A quem (mais) interessa o vazamento
Uma pergunta clássica que antecede as grandes investigações e reportagens é: a quem interessa?
O objetivo aparente da divulgação do vazamento pela Intercept do Brasil é implodir a Lava Jato. O epicentro óbvio é Curitiba, e, por extensão, o TRF-4, em Porto Alegre. O alvo primeiro das interceptações, o ex-juiz Sergio Moro e a força-tarefa do Paraná.
O vazamento, contudo, deve mirar o poder central, em Brasília.
Várias dúvidas deverão ser esclarecidas numa investigação que avance em relação às suspeitas, levantadas semanas atrás, de que procuradores e magistrados tinham seus celulares hackeados:
- A divulgação resulta de fogo amigo, ou seja, uma tentativa de evitar a indicação de Moro para o STF?
- Ou cortar, desde já, eventuais pretensões de o ex-juiz chegar à presidência da República?
Alguns desdobramentos são esperados.
As redes sociais deverão reforçar a tese de que Lula é vítima de uma perseguição política. Haverá pressões pela soltura do ex-presidente (por exemplo, a Associação Juízes para a Democracia já emitiu nota nesse sentido).
Como observa Celso Rocha de Barros em sua coluna na Folha, nesta segunda-feira (10), “não há nada nos vazamentos que prove que Lula é inocente, mas há sinais fortes de que seu julgamento não foi normal”.
Em nota, Moro nega qualquer “anormalidade ou direcionamento”.
Alguns magistrados tinham restrições a práticas adotadas por Moro e avaliavam com reserva (nos dois sentidos) as escusas dirigidas a Teori Zavascki, quando o ministro do STF advertiu o juiz da Lava Jato.
A divulgação das interceptações também deve afetar a sucessão de Raquel Dodge na Procuradoria-Geral da República.
O site da ANPR (Associação Nacional dos Procuradores da República), que promove a votação para a lista tríplice da categoria, mantém um link que remete para artigo do procurador da República Vladimir Aras, o candidato mais identificado com o juiz Sergio Moro, com quem atuou desde o caso Banestado.
Em julho de 2018, em artigo que tratava de fake news, Aras faz um comentário que aparentemente vale para os fatos atuais:
“Conhecer a autoria é importante. Porém, mais importante, no que concerne às fake news, é considerar o conteúdo divulgado, porque somente o exame da mensagem, da postagem ou do discurso é capaz de revelar as informações falsas, o discurso de ódio ou a incitação à violência, ou a existência de uma atuação concertada”.