Juízes e procuradores temem a volta da ‘Lei da Mordaça’

Frederico Vasconcelos

Entidades da magistratura e do Ministério Público entendem que o Projeto de Lei da Câmara 27/2017 pode inibir a atuação de juízes, procuradores e promotores no combate a crimes e ilegalidades.

A Frente Associativa da Magistratura e do Ministério Público (Frentas) e o Conselho Nacional de Procuradores Gerais do Ministério Público (CNPG) divulgaram nota pública na qual afirmam que o PLC desvirtuou o projeto das “10 medidas de combate à corrupção”.

Segundo as entidades, o PLC incluiu abuso de autoridade apenas de membros do Ministério Público e da Magistratura e crimes de violação de prerrogativas de advogados, o que destrói o sistema acusatório e traz tipos penais imprecisos e abertos.

Eis a íntegra da nota pública.

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NOTA PÚBLICA

O Conselho Nacional de Procuradores Gerais do Ministério Público dos Estados e da União (CNPG) e a Frente Associativa da Magistratura e do Ministério Público da União (FRENTAS), integrada pela Associação Nacional dos Procuradores do Trabalho (ANPT), pela Associação dos Magistrados Brasileiros (AMB), pela Associação Nacional dos Membros do Ministério Público (CONAMP), pela Associação Nacional dos Procuradores da República (ANPR), pela Associação dos Juízes Federais do Brasil (AJUFE), pela Associação Nacional dos Magistrados da Justiça do Trabalho (ANAMATRA), pela Associação Nacional do Ministério Público Militar (ANMPM), pela Associação dos Magistrados do Distrito Federal e Territórios (AMAGIS/DF) e pela Associação do Ministério Público do Distrito Federal e Territórios (AMPDFT), entidades de âmbito nacional que congregam mais de 40.000 juízes e membros do Ministério Público em todo o país, vêm a público manifestar sua profunda preocupação com a possibilidade de votação pelo Senado Federal do Projeto de Lei nº 27/2017, originário da Câmara dos Deputados, sem um maior debate com a sociedade, notadamente pelos graves efeitos que acarretarão à atuação do Ministério Público e do Poder Judiciário.

O PLC 27/2017, conhecido popularmente como as “10 medidas de combate à corrupção”, teve alterado seu texto original para serem incluídos dispositivos que enfraquecem o próprio combate à corrupção e a muitos outros crimes e ilegalidades que são objeto da atuação do Ministério Público e do Poder Judiciário, pilares do Estado Democrático de Direito, em prejuízo à sociedade brasileira e à República.

Ao prever crimes de abuso de autoridade praticados apenas por juízes, promotores de justiça e procuradores do Ministério Público, sujeitando-os a pena de prisão, e crimes de violação de prerrogativas de advogados, com redação aberta, genérica e passível de interpretações as mais imprecisas possíveis, temas estranhos ao combate à corrupção, o PLC 27/2017 aparenta ter a intenção de inibir a atuação destes agentes públicos.

Ademais, o PLC 27/2017 destrói o sistema penal acusatório, expressamente adotado pela Constituição Federal, ao transferir a titularidade da ação penal nos crimes de abuso de autoridade para instituições diversas do Ministério Público, e até para associações. Pode-se chegar ao absurdo, caso aprovado o referido projeto, de uma organização criminosa valer-se de associação para ingressar com ação penal contra membros do Ministério Público e do Poder Judiciário, como forma de perseguição a agentes públicos no cumprimento do seu dever constitucional.

O projeto de lei em questão prejudica, inclusive, a fiscalização das eleições de 2020, fragilizando o processo democrático, pois permite que membros do Ministério Público e juízes brasileiros empenhados no cumprimento da missão de garantir o respeito à soberania popular sejam injustamente processados por suposto abuso de autoridade, com exclusiva finalidade de cercear a atuação legítima das Instituições republicanas.

Finalmente, o PLC 27/2017 pretende ressuscitar a famigerada “Lei da Mordaça”, silenciando os agentes do Estado incumbidos da defesa do cidadão, de modo a ferir o direito de informação, a publicidade dos atos administrativos e a transparência exigidos em uma Democracia, constituindo-se em paradoxal retrocesso, sobretudo neste momento em que se exige maior e mais eficiente controle dos atos dos gestores públicos.

Esperamos que o Senado propicie o debate necessário, realizando audiências públicas e dialogando com os demais Poderes e Instituições da República, além de setores da sociedade, para o aprimoramento da proposta em tramitação e a correção das impropriedades aqui apontadas, com vistas a assegurar a preservação da Constituição Brasileira e o amadurecimento de nossa democracia.

Nesse contexto, as entidades que abaixo subscrevem colocam-se à disposição do Senado Federal para debater o PLC 27/2017, devendo eventuais hipóteses de abuso de autoridade serem tratadas em legislação própria, sem o desvirtuamento do projeto originário de medidas de combate à corrupção.

Brasília, 24 de junho de 2019.

Paulo Cezar dos Passos
Procurador-Geral de Justiça de Mato Grosso do Sul
Presidente do CNPG

Ângelo Fabiano Farias da Costa
Presidente da Associação Nacional dos Procuradores do Trabalho (ANPT)
Coordenador da FRENTAS

Jayme Martins de Oliveira Neto
Presidente da Associação dos Magistrados Brasileiros (AMB)

Victor Hugo Palmeiro de Azevedo Neto
Presidente da Associação Nacional dos Membros do Ministério Público (Conamp)

Noêmia Aparecida Garcia Porto
Presidente da Associação Nacional dos Magistrados da Justiça do Trabalho (Anamatra)

Fernando Marcelo Mendes
Presidente da Associação dos Juízes Federais do Brasil (Ajufe)

Fábio George Cruz Nóbrega
Presidente da Associação Nacional dos Procuradores da República (ANPR)

Trajano Sousa de Melo
Presidente da Associação do Ministério Público do Distrito Federal e Territórios (AMPDFT)

Antônio Pereira Duarte
Presidente da Associação Nacional do Ministério Público Militar (ANMPM)

Fábio Francisco Esteves
Presidente da Associação dos Magistrados do Distrito Federal (Amagis-DF