Odiosa tentativa de uma empresa de ônibus para fugir da responsabilidade

Frederico Vasconcelos

Em 26 de novembro de 2007, um ônibus da Empresa Auto Onibus Santo André Ltda., sem freios, abalroou violentamente a traseira de um veículo parado em semáforo com sinalização vermelha, no município de Mauá (SP).

Por conta do impacto, o veículo também se chocou com outros que estavam a sua frente, em engavetamento.

Dentro do veículo abalroado estava a família composta por Sergio Olegario Martins, Denise Alves Oliveira e seus três filhos todos vítimas com diferentes graus de lesões corporais.

Na ocasião do acidente, um menor contava com apenas dois meses de idade. Sofreu fraturas e edema cerebral, foi submetido a medicação durante seis meses para controlar crises convulsivas, restou com debilidade permanente da função neurológica.

Uma menor contava com oito anos de idade. Suportou traumatismo crânio encefálico, fratura do fêmur direito, ferimentos no pé direito que culminaram com amputação do hálux [dedo grande do pé]. Foi submetida a cirurgia em ambos os tornozelos após longo período imobilizada e deambula com auxílio de andador, além de lesão neurológica permanente, permaneceu com afasia [perda do poder de expressão].

Foi ajuizada ação em 11 de junho de 2008. O caso foi julgado em primeira instância na 3ª Vara Cível – Foro de Mauá (SP).

A concessionária foi condenada ao pagamento de todas as despesas decorrentes dos tratamentos de saúde necessários à recuperação dos recorridos; ao pagamento de um salário mínimo para os menores R.O.M. e A.C.A.O., desde a data do evento até a data em que os beneficiados atinjam setenta e dois anos de idade; além de suportar a remuneração total de profissional habilitado para acompanhar a menor A.C.A.O. em tempo integral e pagar compensação por danos morais arbitrados no total de 954 salários mínimos.

O Tribunal de Justiça de São Paulo reformou a sentença tão somente na parte em que determina o custeio do tratamento médico de Sérgio Olegário Martins, por representar condenação além do pedido formulado na petição inicial.

Recurso especial foi julgado, no último dia 23, pela Terceira Turma do Superior Tribunal de Justiça. (*)

A empresa alegou que a condenação, de mais de R$ 2 milhões [equivalente a 964 salários mínimos à época] representa enriquecimento ilícito da família.

Alegou ainda que “em momento algum violou o direito ou causou dano aos recorridos”; que “o evento ocorreu por caso fortuito ou força maior motivado pela desconexão da mangueira de Ticolem que alimenta o botijão do compressor, e não ocorreu por dolo ou por negligência ou falta de revisão, ao contrário, deu-se por absoluta fatalidade”.

A relatora, ministra Nancy Andrighi, entendeu que “o argumento de que se trata de ‘absoluta fatalidade’ um ônibus de transporte coletivo de passageiros não ter o sistema de frenagem em funcionamento hígido representa estratégia absurda e odiosa para tentar indevidamente escapar da responsabilidade inerente ao serviço de transporte urbano sobre a correta conservação da frota veicular”.

Como a própria família havia formulado pedido “com valor certo e determinado” de R$ 400 mil, a título de indenização por danos morais, o STJ reformou a sentença, por entender que o juiz não pode ir “além da pretensão concretamente exposta para arbitrar quantia superior”.

A Terceira Turma, por unanimidade, reduziu o valor da compensação por danos morais em favor do grupo familiar para R$ 400 mil, devidamente atualizado a partir da data da sentença. Manteve integralmente a condenação nos demais capítulos da sentença.

Acompanharam a relatora os ministros Paulo de Tarso Sanseverino, Ricardo Villas Bôas Cueva, Marco Aurélio Bellizze e Moura Ribeiro (Presidente).


(*) Recurso Especial nº 1.778.607 – SP.