CNJ arquiva procedimento sobre viagem de juízes de Pernambuco à Alemanha
O ministro Humberto Martins, corregedor nacional de Justiça, determinou o arquivamento de pedido de providências instaurado pela Corregedoria Nacional de Justiça para apurar as premiações e os custos do Programa Muito Além das Metas, mantido pelo Tribunal de Justiça de Pernambuco, incluindo viagem de juízes e servidores à Alemanha, em maio deste ano.
O tribunal enviou 46 pessoas para um curso de treinamento de oito dias na Faculdade de Direito de Frankfurt. Consultado pela Folha na ocasião, o tribunal omitiu os custos totais da viagem e o número real de participantes.
Com base no mesmo programa, um grupo de advogados que representam clientes com processos no TJ-PE acompanha juízes e servidores num curso de direito, nesta semana, na Fordham University The School of Law, em Nova York. [veja aqui]
Com relação à viagem à Alemanha, Martins despachou no último dia 6, concluindo “pela inexistência de irregularidade na realização do curso promovido como medida de estímulo à produtividade no bojo do Programa Muito Além das Metas”.
O corregedor registrou que, “relativamente aos magistrados e servidores que receberam diárias para frequência ao curso, o TJ-PE informou que foi apresentada a prestação de contas de cada participante, de acordo com o disposto no art. 9°, §§ 1°e 2°, da Resolução n. 400, de 6 de junho de 2017, do TJ-PE”.
Segundo o tribunal, a resolução “já obriga os magistrados e servidores a encaminhar à Escola Judicial do Tribunal de Justiça de Pernambuco (ESMAPE) o certificado de participação no curso, tendo em vista que a Escola é a responsável pela promoção e coordenação do Programa de Treinamento e Pesquisa em Direito – Curso de Extensão em Frankfurt”.
O tribunal informou, ainda, que “os valores pagos a título de diárias aos participantes desse curso já constavam previamente reservados e designados para essa finalidade”.
Inspeção do CNJ apurou premiações
Em maio, a Folha divulgou reportagem sob o título “Tribunal de Justiça de PE infla prêmio, banca viagem de 25 à Europa e omite custo“. [veja aqui]
Com base num programa criado pelo CNJ em 2014, para estimular a produtividade no primeiro grau de jurisdição, o TJ-PE premiou oito juízes, mas facultou a inscrição de outros 17 participantes: quatro desembargadores, nove juízes e quatro servidores, escolhidos pelo Conselho da Magistratura.
Em setembro, o jornal divulgou que viajaram 46 pessoas –e não 25, como a corte informara. Levantamento realizado pelo jornal identificou o pagamento de cerca de R$ 1 milhão em diárias. [veja aqui]
O tribunal não confirmou esse valor e não informou o total do dispêndio.
Em 16 de julho, a corregedoria expediu ofício ao TJ-PE, depois que foi consultada por este Blog sobre a resistência do tribunal em fornecer informações sobre os custos da viagem, dados solicitados por meio da Lei de Acesso à Informação (LAI).
A Corregedoria Nacional de Justiça vinha apurando os fatos desde abril, a partir de inspeção ordinária realizada naquele mês.
Com base nessa inspeção, a corregedoria determinara ao TJ-PE:
- Prestar informações, no prazo de 30 dias, acerca das premiações e dos custos fixadas para o Programa Muito Além das Metas, devendo, inclusive, encaminhar cópia de todas os normativos vigentes que tratam do projeto;
- Caso a presidência entenda necessária a continuidade do programa, que a respectiva gratificação não seja utilizada para remunerar trabalho de natureza permanente e continuada, ficando a manutenção de tal modalidade de remuneração condicionada à realização de estudo que demonstre a necessidade específica e transitória da função a ser remunerada, hipótese em que o resultado dos estudos deverá ser apresentado à Corregedoria Nacional no prazo de 30 dias
Em setembro, depois que o tribunal prestou informações, o corregedor nacional despachou:
“Não obstante todas as informações já prestadas nos autos, a análise completa dos fatos pressupõe a comprovação de que todos os magistrados e servidores que receberam as diárias do TJPE para a realização do curso efetivamente frequentaram as atividades acadêmicas de aprimoramento profissional na Alemanha”.
Martins deu prazo de 10 dias para o tribunal apresentar “os certificados individuais de frequência de cada magistrado e servidor que foi beneficiado com o pagamento das diárias em razão do curso na Alemanha.”
Em outubro, o corregedor nacional voltou a intimar a presidência do TJ-PE, notificando que “os documentos juntados pelo tribunal não esclarecem a situação de todos os magistrados premiados”.
Ao analisar as informações enviadas pelo TJ-PE, o corregedor nacional observou que “possibilitou-se ao magistrado premiado, que não pudesse participar ou que não tivesse interesse no curso, indicar um servidor de sua unidade para participar”.
