula ser amigo íntimo de Rosemary Noronha e de tê-la nomeada chefe do escritório da Presidência em São Paulo desde seu primeiro governo.

“Imaginar que o ex-presidente estivesse envolvido por trás disso está ao meu ver desmentido”, disse Cardozo.

3. Ministro da Justiça no governo Lula, o advogado Márcio Thomaz Bastos levou seu colega criminalista Arnaldo Malheiros a uma reunião na casa do então ministro da Fazenda Antonio Palocci, quando veio à tona o episódio da quebra do sigilo do caseiro Francenildo Costa.

Segundo revelou em 2009 o jornalista Luiz Maklouf Carvalho, na revista Piauí, o ministro foi criticado por um dos seus grandes amigos, o jurista Miguel Reale Jr.

Todos os fatos levam a crer que a alma do advogado prevaleceu sobre a alma do ministro Márcio Thomaz Bastos”, disse Reale Jr. numa entrevista.

Malheiros e Thomaz Bastos já morreram.

O então ministro da Justiça prestou depoimento sobre sua atuação no caso Palocci/Francenildo à Comissão de Constituição e Justiça e de Cidadania da Câmara Federal.

Na ocasião, o Ministério da Justiça divulgou Nota Oficial:

(…)

“Thomaz Bastos compareceu a uma reunião com Antonio Palocci, então ministro da Fazenda, na quinta-feira (23/03/2006), para apresentar o advogado Arnaldo Malheiros a Palocci.

Durante o contato, Malheiros – que é um dos principais especialistas em direito penal do Brasil -, fez uma exposição, ouviu e falou sobre alguns aspectos genéricos da questão.

No encontro, ao qual também esteve presente o então presidente da Caixa Jorge Matoso, não houve qualquer menção à informação de que o executivo da Caixa havia entregado extrato bancário ao ministro Palocci”.