Tribunal de Pernambuco leva caravana de juízes e advogados a Nova York
Um grupo de advogados que representam clientes em processos no Tribunal de Justiça de Pernambuco (TJ-PE) acompanhará juízes e servidores num curso de direito, de 11 a 15 deste mês, na Fordham University The School of Law, em Nova York.
Nas férias do Judiciário, o presidente da corte, Adalberto de Oliveira Melo, e o corregedor-geral, Fernando Cerqueira, estarão entre magistrados e funcionários num curso de extensão na Universidade da Geórgia (EUA), de 2 a 13 de dezembro.
Também viajarão aos EUA, recebendo diárias, dois oficiais da Polícia Militar, membros da assessoria policial do tribunal.
“É surpreendente uma caravana desse tipo. Parece uma grande expedição turística”, diz o ministro Gilson Dipp, ex-corregedor nacional de Justiça. Ele faz restrições à participação na comitiva de advogados que atuam no tribunal pernambucano.
Há magistrados que só recebem advogados nos gabinetes, com portas abertas e na presença de assessores ou de advogados da parte contrária. Em Nova York, juízes e advogados conviverão, fora do exercício profissional, em eventos culturais, sociais e de lazer.
Os advogados arcarão com suas despesas de viagem. Alguns são parentes de desembargadores. O tribunal não informou se os advogados são professores ou alunos de mestrado/doutorado.
Juízes e servidores assumirão os gastos com transporte aéreo e terrestre, e o tribunal cobrirá os gastos com hospedagem e alimentação, pagando oito diárias internacionais de US$ 691 para a viagem a Nova York, e 15 diárias para a viagem a Geórgia –valores a que terão direito o presidente e o corregedor-geral.
Dipp elogia a Escola Judicial de Pernambuco, que sempre estimulou a formação e especialização de magistrados e servidores, mas ficou surpreso ao saber que o tribunal não é transparente sobre os custos dessas viagens.
As informações sobre os cursos nos Estados Unidos foram obtidas pela reportagem em consulta às edições do Diário da Justiça (DJe) no período de julho a outubro deste ano.
Tribunal omite os custos
Em maio, o TJ-PE pagou diárias a 46 pessoas que participaram de um curso de cinco dias na Faculdade de Frankfurt, na Alemanha. [veja aqui].
O tribunal não informou os custos dessa viagem, estimados em R$ 1 milhão, nem mesmo quando essas informações foram requeridas com base na Lei de Acesso à Informação (LAI). [veja aqui]
A corte também não cumpriu vários prazos determinados pelo corregedor nacional de Justiça, ministro Humberto Martins, para prestar esclarecimentos ao CNJ sobre a viagem à Alemanha.
O programa em Nova York repete o modelo de Frankfurt.
Em 2018 o tribunal de Pernambuco criou o programa “Muito Além das Metas”, inspirado numa resolução do CNJ, em 2014, ainda na gestão do ministro Joaquim Barbosa.
Naquele ano foi criada a Política Nacional de Atenção ao Primeiro Grau de Jurisdição, para estimular juízes e servidores do primeiro grau, segmento mais sobrecarregado do Judiciário. Mas o TJ-PE inclui desembargadores nessas comitivas, ou seja, magistrados de segunda instância, e membros da cúpula do tribunal. O 1º vice-presidente, Cândido José da Fonte Saraiva, por exemplo, viajará a Nova York, com direito a diárias.
Juízes de primeiro grau lamentam as distorções nesse tipo de programa. É preciso viajar, é preciso sair do gabinete, dizem. Não dá para imaginar que, no mesmo momento em que despacha, sentencia, o juiz também esteja se aprimorando, pondera um magistrado paulista. Ele lembra que os juízes pagam para viajar.
Esses cursos em geral preveem um número mínimo de participantes. Quando a meta não é atingida, o tribunal permite que a comitiva seja “integrada por membros de outros segmentos da administração pública ou comunidade acadêmica”, principalmente por integrantes de outros tribunais, do Ministério Público, do Judiciário, do Executivo e do Legislativo, “desde que aceitem as mesmas condições estabelecidas em edital, cabendo a cada um arcar com os custos e despesas para sua participação”.
Inspeção do CNJ
O Conselho Nacional de Justiça informou que a corregedoria nacional vinha avaliando o programa de premiação no TJ-PE desde abril deste ano, após uma inspeção ordinária.
O conselho abriu procedimento (que corria em sigilo) para o tribunal prestar esclarecimentos com informações sobre normas e custos fixados. E alertou para que “a respectiva gratificação não seja utilizada para remunerar trabalho de natureza permanente e continuada”. [veja aqui]
O tribunal deu prazo para o tribunal comprovar a efetiva participação de magistrados e servidores, fornecendo os certificados individuais de frequência. [veja aqui]
Depois de vários adiamentos e prazos prorrogados, o tribunal enviou novas informações ao CNJ no último dia 21 de outubro. O corregedor examina as informações para proferir decisão.
O TJ-PE e o CNJ ainda não informaram o gasto total com a viagem à Alemanha.
Outro lado
O Tribunal de Justiça de Pernambuco não respondeu à consulta enviada na semana passada sobre os cursos que serão realizados nos Estados Unidos e sobre a participação de advogados que atuam na corte.
Sobre a viagem à Alemanha, Sílvio Romero Brandão, assessor especial da presidência do TJ-PE, coordenador científico do curso em Frankfurt, informou em agosto que “o próprio CNJ determinou que as referidas informações tramitassem em segredo de Justiça”.
O sigilo foi retirado posteriormente pelo corregedor nacional, mas a assessoria da corte manteve a prática de não enviar as informações.
No dia 22 de outubro, a assessoria de Comunicação do TJ-PE respondeu:
“As informações a respeito do curso organizado pela Escola Judicial de Pernambuco (Esmape/TJPE) são disponibilizadas no Diário de Justiça eletrônico (DJe), incluindo edital e possíveis mudanças.”