Claudio Fonteles diz que o procurador-geral não deveria barganhar cargos
Diante das notícias de que Jair Bolsonaro estaria barganhando com o procurador-geral da República, Augusto Aras, uma cadeira no Supremo Tribunal Federal –ou a recondução–, o ex-PGR Claudio Fonteles propõe que, encerrado o mandato de dois anos, o procurador-geral fique impedido de exercer outro cargo público.
Segundo ele, findo o mandato, o procurador-geral da República deveria retornar à carreira ou se aposentar. “O Ministério Público não é um órgão do Poder Executivo”, diz.
Sobre Augusto Aras e as nomeações para o STF, eis o que disse Bolsonaro: “Se aparecer uma terceira vaga —espero que ninguém desapareça— (…), o Augusto Aras entra fortemente na terceira vaga”, revelou Daniel Carvalho, da Folha.
Em 2005, ao concluir dois anos no cargo, Fonteles não disputou a recondução.
Ele foi o mais votado pela categoria, em 2003. Foi indicado por Lula, que inaugurou a tradição –rompida por Bolsonaro– de escolher um nome a partir da lista tríplice da Associação Nacional dos Procuradores da República (ANPR).
Ao encerrar seu primeiro mandato, o então PGR Rodrigo Janot contratou uma agência de relações públicas para fazer campanha pela continuidade no cargo. Chegou a aspirar um terceiro mandato (Aristides Junqueira permaneceu no cargo, de 1989 a 1995; Geraldo Brindeiro, de 1995 a 2003).
Dilma Rousseff demorou para nomear Roberto Gurgel –que protestou pela longa interinidade, sem mencionar os eventuais desgastes para o Ministério Público Federal com a longa permanência de um PGR.
Sob o título “A propósito do procurador-geral da República“, o texto a seguir é de autoria de Fonteles. Foi publicado em seu blog.
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Sou instado, por várias pessoas, a me posicionar sobre a constitucionalidade da lista tríplice para a escolha do Procurador-Geral da República.
De pronto, seja marcado que somente o Ministério Público Federal não confere tratamento normativo à lista tríplice.
A formação da lista tríplice constitui-se em luta histórica de Procuradoras e Procuradores da República.
Essa luta histórica é motivada justamente para que quem seja escolhido ao exercício do cargo de Procurador-Geral da República não seja vinculado diretamente e em elevadíssimo grau de agradecimento e dependência ao Presidente da República, então único e exclusivo responsável por sua escolha.
O Ministério Público não é um órgão do Poder Executivo.
À luz do texto constitucional – artigo 127, caput – o Ministério Público é instituição permanente da Sociedade brasileira.
Eis porque os seus membros têm como princípio reitor a guiar seu conduzir-se a independência funcional, na dicção do §1º, do artigo 127, da Constituição Federal.
Tudo assim estabelecido, e por necessária coerência, a formação da lista tríplice por consulta a todos os membros do Ministério Público Federal também há de ser inserida no texto constitucional.
E não somente este aspecto.
Dois outros aspectos apresentam-se impostergáveis à garantia da independência funcional.
O primeiro diz com a vedação da recondução.
Hoje, o texto constitucional enseja a recondução ilimitada, pelo Presidente da República, do Procurador-Geral da República, como está posto na parte final do §1º, do artigo 128: “permitida a recondução”.
Há de se dizer: “vedada a recondução”, fixando-se mandato único de três anos.
O segundo diz com a proibição expressa de, findo o mandato, o procurador-geral da República fique impedido de exercer outro cargo público. Retorna à carreira ou se aposenta.
O que não se pode tolerar é que faça barganha no desempenhar cargo de tão elevada responsabilidade social.
Permito-me abordar tema incidental.
Diz com a abertura de investigação criminal pelo próprio Supremo Tribunal Federal, quando ocorrer “infração à lei penal na sede ou dependência do Tribunal” (artigo 42, caput, do Regimento Interno do Supremo Tribunal Federa) ou “nos demais casos” (§1º, do artigo 42 do RISTF).
São inconstitucionais esses textos.
O artigo 129 e seu inciso I, da Constituição Federal são peremptórios:
Artigo 129: “São funções institucionais do Ministério Público:
I – promover, privativamente, a ação penal pública, na forma da lei.
É a adoção inequívoca do sistema acusatório.
Nesse sistema, diferentemente do sistema inquisitório em que o juiz cumula as funções de investigar e julgar, tais atribuições, de um lado a investigatória e acusatória, e de outro lado a de julgar, são conferidas a instituições diversas: ao Ministério Público a missão de investigar – aqui compartilhada com a polícia judiciária – e acusar; e ao Poder Judiciário a de julgar daí porque o princípio reitor da atividade judiciária é o da imparcialidade.
De toda a sorte, e finalizando, uma vez inseridos na Constituição Federal os três aspectos, que relevei, para a escolha do Procurador-Geral da República, a independência funcional estará preservada, sem qualquer dúvida.
Eis porque assim proponho a redação do §1º, do artigo 128, da Constituição Federal, que trata da escolha do Procurador-Geral da República:
“§1º – O Ministério Público da União tem por chefe o Procurador-Geral da República, nomeado pelo Presidente da República dentre integrantes da carreira do Ministério Público Federal, constantes de lista tríplice, elaborada pelos membros do Ministério Público Federal, maiores de trinta e cinco anos, após a aprovação de seu nome pela maioria absoluta do Senado Federal, para mandato de três anos, vedada a recondução e vedado o exercício de qualquer outro cargo público após findo o mandato, ou durante o seu curso”.