Ministro suspende sigilo em ação sobre ‘geodiscriminação’ na reserva de hotéis
O ministro Luís Felipe Salomão, do Superior Tribunal de Justiça, suspendeu parcialmente o segredo de justiça em processo no qual o Ministério Público do Rio de Janeiro questiona supostas práticas adotadas pelo sistema de reservas eletrônicas da empresa Decolar.
Salomão decidiu em mandado de segurança interposto pelo Ministério Público contra acórdão do TJ-RJ que determinara o sigilo em ação civil pública proposta por concorrente. (*)
Foi imputada à Decolar [pessoa jurídica] a prática de “geo-blocking” e “geo-pricing”. Segundo o Ministério Público, foi “constatada a discriminação geográfica de consumidores brasileiros no âmbito dos serviços de intermediação para reserva de hotéis”.
O geo-pricing é a utilização da localização geográfica do consumidor como fator determinante da diferenciação dos preços ofertados no mercado.
O geo-blocking, por sua vez, é a utilização da localização geográfica do consumidor como critério para determinar a disponibilização ou não de conteúdo, como, por exemplo, ofertas, a determinados usuários.
Salomão considerou que a ação versa sobre possível prática de “geodiscriminação”, conduta que possui potencialidade de causar danos a número incalculável de consumidores.
O ministro acolheu o pedido do MP de manutenção do segredo de justiça apenas ao algoritmo adotado pela Decolar e à eventual perícia de informática relativa a tal algoritmo e toda a base de dados adotada para a operação do sistema de reservas eletrônicas.
Salomão entendeu que fica resguardado o interesse público, e ficam preservados os direitos de propriedade intelectual e o segredo do negócio.
A 7º Vara Empresarial da Comarca da Capital do Estado do Rio de Janeiro, acolhendo pleito formulado pela empresa, decretara o segredo de justiça, decisão mantida pelo tribunal.
Foram sustentados os seguintes argumentos a favor da empresa: a) deveria ser preservado o sigilo empresarial; e b) a decretação do sigilo não prejudicaria o interesse público à informação. A medida também atenderia ao interesse social, pois afastaria o julgamento de “especulações” e “espetacularizações”, evitando-se o favorecimento de determinados concorrentes.
O Ministério Público ponderou que, “partindo do raciocínio adotado pelo acórdão, todas as ações no Judiciário que gerassem notícias para os jornais deveriam ter o seu segredo de justiça decretado, haja vista que trariam hipoteticamente prejuízos aos réus”.
O ministro registrou que a Constituição repudia qualquer prática discriminatória, consagrando o direito à igualdade, ou seja, “a ordem econômica deve buscar a redução das desigualdades regionais e sociais”, e o Código de Defesa do Consumidor (CDC) garante a igualdade nas contratações como direito básico do consumidor.
Salomão entendeu “estar comprovada, nos autos, a presença líquida e certa de fatos aptos a configurar o direito à impetração do writ [mandado de segurança], notadamente diante da ilegalidade do ato judicial que decretou o sigilo processual da ação civil pública”.
(*) RMS 61306-RJ