Os riscos de maior impunidade com o rebaixamento do Coaf
Do advogado Pierpaolo Cruz Bottini, professor de direito penal da USP e ex-secretário de Reforma do Judiciário (governo Lula), em artigo sob o título “Os riscos do Coaf sob a tutela do Banco Central“, publicado nesta quarta-feira (23), na Folha:
“A proposta do governo federal de submeter o Coaf (Conselho de Controle de Atividades Financeiras) ao Banco Central é equivocada. E não são necessárias muitas linhas para expor as razões dessa afirmação.
(…)
Como gestores de informações estratégicas, as UIFs (Unidades de Inteligência Financeira) têm papel central no combate à lavagem de dinheiro. Por isso, há uma tendência mundial de garantir sua autonomia institucional, livrando-as de ingerências políticas e de manipulações.
(…)
A medida provisória 893 segue no sentido contrário, pois submete a UIF nacional –antigo Coaf– ao Banco Central. Se o órgão antes tinha autonomia e independência por ser constituído apenas por servidores públicos, agora é subordinado a uma autarquia e terá em seu conselho membros do setor privado.
A medida é imprópria”.
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A advertência de Bottini é relevante. E há fatos para confirmar as razões de sua afirmação.
Em 1997, a Folha rastreou 719 processos administrativos julgados entre 1994 e 1997 pelo Conselho de Recursos do Sistema Financeiro Nacional, em Brasília, conhecido no mercado como o “conselhinho”. [veja aqui]
Órgão paritário, formado por quatro representantes do governo e quatro da iniciativa privada, o conselho julga recursos contra punições aplicadas pelo BC (Banco Central) e pela CVM (Comissão de Valores Mobiliários).
A investigação jornalística realizada pelo editor deste Blog demonstrou que o sistema financeiro era mal fiscalizado e sofria punições irrisórias quando violava a lei.
Infrações à legislação que regula os bancos -como maquiagem de balanços e concessão de empréstimos vedados por lei- resultavam em multas de, no máximo, R$ 3.253 (ou 27 salários mínimos).
O levantamento mostrou que, em sua grande maioria, multas originais eram diminuídas ou transformadas em meras advertências.
“Embora suas decisões afetem até mesmo os bancos de grande porte -e haja casos isolados de inabilitação de dirigentes de corretoras-, elas não chegam ao conhecimento da sociedade, pois são publicadas em letras miúdas no Diário Oficial da União. Os vícios detectados pela reportagem -fiscalização ineficiente, apuração lenta e punições inócuas- estão na raiz dos fatos que provocaram a quebra de bancos como o Econômico e Nacional”.