Martins admitiu a hipótese de “que outros desembargadores, magistrados e servidores possam ter ido para a Alemanha, nessa mesma viagem, ainda que não premiados”.
O corregedor nacional determinou a intimação da presidência do TJ-PE para que apresentasse, no prazo de cinco dias, as seguintes informações e documentos:
a) relação com o nome de todos os desembargadores, magistrados e servidores que viajaram para Alemanha no período de 27 a 31 de maio de 2019, em razão do curso promovido pela Faculdade de Direito de Frankfurt AM Main.;
b) esclareça a situação dos magistrados que foram premiados e que eventualmente não viajaram; e,
c) informe todos os que foram beneficiados com o pagamento de diárias, bem como junte, no mesmo prazo, o respectivo certificado individual de frequência de cada desembargador, magistrado e servidor.
O prazo não foi cumprido, houve prorrogação.
No último dia 6, Martins mandou arquivar o procedimento, pois entendeu que o tribunal apresentou as informações requeridas pela corregedoria nacional.
O TJ-PE e o CNJ ainda não revelaram o total gasto com a viagem à Alemanha.
Decisão da corregedoria
Eis a íntegra da decisão de Martins:
Cuida-se de pedido de providências instaurado de ofício pela Corregedoria Nacional de Justiça, em razão da Determinação n. 1, aprovada pelo Conselho Nacional de Justiça, nos autos do Processo n. 0001794-22.2019.2.00.0000, referente à inspeção realizada no Tribunal de Justiça de Pernambuco, com o seguinte teor: “prestar informações, no prazo de 30 dias, acerca das premiações e dos custos fixados para o Programa Muito Além das Metas, devendo, inclusive, encaminhar cópia de todos os normativos vigentes que tratam do projeto.” Devidamente intimada, a Presidência do TJPE prestou informações conforme Id. 3738114.
Prestadas informações sobre a regularidade do Programa Muito Além das Metas e a realização do curso em Frankfurt (Id.3767301), foi determinado ao TJPE que comprovasse a assiduidade dos magistrados e servidores que viajaram para a Alemanha com o recebimento de diárias (Id.3769246).
O TJPE prestou as informações requisitadas pela Corregedoria Nacional de Justiça (Id.3784292).
É, no essencial, o relatório.
O Tribunal de Justiça de Pernambuco apresentou informações sobre as premiações decorrentes do Programa Muito Além das Metas. Ficaram esclarecidos os fundamentos legais/regulamentares do programa de incentivo à eficiência do Poder Judiciário, bem como seus critérios objetivos de classificação. No que tange ao curso promovido pela Escola da Magistratura do TJPE, foram informados os magistrados e servidores premiados pelo Programa Muito Além das Metas, os quais foram convidados a realizar o referido curso na Alemanha, com o recebimento de 8 diárias na forma de incentivo.
O TJPE também providenciou a juntada da lista de presença dos participantes, devidamente assinada por todos, comprovando assiduidade e frequência ao curso.
Relativamente aos magistrados e servidores que receberam diárias para frequência ao curso, o TJPE informou que foi apresentada a prestação de contas de cada participante, de acordo com o disposto no art. 9°, §§ 1°e 2°, da Resolução n. 400, de 6 de junho de 2017, do TJPE.
A Resolução n. 400/2017 do TJPE já obriga os magistrados e servidores a encaminhar à Escola Judicial do Tribunal de Justiça de Pernambuco (ESMAPE) o certificado de participação no curso, tendo em vista que a Escola é a responsável pela promoção e coordenação do Programa de Treinamento e Pesquisa em Direito – Curso de Extensão em Frankfurt.
Vale destacar, ainda, que os valores pagos a título de diárias aos participantes desse curso já constavam previamente reservados e designados para essa finalidade.
É o que basta para se concluir pela inexistência de irregularidade na realização do curso promovido como medida de estímulo à produtividade no bojo do Programa Muito Além das Metas.
Nesse sentido, é caso de arquivamento do presente pedido de providências, ressaltando-se a obrigação do Tribunal de Justiça de exigir a imediata comprovação de frequência e o certificado de aproveitamento dos respectivos cursos nos quais participem magistrados e servidores com recebimento de valores de diárias, ajuda de custo ou qualquer outro benefício pago em razão dessas atividades.
Anoto, ainda, que sempre que o TJPE custear a frequência de magistrados ou servidores em cursos de aperfeiçoamento deverá arquivar os certificados de aproveitamento para eventual encaminhamento à Corregedoria Nacional de Justiça, caso isso se torne necessário em razão da apresentação de eventual impugnação.
Diante do exposto, determino o arquivamento do presente pedido de providências.
Publique-se e intimem-se.
Brasília, data registrada no sistema.