Tribunal afasta juiz acusado de pedir dinheiro a tabeliã
O Tribunal de Justiça de São Paulo decidiu, por unanimidade, instaurar processo disciplinar e afastar do cargo o juiz André Gonçalves Fernandes, da 2ª Vara Cível de Sumaré (SP), até o final da apuração.
Ele foi acusado, entre outros fatos, de solicitar a uma tabeliã doações de equipamentos para a vara, e dinheiro para uma viagem à Europa, onde comemoraria as bodas de prata com a mulher.
A decisão foi tomada na sessão do Órgão Especial, na última quarta-feira (28).
“As imputações são graves e comprometem a imagem do Judiciário. Seus efeitos repercutem até hoje”, disse o corregedor-geral do TJ-SP, desembargador Geraldo Francisco Pinheiro Franco, relator do caso.
Ele acolheu a proposta do presidente do TJ-SP, de afastar cautelarmente o juiz, em nome da “restauração da credibilidade do Poder Judiciário de Sumaré”.
O procedimento preliminar foi instaurado a partir de denúncia feita por um magistrado.
Fernandes era corregedor do cartório da vara. Ao proferir seu voto, Pinheiro Franco disse que “os próprios delegatários [representantes do cartório], mesmo com risco, relataram na corregedoria o incômodo dos pleitos do magistrado”. “É flagrante o constrangimento”, afirmou.
O corregedor citou a compra de objetos de uso pessoal para o magistrado. Disse que o juiz deixou com a tabeliã um boleto para pagar um triturador de papel. “Mas nunca apresentou a nota fiscal. Era um boleto, de R$ 3.100 reais, para pagar uma plataforma digital, algum objeto com sofisticação”, disse.
“Houve a solicitação de pagamento de uma viagem particular com a esposa”. Segundo o corregedor, o juiz entrou no cartório, se dirigiu à oficial e disse “você poderia pagar uma viagem para mim e minha esposa?”
“O magistrado nega, diz que não foi à Europa. Mas, indo ou não indo, utilizando ou não o dinheiro, houve infração disciplinar”, disse Pinheiro Franco.
Ainda segundo o relator, há provas com testemunho presencial.
Depois que a tabeliã morreu, o juiz emitiu dois alvarás de levantamento de recursos. O corregedor disse que Fernandes “não tinha nenhuma vinculação com o inventário, não entendi esse interesse especial”.
“Sua excelência pouco ou nada esclareceu, não informou o motivo da expedição de alvará”, disse o corregedor.
Pinheiro Franco disse que, ao instaurar o procedimento, “propôs a alteração da corregedoria permanente para evitar qualquer manifestação do magistrado”.
O presidente Pereira Calças disse que leu o voto do corregedor com muita atenção e examinou as provas produzidas.
“Confesso que, no meu tempo de corregedoria, não vi um caso tão grave como esse. Confesso que fiquei envergonhado.”
“Havia uma coação implícita. Acho que a imagem do tribunal fica maculada”, afirmou o presidente, sustentando a impossibilidade de o magistrado continuar à frente da vara enquanto são apuradas as suspeitas.
Calças lamentou que os fatos envolvam “um juiz de formação na USP, doutor pela Unicamp, há muito tempo na comarca”.
André Gonçalves Fernandes é graduado em direito pela Faculdade de Direito do Largo de São Francisco (USP). Mestre e Doutor em Filosofia e História da Educação pela Unicamp.
O advogado de defesa, Renato Vieira, disse, em sustentação oral, que a imputação de que o juiz teria solicitado a doação de equipamentos “não teria relevância disciplinar, em razão do uso efetivo dos bens para o fórum”.
Segundo o advogado, “sempre foi ressaltado o caráter voluntário das doações”.
“Os envolvidos disseram que ele não impunha essas aquisições”.
“Não houve qualquer represália, ameaça, as doações foram feitas para uso do fórum. Não houve qualquer ilícito”, disse.
Sobre o custeio de uma viagem com a mulher para a Europa, Vieira disse que “o magistrado nega veemente essa solicitação, e comprovou nos autos que não houve a citada viagem, como o passaporte demonstra”.
Sobre a expedição de alvará, disse que foi “para levantamento de valores do cartório”.
“O magistrado disse que foi solicitada a expedição desse alvará, vinculado ao pagamento de despesas. Não havia vinculação do alvará a qualquer processo. Não houve qualquer violação”, disse.
Durante a votação, o desembargador Xavier de Aquino propôs a abertura de inquérito policial. O corregedor-geral disse que poderia encaminhar cópia do procedimento administrativo para avaliação do Ministério Público.
O Blog entrou em contato com a 2ª Vara Cível de Sumaré, mas não conseguiu ouvir o juiz.