Atuação do Exército foi execução sumária, dizem juízes da AJD

A Associação Juízes para a Democracia (AJD) emitiu nota pública de repúdio em que exige célere apuração da morte de Evaldo Rosa dos Santos, no bairro de Guadalupe, no Rio de Janeiro, quando soldados do Exército efetuaram 80 disparos contra o automóvel em que o músico estava com a família.

A associação define o episódio como “tenebroso homicídio”.

“A operação do Exército em Guadalupe foi totalmente ilícita configurando verdadeira execução sumária sem prévia investigação, sem processo, sem julgamento por um juiz competente e sem sentença condenatória”, diz a entidade.

Eis a íntegra da manifestação:

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“Mas mesmo assim
Ainda guardo o direito
De algum antepassado da cor
Brigar sutilmente por respeito
Brigar bravamente por respeito
Brigar por justiça e por respeito
De algum antepassado da cor
Brigar, brigar, brigar
A carne mais barata do mercado é a carne negra”
(Elza Soares)

A Associação Juízes para a Democracia (AJD), entidade não governamental, de âmbito nacional, sem fins corporativos, que tem como um de seus objetivos estatutários a defesa dos direitos humanos e das garantias fundamentais, assim como da manutenção do Estado Democrático de Direito, diante do tenebroso homicídio ocorrido no bairro de Guadalupe, zona norte da cidade do Rio de Janeiro, quando soldados do exército efetuaram 80 disparos contra um automóvel em que estava uma família, incluídas uma adolescente e uma criança, vem a público manifestar suas condolências pelo falecimento do músico Evaldo Rosa dos Santos (51 anos), repudiar a operação fatídica e exigir séria e célere apuração.

O falecimento de Evaldo Rosa dos Santos, vítima de ação violenta estatal, diante de sua esposa e de seus dois filhos, quando se dirigiam a uma festa familiar, é profundamente lamentável.

O Exército brasileiro, na forma do artigo 142, da Constituição da República, destina-se à “defesa da Pátria e à garantia dos poderes constitucionais” e somente pode agir, na defesa da lei e da ordem, por iniciativa de um dos três Poderes.

Atacar com 80 tiros um automóvel, sem as exigidas cautelas, sem risco concreto e pessoal dos soldados, é homicídio.

A criminosa operação militar ainda configura desvio de finalidade e afronta diretamente a específica delimitação das atribuições das Forças Armadas Brasileiras, visto que nosso ordenamento jurídico veda expressamente a pena de morte e exige, para a aplicação da sanção previamente prevista em lei, a observância do devido processo legal, da ampla defesa e do contraditório.

Vale dizer que é ilegal a atuação das Forças Armada na segurança pública e certamente não é atribuição do Exército atacar cidadãos brasileiros de surpresa e fora de uma situação bélica.

Ainda que o automóvel atingido estivesse ocupado por suspeitos de algum crime, a operação do Exército em Guadalupe foi totalmente ilícita configurando verdadeira execução sumária sem prévia investigação, sem processo, sem julgamento por um juiz competente e sem sentença condenatória.

Desse modo, não se pode deixar de denunciar que o atuar criminoso e homicida do destacamento militar, justamente por causa do descumprimento de seus deveres constitucionais, redundou na morte do músico Evaldo Rosa dos Santos diante de sua família, repetindo o atuar violento e cotidiano de agentes estatais nas periferias traçando um apavorante rastro de sangue negro e favelado.

Nesse passo, a Associação Juízes para a Democracia (AJD) manifesta suas condolências à família de Evaldo Rosa dos Santos, repudia a conduta do destacamento de soldados do Exército Brasileiro e exige célere apuração dos fatos e responsabilização dos executores.

São Paulo, 09 de abril de 2019.