A farda na administração federal
No dia 28 de setembro, o procurador-geral da República, Augusto Aras, nomeou Roberto Severo Ramos para atuar como assessor na Secretaria Jurídica da Procuradoria-Geral da República. No dia 4 de outubro, Aras o exonerou, a pedido.
As duas portarias registram que o assessor entrou e saiu da PGR como Doutor em Ciências Militares, uma espécie de camuflagem, digamos assim, pois omite que se trata do general Roberto Severo Ramos.
A imprensa especulou que a exoneração de Severo Ramos da PGR foi feita a pedido, não do assessor, mas do presidente Jair Bolsonaro.
O general já exerceu o cargo de secretário-executivo da Presidência da República. Seu currículo registra que, anteriormente, como oficial-general, atuou como chefe do gabinete do Estado Maior Conjunto das Forças Armadas/Ministério da Defesa, 4º Subchefe do Estado Maior do Exército e Chefe do Estado-Maior do Comando Militar do Leste. Foi, ainda, chefe de gabinete do ministro-chefe da Casa Civil.
A rápida e discreta passagem do militar no órgão que comanda o Ministério Público Federal ilustra bem o processo que a Folha registra nesta segunda-feira.
Reportagem de Camila Mattoso e Ranier Bragon revela que nos primeiros nove meses na Presidência, Jair Bolsonaro já ampliou em ao menos 325 postos o número de militares, da ativa e da reserva, que participam da administração federal.
O ministério da Justiça, comandado por Sergio Moro, quase dobrou o seu contingente verde-oliva –de 16 para 28.
A presença de militares também alcança o comando do Judiciário.
Em setembro passado, sem maior transparência, o ministro Dias Toffoli, antes de assumir a presidência do Supremo Tribunal Federal, convidou o general Fernando Azevedo, ex-chefe do Estado Maior do Exército para assessorá-lo em seu gabinete.
Como registrou este Blog, “o convite ao general aconteceu num cenário conturbado pela campanha eleitoral de um candidato à Presidência da República que instigava membros da corporação militar, elogiava torturadores e pregava o armamento da população”.
O convite de Toffoli ao general não provocou reações públicas do STF. Fora do Judiciário, a iniciativa gerou críticas e elogios isolados.
O ex-ministro da Justiça José Carlos Dias considerou a escolha “uma má ideia” de Toffoli. “O Supremo jamais precisou de uma assessoria militar. A escolha fica mal para o STF, pois é absolutamente desnecessária”, afirmou Dias, em reportagem da Folha.
Ex-conselheiro do Conselho Nacional de Justiça, o procurador-geral de Justiça do Pará, Gilberto Valente Martins, disse que Toffoli “foi muito habilidoso nessa escolha”.
“Os militares das Forças Armadas são altamente qualificados. Certamente, um militar que chega ao generalato é bem formado. Na área da segurança institucional –atividade de inteligência– são os melhores”.
Nesta segunda-feira, a Folha registra a opinião de Raul Jungmann, que foi ministro da Defesa e Segurança Pública no governo Michel Temer. Segundo ele, as Forças Armadas “têm um programa de formação de quadros que eu reputo entre os melhores do mundo”.
A maior presença de militares na administração federal gera decisões contraditórias.
Enquanto o procurador-geral da República parece ocultar o currículo militar do ex-assessor jurídico Roberto Severo Ramos, o general Guilherme Theophilo, secretário nacional de Segurança Pública –ainda segundo a reportagem de Mattoso e Bragon–determina que os militares da pasta devem ir fardados toda quarta-feira.
Ao que tudo indica, ainda não há uma ordem unida no governo Bolsonaro.