Liturgia do Supremo e palanque político

A solenidade de abertura do Ano Judiciário no Supremo Tribunal Federal foi uma invenção de Lula no primeiro mandato como presidente da República, quando o STF era comandado pelo ministro Maurício Corrêa.

Na ocasião, o ato funcionou como cachimbo da paz para reduzir as divergências entre os dois Poderes.

A origem da cerimônia é mencionada no livro “Os onze – O STF, seus bastidores e suas crises“, dos jornalistas Felipe Recondo e Luiz Weber [Companhia das Letras]:

“Lula conhecia bem o jogo da política. Foi na sua presidência que o Supremo passou a promover cerimônias de abertura do ano judiciário. A ideia surgiu como solução para uma crise entre o Supremo e o Executivo. O presidente assumiu o mandato e logo tachou o Judiciário de “caixa‑preta”.

O presidente do STF, Maurício Corrêa, revidou dizendo que Lula estava deslumbrado com o poder, e afirmava que quem governava de fato era o ministro‑chefe da Casa Civil, José Dirceu.

Corrêa era político de formação, parlamentar, candidato a governador do Distrito Federal. Falava a mesma língua que Lula. Os dois sabiam que cada um conversava com seu eleitorado. E que a divergência não era útil para nenhum dos dois, nem para o governo, nem para o Supremo.”

Segundo o STF informou na época, em seu site, “além do presidente da República, foram convidados os presidentes do Senado, José Sarney, da Câmara dos Deputados, João Paulo Cunha, dos tribunais superiores, de todos os tribunais do país e os juízes de todos os graus de jurisdição do Distrito Federal. A cerimônia é inédita no Judiciário brasileiro.

O livro trata de outro ritual do Supremo, o jantar de final do ano:

Costumava reunir ministros e ex‑ministros —tradição que Cármen Lúcia havia interrompido por não admitir que ex‑ministros, alguns deles exercendo a advocacia, jantassem com atuais juízes do tribunal, mas que Lewandowski retomara.”

Avesso a badalações políticas e sociais, o ministro Celso de Mello tem o seguinte perfil traçado por Recondo e Weber:

Comandou o tribunal de 1997 a 1999, mantendo a discrição e cuidando da sua fama de ermitão — comemorou a posse no Supremo jantando no McDonald’s, não frequenta eventos sociais, não almoça com políticos, não janta com advogados, não visita o Palácio do Planalto, não dá aulas, não aceita convites para palestras.”