Procurador-geral de Justiça na gestão de Sérgio Cabral vira réu em ação penal

O Tribunal de Justiça do Rio de Janeiro recebeu, por unanimidade, denúncia contra o ex-procurador-geral de Justiça Cláudio Lopes, acusado dos crimes de formação de quadrilha, corrupção passiva e ativa e quebra de sigilo funcional, ocorridos entre 2008 e 2012.

Lopes foi denunciado pelo Ministério Público estadual, o mesmo órgão que dirigiu. É a primeira vez que um ex-procurador-geral de Justiça vira réu numa ação penal, informa o TJ-RJ.

Também são réus na ação o ex-governador Sérgio Cabral, o ex-secretário de Governo Wilson Carlos e Sérgio de Castro, apontado como operador financeiro da organização criminosa chefiada por Cabral.

Segundo a denúncia, o então procurador-geral recebeu cerca de R$ 7,2 milhões para obstruir investigações durante a gestão de Sérgio Cabral.

Lopes também foi acusado de alertar o então secretário de Saúde Sérgio Côrtes a respeito de uma investigação do Ministério Público. O vazamento de uma diligência de busca e apreensão teria permitido a destruição de extratos bancários de contas no exterior.

Em sessão conduzida pelo presidente do TJ-RJ, Claudio de Mello Tavares, os 19 desembargadores acompanharam o voto do relator, Elton Leme.

Reportagem de Italo Nogueira, publicada na Folha em novembro de 2018, revelou que a gestão de Lopes foi marcada pelo arquivamento de uma série de procedimentos para investigar a gestão Cabral. Parte dos inquéritos tinha como objeto casos que depois seriam alvo de denúncias da Operação Lava Jato, conduzida pelo Ministério Público Federal.

Um dos exemplos é a contratação do escritório da ex-primeira-dama Adriana Ancelmo por fornecedores do estado. O MPF apontou que a firma foi usada para receber e lavar propina para o emedebista.

Este Blog mencionou as investigações sobre Cláudio Lopes, em janeiro deste ano, quando o ministro do STF Luiz Fux, então alvo de críticas por determinar a suspensão de investigações envolvendo o senador Flávio Bolsonaro (PSL), aproveitou um evento público para exaltar o trabalho da imprensa.

“Quanto maior for a liberdade de imprensa, maior será o combate à corrupção. Foi a imprensa que inaugurou a estratégia de, ao invés de focar nos corruptos, focar nos corruptores, quando produz o noticiário. Que haja parceria legítima entre a imprensa e as instituições de combate à corrupção”, disse Fux.

Na ocasião, este Blog comentou:

“No mesmo território onde hoje vêm à tona as suspeitas de ligações da família Bolsonaro com milícias, floresceu uma parceria suspeitíssima entre o Ministério Público e o Executivo, fatos que ficaram distantes da imprensa.

Houvesse maior transparência e investigação jornalística, talvez o cidadão não seria surpreendido, em novembro [de 2018], com a prisão do ex-procurador-geral de Justiça Cláudio Lopes, do Rio de Janeiro.

Ele foi acusado de receber dinheiro do então governador Sérgio Cabral (PMDB) –durante a campanha para disputar o cargo, e uma mesada, depois de assumir a chefia da promotoria.”

Este espaço também registrou que a gestão de Cláudio Lopes foi marcada por irregularidades.

Uma inspeção da Corregedoria Nacional do Ministério Público (CNMP), realizada no MP do Rio em 2012, identificou pagamentos fora dos contracheques de servidores e membros da instituição a título de auxílio-alimentação, auxílio-locomoção, auxílio-educação, auxílio pré-escolar e auxílio-saúde.

Esses benefícios, que deveriam constar nos contracheques, eram registrados em processos administrativos.

O plenário do CNMP aprovou o relatório final do então corregedor nacional, Jeferson Coelho.

À época da divulgação dessa inspeção, o MPE foi procurado e não se manifestou.

Em dezembro de 2018, o ministro Sebastião Reis Júnior, do Superior Tribunal de Justiça, concedeu liminar para substituir a prisão preventiva do ex-procurador-geral por medidas alternativas à prisão (comparecimento quinzenal em juízo; proibição de acesso ao prédio do Ministério Público e de manter contato com os corréus ou qualquer pessoa relacionada aos fatos objeto da investigação e ação penal; proibição de ausentar-se da comarca e do país e suspensão do exercício de função pública).

Na época, a defesa alegou ausência de fundamentação idônea, inexistência de contemporaneidade dos fatos indicados pela autoridade coatora para o fim de justificar a medida extrema de prisão.

Segundo entendeu o ministro, “com o advento da Lei n. 12.403/2011, a prisão cautelar passou a ser, mais ainda, a mais excepcional das medidas, devendo ser aplicada somente quando comprovada a inequívoca necessidade, devendo-se sempre verificar se existem medidas alternativas à prisão adequadas ao caso concreto”.