Abusos de poder e paternalismo no Judiciário

Nesta semana, a 1ª Turma do Supremo Tribunal Federal (STF) negou pedido da desembargadora Tânia Garcia de Freitas Borges, do Tribunal de Mato Grosso do Sul, que pretendia reverter o afastamento de suas funções determinado pelo Conselho Nacional de Justiça (CNJ) até julgamento final de processo administrativo disciplinar.

Ela foi acusada de utilizar carro oficial e escolta para buscar seu filho no presídio de Três Lagoas (MS), e interná-lo em clínica psiquiátrica.

Segundo os autos, o filho foi detido em abril de 2017 com 130 quilos de maconha, munições de fuzil e uma pistola nove milímetros.

O relator, ministro Luiz Fux, afirmou, segundo o site “Migalhas”, que “essa mãe coincidentemente era desembargadora e ela deixou confundir o cargo com o desespero da mãe. E ela extrapolou. Sob o ângulo institucional, ela se deixou levar pelo instinto materno”.

Em episódio distinto, o chamado instinto paterno aparentemente levou dois ministros do STF a confundirem o cargo com interesses familiares.

Em julho de 2013, reportagem de Leandro Colon e Diógenes Campanha, publicada na Folha, tratou da indicação das advogadas Letícia Mello, filha do ministro Marco Aurélio Mello, do STF, e Marianna Fux, filha do ministro Luiz Fux, para vagas de desembargadoras pelo Quinto Constitucional nas Justiças federal e estadual, respectivamente. [veja aqui]

Ambas tinham poucos anos de advocacia. “Leticia é mais experiente do que Marianna. Formou-se em 1997 e trabalha num escritório de prestígio. É considerada no meio jurídico uma advogada promissora, mas que dificilmente chegaria tão cedo a uma lista tríplice se o pai não estivesse no STF”, revelaram os jornalistas.

A reportagem informou que Marianna trabalhava no escritório do advogado Sérgio Bermudes, amigo de Fux.

Fux não respondeu aos pedidos de entrevista da Folha, na ocasião, e as duas candidatas não se manifestaram.

“É pecado?”, perguntou o ministro Marco Aurélio. “É justo que nossos filhos tenham que optar por uma vida de monge?”, questionou.

“Quando eu celebro o ingresso na carreira, eu o faço firmando um voto, como um sacerdote”, diz  o ministro do Tribunal Superior do Trabalho e conselheiro do CNJ Aloysio Corrêa da Veiga, em entrevista concedida a Reynaldo Turollo Jr., da Folha.

“A Lei Orgânica da Magistratura [Loman] impõe uma conduta ao juiz. Esse conteúdo de reserva terá que ser aplicado também em toda a relação da vida privada do juiz, inclusive nas redes sociais. É porque ele representa um Poder do Estado, que é o Poder que dá a Justiça”, afirma.

O conselheiro Veiga recebeu do ministro Dias Toffoli, presidente do STF e defensor da inconstitucional censura prévia, a tarefa de coordenar um grupo de trabalho para “avaliar parâmetros para o uso adequado das redes sociais pelos magistrados”.

A ideia de Toffoli, segundo diz, é preservar a credibilidade do Judiciário.

Os abusos de poder, as carteiradas e as indicações políticas ou por influência de parentesco –evitando-se a entrada no Judiciário pela porta da frente do concurso público– são distorções criticadas também pela magistratura.

Costumam desmotivar os juízes de primeira instância e comprometem a credibilidade desse Poder –seja nas redes sociais ou fora delas.