A madre superiora do STF e o procurador do baixo clero

A ministra Cármen Lúcia, ex-presidente do Supremo Tribunal Federal, é ex-aluna de internato de freiras e já disse ter uma “madre superiora” dentro de si. Moacir Guimarães Moraes Filho, subprocurador-geral da República, é considerado por colegas um membro do chamado baixo clero do Ministério Público Federal.

Cármen Lúcia “sabe separar fé e jurisdição”, no dizer de um magistrado. Religiosa, a ministra votou a favor da Marcha da Maconha, da cota para negros, da união gay e do aborto de anencéfalos. Moacir Guimarães costuma confundir prerrogativas do cargo com interesses pessoais. Protagonizou vários episódios em que foi criticado por não zelar pela imagem do MPF.

O membro do MPF não figura entre os cardeais do Parquet. Foi denunciado pelo franciscano leigo Claudio Fonteles, à época procurador-geral da República, sob acusação de usar o cargo em proveito próprio. Moacir Guimarães foi absolvido pelo STJ da acusação de crime de concussão –obter vantagem indevida, de natureza pecuniária, de uma construtora com a qual mantinha vínculo contratual.

Em outra ação, foi condenado por uso indevido de sinais públicos –armas e brasões oficiais– em ofícios que enviou à Receita Federal e à Polícia Federal, em proveito próprio, particular. A pena de 3 anos e 6 meses de reclusão foi substituída por pena restritiva de direito (prestação pecuniária de R$ 1 mil mensais, valor corrigido anualmente, durante o tempo da pena privativa de liberdade).

Pelos mesmos fatos, o Conselho Nacional do Ministério Público (CNMP) aplicou a pena de suspensão por 90 dias ao subprocurador-geral, “pelo descumprimento dos deveres funcionais concernentes em desempenhar com zelo e probidade as suas funções e guardar decoro pessoal”.

Em sua defesa, o subprocurador alegou que “agiu no estrito cumprimento do dever legal de apurar as supostas irregularidades cometidas pela empresa de construção civil contra mais de cem consumidores”. Fonteles discordou, na época: “A questão é nitidamente privada”.

O então PGR informou que o subprocurador-geral fez tramitar um procedimento contra a construtora “no âmbito de seu próprio gabinete” e denunciou a construtora à Polícia Federal, à Delegacia do Consumidor e ao Procon.

Cármen Lúcia é uma pessoa desprendida, de hábitos espartanos. Assim como fazia o ministro David H. Souter, da Suprema Corte dos EUA, ela costumava dirigir seu próprio carro a caminho do STF.

Para azar do subprocurador, foi distribuído a Cármen Lúcia mandado de segurança em que Moacir Guimarães requereu a “concessão de liminar, sem a audiência da parte contrária” [a procuradora-geral da República], para que fosse “imediatamente disponibilizado” a um servidor de seu gabinete uma vaga de garagem no prédio da PGR.

Eis alguns comentários de Cármen Lúcia, ao indeferir o pedido:

– “Estranha a pequeneza da discussão trazida a este Supremo Tribunal, em país angustiado por problemas essenciais da vida pessoal e social dos cidadãos”.

– “A questão posta nos autos não tem, na forma nem na matéria, substância ou importância significativa a permitir que se acione o órgão de cúpula do Poder Judiciário, assoberbado por questões de gravidade nacional, com questiúncula que não precisaria sequer se apresentar em sede judicial”

– “Não é por estar permanentemente aberto ao cidadão – como tem de estar – o Poder Judiciário, que se há de considerar formalmente regular ou juridicamente aceitável, possa alguém banalizar a via judicial para promover questionamentos sem fundamento jurídico e sem embasamento que não os humores pessoais do autor”.

– “Gabinete de órgão público não é propriedade particular nem servidor público tem seus direitos confundidos com a chefia direta ou indireta, vinculando os seus direitos ao ente – no caso, a União – cujos quadros integra”.

No último dia 7 de agosto, Raquel Dodge suspendeu os efeitos de portaria que concedera a Moacir Guimarães Moraes Filho aposentadoria voluntária, com proventos integrais.

Uma nova portaria determinou seu imediato retorno à atividade.