Noronha se declara impedido para julgar caso em que a filha atua como advogada
Embora o presidente do STJ (Superior Tribunal de Justiça), ministro João Otávio de Noronha, tenha decidido não dividir o plantão judicial com a vice-presidente, Maria Thereza de Assis Moura, a ministra decidirá as medidas urgentes relacionadas à Operação Mercadores do Caos, que investiga fraude na compra de equipamentos para o combate à Covid-19 no Rio de Janeiro.
Noronha declarou-se impedido para julgar todos os processos referentes à operação porque sua filha, a advogada Anna Carolina Noronha Borelli, impetrou habeas corpus em favor de Cinthya Silva Neumann, investigada na operação.
O Código de Processo Penal impede o juiz de atuar em processo que “tiver funcionado seu cônjuge ou parente, consanguíneo ou afim, em linha reta ou colateral até o terceiro grau, inclusive, como defensor ou advogado, órgão do Ministério Público, autoridade policial, auxiliar da justiça ou perito”.
A vice-presidente indeferiu a liminar no habeas corpus impetrado por Anna Carolina e vários pedidos de liminar assinados por outros advogados.
Maria Thereza pediu esclarecimentos ao juiz de primeiro grau, pois sua decisão não teria fundamentação, e determinou que, após vista ao Ministério Público Federal, os autos sejam remetidos ao relator.
A ministra também indeferiu o habeas corpus do ex-secretário de saúde do Rio de Janeiro Edmar José Alves dos Santos, preso por suposta participação em uma organização criminosa estruturada para fraudar contratos da secretaria estadual durante a pandemia do novo coronavírus.
Nesse caso, o mérito do habeas corpus do ex-secretário não será julgado pelo STJ, informa a assessoria de imprensa do tribunal superior.
Segundo a ministra, o pedido de liminar em habeas corpus impetrado pela defesa do secretário perante o Tribunal de Justiça do Rio de Janeiro (TJ-RJ) foi analisado e indeferido fundamentadamente pelo juiz plantonista no fim de semana, e ainda não houve análise do mérito do pedido por parte da corte fluminense.
“O magistrado de plantão que analisou o writ originário não vislumbrou, de plano, a presença dos pressupostos necessários à concessão da medida liminar, entendendo mais prudente reservar ao mérito da impetração a análise da questão, o que não constitui manifesto constrangimento ilegal capaz de excepcionar a aplicação do referido verbete sumular”, explicou a ministra ao citar a Súmula 691 do Supremo Tribunal Federal (STF) – aplicada por analogia pelo STJ – que impede a impetração de novo pedido de habeas corpus em corte superior após o indeferimento de liminar.
Segundo o Ministério Público do Rio de Janeiro, Edmar Santos é o chefe da organização criminosa investigada pela operação Mercadores do Caos, atuando no superfaturamento de itens como respiradores mecânicos utilizados no tratamento de pacientes com a Covid-19.
No pedido de habeas corpus ao STJ, a defesa do secretário afirmou que as decisões de primeira e segunda instâncias – que negaram a liberdade a Edmar Santos – são teratológicas, isto é, desprovidas de fundamentos idôneos para justificar a prisão.
De acordo com a vice-presidente do STJ, as referidas decisões não são teratológicas, mas tão somente contrárias aos interesses da defesa, sendo prudente aguardar o trâmite natural do caso.
“Há de se respeitar a sequência dos atos processuais, notadamente a competência de cada tribunal, não podendo esta Corte se substituir ao colegiado de origem para conceder uma liminar que lá foi devidamente negada, com exposição de fundamentos bastantes”, afirmou a ministra.
Maria Thereza de Assis Moura lembrou ainda que, ao decretar a prisão preventiva, o juiz de primeira instância destacou a periculosidade de Edmar Santos – cenário que não denota, na visão da ministra, hipótese de flagrante ilegalidade capaz de justificar a atuação do STJ no caso.
A Operação Mercadores do Caos começou em maio, diante da suspeita de desvio de mais de R$ 18 milhões destinados à compra de aparelhos ventiladores/respiradores. Passados mais de dois meses da data de entrega dos respiradores comprados emergencialmente, sem licitação, nenhum equipamento havia sido entregue pelas empresas, nem o dinheiro devolvido aos cofres públicos.
No dia 17 de junho, foram cumpridos dois mandados de prisão preventiva no Rio de Janeiro e outros nove mandados de busca e apreensão no Rio (4) e em Brasília (5), expedidos pelo Juízo da 1ª Vara Criminal Especializada da Capital (Rio de Janeiro).
A ação contou com o apoio do Grupo de Atuação Especializada no Combate à Sonegação Fiscal e aos Ilícitos contra a Ordem Tributária (Gaesf/MPRJ); da Coordenadoria de Segurança e Inteligência (CSI/MPRJ); da Polícia Civil do Rio de Janeiro, por meio do Departamento Geral de Polícia Especializada; e da Polícia Civil do Distrito Federal, através da Coordenação Especial de Combate à Corrupção e ao Crime Organizado (Cecor).