Juiz Ivan Sartori vestiu a camisa de Bolsonaro e quer enfrentar as urnas
“Assediado por partidos, juiz que anulou júri do Carandiru quer ser prefeito”, informa Luís Adorno, do UOL, neste sábado (11).
O juiz é o desembargador aposentado Ivan Garísio Sartori, 62, ex-presidente do Tribunal de Justiça de São Paulo. Num curto período, é o terceiro ex-presidente do TJ-SP que decide fazer carreira na política.
Os dois anteriores, Renato Nalini e Paulo Dimas Mascaretti, optaram pelo caminho do Executivo, ao deixar a toga, mas sem disputar eleições. Nalini, como secretário de Educação no governo do tucano Geraldo Alckmin, e Mascaretti, secretário da Justiça no governo do tucano João Dória.
Sartori recebeu convites de PSD, PSL, Patriotas e Podemos para se candidatar a prefeito da cidade de Santos, na eleição do ano que vem, informa Adorno. O magistrado aposentado já tem assessor de imprensa e equipe de marketing.
Sartori foi alvo de críticas de organizações de direitos humanos ao votar, em 2016, pela anulação do júri e a absolvição dos 74 policiais militares do massacre do Carandiru, justificando a ação da Polícia Militar como “legítima defesa”. Ele criticou a imprensa e organizações da sociedade civil.
O massacre de Carandiru pode tirar votos de Sartori. Mas, enquanto vigorar o modelo inspirado em Jair Bolsonaro, a cuja candidatura aderiu ainda quando era magistrado, o ex-presidente do TJ paulista deverá contar com o apoio fiel de Policiais Militares e seus familiares.
Sartori afirmou ao repórter do UOL que Bolsonaro “está muito bem intencionado”.
“Bolsonaro se cercou de técnicos. Acho que a política no Brasil está no caminho certo”, diz Sartori.
Ele diz admirar a “vontade” do governador do Rio de Janeiro, Wilson Witzel (PSC), um ex-juiz que optou por radicalizar a atuação contra o crime organizado.
Witzel é acusado de estimular a execução de suspeitos, tendo gravado a si próprio em voo de helicoptero numa operação para supostamente eliminar traficantes portadores de armas.
Sartori deixou a presidência do TJ-SP com manifestações de apoio de magistrados e servidores. Durante seu mandato, cumpriu a promessa de manter diálogo com juízes de primeiro grau e com funcionários do tribunal.
Mas a influência da toga do então desembargador não ajudou o desempenho de seu filho, Guilherme Sartori, nas urnas.
Guilherme foi candidato a vereador pelo PHS, partido da coligação que elegeu a chapa João Doria e Bruno Covas. Foi nomeado para atuar na Secretaria Municipal das Prefeituras Regionais, comandada por Covas.
Sartori deve contar com o apoio de magistrados que concordam com sua visão de que, em represália à Lava Jato, políticos corruptos se voltaram contra o Judiciário, utilizando a imprensa para colocar o povo contra os juízes.
Em fevereiro deste ano, ele foi entrevistado por Eduardo Velozo Fuccia, do jornal A Tribuna, de Santos, sobre sondagens para disputar a prefeitura. Sartori assim explicou a sua aposentadoria antecipada:
“Eu me desencantei com a magistratura. Não é mais prestigiada como na época em que nela ingressei. O volume de serviço é avassalador. O juiz virou um tarefeiro, face ao grande número de processos. A imprensa denigre o Judiciário, que perdeu o controle de si próprio com os magistrados de fora, políticos. Os magistrados deveriam ser só concursados, de carreira.”
Em 2017, Sartori afirmou que o Estado era “leniente com a criminalidade”. Disse que o Estado era “inexistente”, e que abriu espaço para o crime organizado, “que já vem governando o país”.
Em 2013, Sartori recebeu elogios da ex-corregedora nacional de Justiça, Eliana Calmon: “A sintonia que se estabeleceu entre nós, eu Corregedora Nacional e o senhor presidente do maior tribunal do país, complexo, desarrumado, com gestão quase caduca, fizeram-nos salvadores de uma fatia considerável do Brasil: o tribunal destravou sob sua regência. Este é um mérito seu e ficará na história dessa Casa”.
Eliana apoiou a candidatura de Bolsonaro.
Em maio de 2018, o então corregedor-nacional de Justiça, ministro João Otávio de Noronha, votou pelo não recebimento de reclamação disciplinar contra Sartori. Organizações de direitos humanos, intelectuais e ativistas manifestaram preocupação com o primeiro voto do CNJ no sentido de arquivar denúncia contra o magistrado. O CNJ apurava suas condutas e declarações durante o julgamento de recurso do massacre do Carandiru, em setembro de 2016.
Em novembro de 2018, o Tribunal de Justiça de São Paulo manteve a determinação de que os policiais militares condenados no caso do massacre do Carandiru sejam submetidos a novo júri popular.
Sartori foi um dos 11 magistrados alvo de procedimentos instaurados pela Corregedoria Nacional de Justiça para avaliar se, nas eleições de outubro, houve “atividade político-partidária vedada a magistrados”.
Sartori alegou ao CNJ que a postagem feita por ele (com os dizeres ‘Brasil acima de tudo, Deus acima de todos’, em foto do perfil do Facebook) não se enquadra no conceito de atividade político-partidária e que a expressão utilizada é de domínio público, não sendo exclusividade de partido político ou candidato”.
Na sessão do CNJ que absolveu os magistrados, o ministro Dias Toffoli, presidente do órgão, disse que a abertura dos procedimentos para investigação da conduta dos juízes evitou uma politização do Poder Judiciário. E acrescentou: “Esse arquivamento não quer dizer que o CNJ não estará atento ao cumprimento do provimento”.
Aposentado, Sartori não está mais ao alcance de medidas do CNJ. Mas, apesar de ter sido absolvido por vestir a camisa de Bolsonaro ainda na magistratura, o episódio pode servir de “case” para estudo pelo grupo de trabalho criado por Toffoli.
Afinal, a iniciativa de Toffoli –considerada pelos juízes uma tentativa de mordaça– foi tomada para “avaliar os parâmetros para o uso adequado das redes sociais pelos magistrados”.