Eliana Calmon deixa a defesa de envolvido em disputa de terras na Bahia
A ex-corregedora nacional de Justiça, ministra aposentada Eliana Calmon, renunciou em setembro ao patrocínio da defesa de José Valter Dias, um dos personagens centrais do conflito de terras na Bahia que culminou com uma operação da Polícia Federal nesta terça-feira (19).
Como desdobramento dessa disputa, o STJ (Superior Tribunal Justiça) determinou o afastamento, por 90 dias, de seis magistrados do Tribunal de Justiça da Bahia –inclusive o presidente da corte, desembargador Gesivaldo Britto– suspeitos de vender sentença.
A decisão foi tomada pelo relator, ministro Og Fernandes.
“Eu advoguei o direito de José Valter e sua esposa até início de setembro, no CNJ (Conselho Nacional de Justiça), e cheguei a impetrar um mandado de segurança no Supremo Tribunal Federal”, diz Eliana Calmon.
“Como percebi que minha atuação e visão jurídica eram insuficientes para atender ao pleito dos clientes, decidi renunciar e substabeleci sem reservas de poderes, encerrando o patrocínio”.
“Muita coisa ainda virá à tona”, afirma a ex-corregedora nacional. “Esse conflito no oeste da Bahia já dura mais de trinta anos, com idas e vindas, sem uma conclusão”.
“É preciso que a Justiça vá fundo e examine com imparcialidade ambos os lados envolvidos no conflito, pacificando-o em definitivo”, diz ela.
Em novembro de 2016, Eliana Calmon entrou com pedido no CNJ para advogar em nome do borracheiro José Valter Dias e seu filho, Joilson Dias, que se apresentaram como legítimos proprietários das terras.
O CNJ recebera pedido de providências requerido pela empresa Bom Jesus Agropecuária Ltda., com sede em Rondonópolis (MT), e outros, representados pelos advogados Gilson Dipp, também ex-corregedor nacional de Justiça, Rafael de Alencar Araripe Carneiro e Leonardo Lamachia.
O Blog tratou da disputa em novembro de 2011 [veja aqui] e em abril deste ano [veja aqui].
Na época, o processo foi anunciado como disputa antiga de uma propriedade no oeste do Estado, que teria sido grilada ainda nos anos 70 com base numa atestado de óbito, supostamente fraudulento, de uma pessoa que havia morrido cem anos antes do registro.
Assumiram a defesa de José Valter Dias os advogados Henrique Nelson Calandra, Ricardo Hasson Sayeg e Adriel Brendown Torres Maturino.
Calandra é ex-presidente da Associação dos Magistrados do Brasil (AMB). Sayeg foi advogado do ex-juiz Nicolau dos Santos Neto, condenado por desvio de verbas na construção do Fórum Trabalhista de São Paulo.
Em reportagem de José Pedro Pitombo, a Folha revela, nesta quarta-feira (20), que o centro da investigação é um litígio judicial em torno da posse de uma área de 80 mil hectares —equivalente a 11 vezes o tamanho de Salvador— na região oeste da Bahia, configurando uma das maiores disputas de terra em curso no Judiciário brasileiro.
O conflito contrapõe centenas de agricultores de Formosa do Rio Preto, que atuam na produção de milho, soja e algodão no oeste da Bahia desde os anos 1980, e o borracheiro José Valter Dias, que alega ser o dono da área em litígio.
Dias é representado pela empresa JJF Holding de Investimento, da qual possui 5% de participação acionária. Os demais 95% pertenciam ao empresário Adailton Maturino dos Santos, que afirmava falsamente ser cônsul de Guiné-Bissau no Brasil, e sua mulher, Geciane Souza Maturino dos Santos.
Em uma série de decisões judiciais, o TJ-BA autorizou a transferência da posse de mais de 300 terrenos da região para José Valter Dias e sua esposa Ildeni Dias.
Acolhendo pedido da Procuradoria-Geral da República, o STJ determinou o bloqueio de R$ 581 milhões de parte dos investigados. Ao todo, 21 pessoas são investigadas na operação, o que inclui magistrados, empresários, servidores públicos e advogados.
Além do presidente do TJ-BA, Gesivaldo Britto, foram alvo da operação os desembargadores Maria da Graça Osório Pimentel, Maria do Socorro e José Olegário Caldas e os juízes Sérgio Humberto Sampaio e Marivalda Moutinho.