STJ decide sobre novo tribunal federal

Mesmo reconhecendo que “o momento é difícil e de contenção de gastos”, o presidente do Superior Tribunal de Justiça, ministro João Otávio de Noronha, submeterá ao plenário da corte, nesta quarta-feira (11), o anteprojeto de lei que dispõe sobre a criação do novo Tribunal Regional Federal, TRF-6, com sede em Belo Horizonte (MG).

O plenário decidirá sobre o aumento do número de juízes do TRF da 1ª Região e anteprojetos de lei que dispõem sobre a transformação de cargos vagos de juiz federal substituto –no quadro permanente da Justiça Federal das cinco regiões– em cargos de juiz de TRF.

O TRF-6 será criado com o desmembramento do Tribunal Regional Federal da 1ª Região (TRF-1), com sede no Distrito Federal.

Trata-se de projeto que o mineiro João Otávio de Noronha alimenta há vários anos e pretende ver aprovado em sua gestão. Em viagens e conversas com ministros da corte, Noronha tem defendido a criação do novo TRF.

O projeto deverá ser aprovado no STJ, apesar das restrições de alguns ministros. A dúvida maior é sobre a aprovação do anteprojeto no Congresso, onde haveria resistências. A conferir.

Em maio, o Conselho da Justiça Federal (CJF) aprovou por unanimidade a proposta de criação do TRF-6. Na ocasião, Noronha abordou a questão dos limites orçamentários.

“Nós estamos criando o TRF-6 sem alteração no orçamento da Justiça Federal, aproveitando e redistribuindo recursos dentro do orçamento em vigor. Portanto, não terá nenhum aumento adicional ao erário, nem à União. Essa foi a nossa preocupação, pois sabemos que o momento é difícil e de contenção de gastos”, disse.

Apoio dos servidores

A proposta prevê a ampliação do TRF-1 e a reestruturação da 1ª instância da Seção Judiciária de Minas Gerais.

O projeto tem recebido apoio do Sindicato dos Trabalhadores do Poder Federal no Estado de Minas Gerais (SITRAEMG).

Em seu site, o sindicato informa que “sempre esteve presente na luta pela criação do TRF de Minas, por entender que o estado, com tantos processos aqui movimentados em lides do âmbito da Justiça Federal, não podia continuar pertencendo a um mesmo tribunal que congregava  (e continua a congregar) 13 estados mais o Distrito Federal”.

Minas Gerais responde por 35% dos processos julgados no TRF-1. A carga de trabalho por desembargador nos TRF-1 é 260% maior que a média dos demais TRFs.

Primeiro grau

Em maio, este Blog registrou que juízes federais de Minas Gerais estariam preocupados com os efeitos da criação do novo TRF. Embora considerem insustentável o acúmulo de processos no TRF-1, eles previam o esvaziamento da primeira instância da Justiça Federal em Minas Gerais, com a eliminação de cargos e extinção de varas.

Na ocasião, temia-se que o discurso de “custo zero” resulte na dilapidação do primeiro grau, que perderia servidores e estrutura material para ceder lugar a um tribunal, com 18 desembargadores, que já nascerá com sobrecarga: estima-se que cada gabinete do TRF-6 receberá 15 mil processos.

Segundo informações levadas aos magistrados mineiros, serão extintas seis das 34 varas da Seção Judiciária de Minas Gerais, dentre elas uma vara criminal que cuida de crimes financeiros. Essas varas serão aglutinadas e passarão a funcionar com uma secretaria única.

A título de exemplo: uma vara criminal da capital, que opera na estrutura atual com 15 servidores, terá esse número reduzido para 7.

Hoje, a vara mantém juiz titular e juiz substituto, cada qual com dois servidores nos gabinetes, e um diretor de secretaria com dez funcionários. Na estrutura proposta pelo CJF, a vara será substituída pelo juízo criminal, com apenas sete servidores. No lugar do diretor de secretaria, haverá um coordenador, com dois servidores.

A partir de processo relatado por Noronha, o modelo do novo tribunal é baseado em três premissas:

  1. a) modernização tecnológica (tribunal 100% eletrônico, com investimento na automação, uso de inteligência artificial e gabinetes compactos);
  2. b) modernização organizacional (reestruturação da primeira instância, compartilhamento entre estruturas administrativas de 1ª e 2ª instâncias, secretaria unificada das Turmas e Seções, e transporte compartilhado entre os desembargadores, à exceção do presidente, vice-presidente e corregedor);
  3. c) implantação com baixo impacto financeiro (reaproveitamento da estrutura física, aproveitamento da mão-de-obra terceirizada e compartilhamento de estruturas administrativas.

Segundo estatísticas do TRF-1, cerca de 35% dos processos analisados na Corte são originários do estado mineiro.

Segundo Noronha, o tribunal terá uma estrutura nova, compartilhando secretarias entre as unidades de 1º grau e fazendo a movimentação de servidores.

Polêmica antiga

Quatro novos tribunais foram criados pela Emenda Constitucional nº 73, de junho de 2013, cuja constitucionalidade foi questionada pela Associação Nacional dos Procuradores Federais (Anpaf).

Para a associação, a emenda viola o princípio da separação dos Poderes e deveria ter sido proposta pelo Judiciário. A entidade afirma que houve “vício formal de iniciativa”, pois a emenda “tramitou de forma sorrateira, sem a iniciativa e mesmo sem qualquer participação ou contribuição do Supremo Tribunal Federal ou de outro Tribunal Superior”.

A Advocacia-Geral da União também se manifestou pela inconstitucionalidade da proposta.

Uma liminar concedida em julho de 2013, em pleno recesso, pelo então presidente do STF, ministro aposentado Joaquim Barbosa, suspendeu a criação dos novos TRFs.

“É muito provável que a União esteja às voltas com carências e demandas tão ou mais relevantes do que a criação de quatro novos tribunais. A despeito de suas obrigações constitucionais e legais, a União não terá recursos indispensáveis para cumprir seu papel para com os administrados”, sustentou Barbosa, na liminar.

Joaquim Barbosa também temia o enfraquecimento da independência da Justiça Federal: “A fragmentação da Justiça Federal é deletéria para uma Justiça que se entende nacional. Por conjectura, a redução da competência territorial tende a tornar o órgão jurisdicional mais propenso às investidas de interesses paroquiais”, afirmou, na ocasião.

Na mesma época, o então presidente do STJ, ministro Francisco Falcão, defendeu a manutenção das cinco regiões, com ampliação do número de membros nos tribunais. “É mais viável aumentar a composição do que criar novos tribunais”, disse.

Reforço da Lava Jato

Em julho de 2016, os resultados então obtidos pela Operação Lava Jato serviram para reforçar os argumentos de juízes federais favoráveis à criação de novos TRFs.

“Neste momento em que assistimos à derrubada de esquemas de corrupção enraizados há anos, a criação dos novos Tribunais Regionais Federais assume uma nova dimensão: ela poderá acelerar a imposição de sanções a políticos, empresários, servidores públicos e detentores de mandatos eletivos responsáveis por desvios de recursos públicos”, afirmaram os juízes federais Roberto Veloso, Patricia Daher Lopes Panasolo e Ricardo Rabelo, em artigo sob o título “A Justiça Federal de segunda instância e o combate à impunidade“.

Na ocasião, Veloso era presidente da Associação dos Juízes Federais do Brasil (Ajufe). Patrícia Panasolo e Ricardo Rabelo, respectivamente, presidentes das associações dos juízes federais no Paraná e em Minas Gerais.